quinta-feira, 27 de maio de 2021

Ulysses - Lestrigões (O Almoço)



Refeição Cultural

Depois de uma semana sem ler os três livros para os quais estou empenhado na leitura - Ulysses (James Joyce), Odisseia (Homero) e O Verdadeiro Criador de Tudo (Miguel Nicolelis) - retomei a leitura de Joyce nesta manhã de quinta-feira 27.

Durante a pausa, li obras menores, livros pequenos, alguns clássicos. Da mitologia grega, li Prometeu Acorrentado, supostamente de Ésquilo (ler postagem aqui), Antígona, de Sófocles (comentário aqui) e Édipo Rei, de Sófocles (ler aqui); li um conto belíssimo de Saramago, A ilha desconhecida (ler aqui); li duas narrativas do francês Honoré de Balzac (aqui) e li narrativas curtas de Jack Kerouac, líder da geração Beat (comentário aqui). 

De verdade, foi bem melhor ter lido isso que ler ver ouvir as merdas da política genocida de meu país. A pandemia não terá fim no Brasil - não temos vacina nem medidas restritivas - e as mortes oficiais chegam perto dos 500 mil humanos (são mais de um milhão de mortos por problemas respiratórios: Covid-19 + Síndrome Respiratória Aguda Grave, SRAG); nossas vidas não valem um tostão furado - morremos a qualquer minuto -; a CPI sobre a pandemia não vai dar em nada contra o clã miliciano e a "boiada segue passando" e não teremos mais os ecossistemas brasileiros - seremos um deserto continental - e sem empresas públicas.

2023 - Eu não acredito que Lula será presidente do Brasil em 2022 (se é que haverá eleições). Lula presidente seria possível se a política não tivesse sido destruída pelo golpe de Estado e se o processo de construção do ódio não tivesse sido um sucesso e gerado uma cultura de banalidade do mal e nazifascismo no país... a anomia, a violência e a miséria vão longe por aqui, e com apoio popular e dos manipuladores da casa-grande. 

A esquerda não compreendeu ainda o mundo paralelo no qual vive parte considerável do povo deste país. Só o regime no poder tem acesso a essa parte da população. Estamos falando de dezenas de milhões de animais humanos.

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ULYSSES

"Deteve-se de novo e comprou da velha das maçãs dois bolinhos por um tostão e partiu a massa quebrantável e jogou os fragmentos no Liffey. Está vendo? As gaivotas adejaram silenciosas, duas depois todas, de suas alturas, caindo sobre a presa. Foi-se. Cada migalhinha." (p. 293)


No capítulo que li hoje, "Lestrigões", Bloom saiu da redação do Freeman onde trabalha como publicitário e estamos na hora do almoço. O capítulo teve muito fluxo de consciência e diálogos com pessoas na rua e em ambientes internos.

Teve uma passagem com pombas que me lembrou da música dos Mamonas Assassinas... muito engraçado!

"Diante da imensa porta alta da casa do parlamento irlandês um bando de pombos voou. Sua festinha depois das refeições. Em quem é que a gente vai fazer? Eu fico com o sujeito de preto..." (p. 306)

O sujeito de preto que a pomba escolhe é o Leopold Bloom, que está assim porque esteve no funeral de Paddy Dignam às 11 horas da manhã.

Aí me lembrei dos belos versos dos Mamonas:

"As pombas quando avoam/ por incrível que pareça/ ficam sobrevoando/ com seu cu amirando/ em nossas cabeças..." (Mundo Animal)

O TEMPO NO FLUXO DE PENSAMENTO E O TEMPO LINEAR DA LEITURA

Tem uma questão interessante. Eu gastei uma hora para ler o que o Bloom diz que foram cinco minutos. Essa é uma questão dos diversos tempos das narrativas que os críticos explicam.

"O Dignam levado no carrinho. A Mina Purefoy barriga inchada numa cama gemendo pra arrancarem uma criança de dentro dela. Nasce um a cada segundo em algum lugar. Outro morre a cada segundo. Desde que eu dei comida pras gaivotas cinco minutos. Trezentos bateram as botas. Outros trezentos nasceram, lavando o sangue, todos são lavados no sangue do cordeiro, balindo méééééé." (p. 309)

Bloom alimentou as gaivotas lá na página 293. Gastei uma hora de leitura.

O capítulo foi fascinante. Bloom faz críticas a diversas coisas. Pensa a respeito da quantidade de filhos que os irlandeses fazem. Critica cardápios de comida vegetariana e nessa parte é interessante ele associar a alimentação sem carnes a maior facilidade para versejar, pensando ser impossível para um comedor de carnes brutamontes fazer versos. Na parte que cito abaixo, ele está falando da comida vegetariana dos poetas e literatos.

"A meia dela está frouxa no tornozelo. Eu detesto isso: de uma falta de gosto. Esse pessoalzinho literário etéreo todos eles são. Sonhadores, nebulosos, simbolísticos. Estetas é o que eles são. Eu não ia ficar surpreso se fosse aquele tipo de comida que produz o seu igual ondas do cérebro o poético. Por exemplo um daqueles policiais suando cozido irlandês na camisa; não dava pra espremer nem um versinho de poesia dali. Não sabem nem o que é poesia. Tem que estar num certo humor." (p. 311)


Essa parte abaixo mereceu até uma foto minha apontando o mindinho pro céu... achei legal a cena.

"Deu meiavolta e, parado entre os toldos, estendeu a mão direita com o braço esticado para o sol. Sempre quis tentar isso. É: completamente. A ponta de seu dedo mínimo apagava o disco solar. Deve ser o foco onde os raios se cruzam..." (p. 312)

Acabei comendo um pão com queijo e mostarda após ler o Bloom comendo seu lanche assim.

Bloom ainda ajuda um jovem cego a atravessar a rua.

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Como disse nas outras postagens da leitura do Ulysses, na tradução de Caetano W. Galindo, estou tendo um aproveitamento muito melhor desta vez em relação à compreensão que tive na leitura duas décadas atrás, na tradução de Houaiss.

A leitura da postagem sobre o capítulo anterior pode ser feita aqui.

Abraços, amig@s leitores.

William


Bibliografia:

JOYCE, James. Ulysses. Tradução de Caetano W. Galindo. 1ª ed. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2012.


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