sábado, 18 de janeiro de 2025

Diário e reflexões



Refeição Cultural

Osasco, 18 de janeiro de 2025. Sábado.


Hoje foi um daqueles dias nos quais precisei acordar e entrar embaixo do chuveiro por alguns minutos para esperar minha energia vital se reequilibrar e para o corpo que me carrega seguir seu curso. Aprendi isso em Brasília, quando era gestor eleito da Cassi.

Passei uma ótima semana na colônia de férias dos professores na Praia Grande (Sinpro-SP). Lugar simples que me cativa há anos. Li poesia e Umberto Eco, andei e corri, nadei e refleti um pouco sobre tudo. 

MUDAR A REALIDADE É PRECISO

Para mudar as coisas é necessário que se faça algo diferente do que se vem fazendo, mesmo quando se é levado ao sabor das ondas. Algo devo fazer para mudar minha vida, mesmo sendo passageiro e não condutor do meu destino. Sabendo disso, até mudar de vagão ou de trem pode ser uma opção de mudança.

UM MILITANTE DE ESQUERDA PERDIDO POR AÍ

Me acostumei a ser uma pessoa da política e não consegui me desligar mentalmente daquilo que fiz melhor em minha vida adulta depois que saí da representação da classe trabalhadora. Minha vida virou uma vida fastasmagórica já faz alguns anos. A política mudou drasticamente e não vejo espaço para fazer política sendo quem sou. 


A esquerda não se ajeita. Segue e seguirá dividida, sem unidade, se automutilando e afogada nos redemoinhos da vaidade dos indivíduos. Não caibo nisso. A charge que vi numa postagem do Ignacio Ramonet ilustra bem a questão (acima). 

Às vezes, tenho a impressão, só impressão, que as lideranças diversas da esquerda diversa vêm se tornando sumidades inquestionáveis e infalíveis, a sumidade e seus séquitos de seguidores, apoiadores ou até beneficiários de alguma vantagem. 

Olha o mal que as bolhas das redes sociais fizeram com a política e com os seres humanos! O mundo dos likes e das concordâncias. Bloqueie quem não gostou de algo, questionou ou não curtiu algo.

BUROCRATISMO DA ESQUERDA TERÁ DIFICULDADE DE TRAZER RESULTADOS PARA O POVO

Eu avalio que nós da esquerda não teremos sucesso para enfrentar a extrema-direita fascista dos capitalistas com os mesmos métodos e práticas que utilizamos nas últimas décadas - a conciliação de classes.

Eu, por exemplo, pertenci por décadas ao maior grupo de esquerda organizado do país, pois considero ser assim a Articulação Sindical da Central Única dos Trabalhadores e que, no Partido dos Trabalhadores, seria a corrente hegemônica também, a CNB. Lá aprendi a fazer conciliação de classes. Por décadas fizemos boas lutas e trouxemos resultados efetivos para a classe trabalhadora brasileira.

O mundo mudou. A mudança, aliás, é a única certeza que nós homo sapiens deveríamos saber claramente. Até porque a morte é uma mudança de estado de natureza, líquida e certa para quem está vivo. Dogma algum é provado ou pode ser questionado, até porque é dogma. Sobre mundos paralelos, vida após a morte etc, tudo é teoria, abstração da mente humana. Já a mudança é uma realidade concreta o tempo todo. Neste instante, tudo está mudando, meu corpo, a natureza, o universo.

A política é o momento. E neste momento avalio que nossos métodos de conciliação de classes não terão muito sucesso no mundo que se desenha a partir dos donos do poder - a extrema-direita fascista do capitalismo. Eles estão organizados mundialmente e vão vir para arrebentar, eliminar o diverso. Foi assim que vivemos as primeiras décadas do século passado. Conciliação nenhuma parou Hitler e Mussolini. Só a unidade de grupos divergentes parou o nazifascismo, e na bala!

Das cinzas do fim da 2ª Guerra Mundial vieram as diplomacias, as políticas de paz, as instituições internacionais etc. Essa coisa acabou neste momento. Isso não está claro para as pessoas educadas? 

Então, não obteremos os mesmos resultados de décadas atrás com os mesmo métodos e procedimentos de antes num cenário diferente.

QUEM QUER ASSUMIR O ÔNUS DE ENFRENTAR O PODER? VALE A PENA LUTAR POR JUSTIÇA? QUEM NOS DEFENDERÁ DOS PODEROSOS?

Eu enfrentei o poder durante o tempo em que tive mandatos de representação. Enfrentei! Mesmo sendo de um grupo de esquerda cuja base é a conciliação de classes. Fiz o bom combate. Como nossos governos são de frentes amplas, sempre foram, as lideranças sindicais e populares sempre tiveram que lidar com a contradição de ser do partido do governo e ser representante de categorias profissionais e de movimentos sociais.

Tenho a impressão que hoje está mais difícil representar as pessoas em mandatos sindicais e parlamentares do campo da esquerda e questionar o "nosso" governo quando as forças que o compõem à direita impõem as políticas que prejudicam a nossa classe e o nosso futuro. Mas acho que o nosso lado da representação exagera em falar amém a tudo que o nosso governo faz de ruim para o nosso lado.

Mas não vou citar situações específicas nesta reflexão.

Sobre a questão levantada neste subtítulo, fico cada dia mais me perguntando quem ainda toparia ser de esquerda e lutar formalmente contra o poder instituído. Ser honesto e lutar por justiça só tem feito o nosso lado se foder de verdade. Cada dia que passa, mais injustiça vemos e nada parece mudar. Um novo militante deve pensar muitas vezes antes de embarcar na canoa de lutar contra os poderosos do mundo.

Os parlamentos são de maioria contra nós. Os executivos idem. A amplíssima maioria da burocracia estatal - áreas da justiça e administrativas do Estado preenchidas por concursos públicos ou indicações - é de gente de direita e extrema-direita. As áreas de força e repressão policial idem. Qualquer juizeco ou guarda da esquina pode foder a vida de alguém como nós e nada será feito contra ele.

Ontem, vi o caso do jornalista Marcelo Auler, impedido de exercer sua profissão e com seus recursos até para comer confiscados. Tudo inconstitucional... mas vivemos numa anomia desde o mandato do clã de milicianos. Anomia... como disse, os tempos mudaram. Conciliação de classes não rola mais. Vejam o que os poderosos fizeram com os palestinos em Gaza... quem para os poderosos?

Conciliação? Diplomacia?

Enfim, são coisas que tenho avaliado e refletido ao observar o mundo e a realidade do momento com a experiência que acumulei nesta única e frágil existência.

Fico por aqui.

William


Post Scriptum: soube que faleceu neste sábado o grande jornalista Marco Weissheimer, de câncer. Leio seus textos desde a criação do Portal da Carta Maior no inicio dos anos dois mil. Aprendi muito com ele. Nossos sentimentos à família e aos amig@s.



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