terça-feira, 27 de agosto de 2024

Diário e reflexões



Refeição Cultural 

Osasco, 27 de agosto de 2024. Terça-feira. 


Ao acordar, encolhi minhas pernas e senti que elas já não são as mesmas pernas que me trouxeram até aqui. Endurecidas, doloridas, não confio mais em minhas pernas...

Ainda na cama, pensei em não me conectar ao mundo digital, assim não seria capturado logo ao despertar. Poderia deixar minha mente pensar por um tempo. Pensei muitas coisas em algumas horas sem ser bateria da Matrix.

Até os anos noventa, vivemos sem essa realidade do mundo digital interligado por algumas plataformas que passaram a manipular o conjunto da sociedade humana. Os humanos estão sendo desfeitos e nossa espécie vai se autodestruir.

Desconectado, li um poema de um colega do banco desconhecido (pra mim), poema muito bom: adquiri seu livro num sarau. Fiquei tocado. Aí li dois textos de Ray Bradbury, um sobre Fahrenheit 451, trinta e dois anos depois, o outro sobre qualquer tipo de censura à arte, à estética. De novo, o tema de Fahrenheit 451. Fiquei olhando para a zona da minha casa e pensando na vida. 

O que faço em relação à minha insatisfação que dilacera o restante de meus dias na Terra? O que faço? 

Inventei semanas atrás uma contagem de cem dias para procurar mudanças e sentidos para a minha existência. Faltam 7 dias... 

Uma semana para encontrar o que não encontrei em cem dias. O que não encontrei talvez em toda a existência, que se deu sem o meu controle, sem o meu desejo, sem o meu planejamento. Uma existência que se deu a esmo.

Eu realmente gostaria de tomar uma decisão nessa uma semana, tipo algo firme, definitiva decisão. A partir daquele instante decisivo as coisas seguirão assim... vou viver em função disso ou daquilo. O que foram esses 55 anos... nada disso! Queria ser isso, fui ser aquilo. Ou melhor, pior quero dizer, não queria ser porra nenhuma, e fui sendo alguma coisa, ora ruim, ora nada de nada, ora boa. Já fui coisa boa também. No momento... nonada.

E se eu mergulhasse em mim nessa etapa da existência? Existência que avança para a inexistência...

Estou muito indignado com o mundo exterior a mim, meu mundo, o mundo onde habito. No entanto, depois de estar preso a um nome em uma gaiola, como nos explicou o cronista Rubem Alves, é difícil fugir às expectativas do que esperam de mim, o sujeito chamado pelo meu nome. Difícil! (texto de Alves pode ser lido aqui)

E no entanto, posso deixar de ser o que sou a qualquer momento, num instante. Basta uma explosão de ira qualquer e algo pode se explodir dentro de mim... e já nem seria mais o que sou.

Posso acordar e minhas pernas duras não me atenderem mais. Posso "acordar" preso dentro de um corpo que não me obedeça mais. Que contribuição estou dando que vá significar alguma coisa hoje como já imagino ter contribuído algum dia quando fui coisa boa?

Ainda estou tocado pela questão do cortador de grama e o jardineiro, ao final de Fahrenheit 451. Fui jardineiro ou cortador de grama? Por que só consigo usar os verbos no passado? Não há presente e futuro pra mim?

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