Refeição Cultural
Quinta-feira, 12 de dezembro de 2024.
(18h30 a 19h00)
Estou na estrada a caminho de Uberlândia. Estou sozinho. Não estamos indo para passar o Natal com a família. Estou indo visitar os pais uma semana antes.
Eu previa que isso pudesse acontecer. As relações atuais não estão muito propícias a confraternizações de amor e amizade. Falo isso como impressão geral. É minha leitura dos tempos.
Estava olhando pela janela do ônibus e pensando em uma frase da Fernanda Montenegro sobre a vida, frase que ouvi numa entrevista antiga dela ao jornalista e escritor Eric Nepomuceno.
Ao responder à pergunta se ela tinha medo de morrer, Fernanda disse que tinha pena, pena de morrer. Por não se saber a resposta para algo além dessa vida, seria uma pena não ver mais o céu azul, ter acesso às maravilhas da cultura, estar com pessoas que se gosta etc. Fiquei muito pensativo após essa fala de nossa querida atriz.
Aí, olhando a paisagem pela janela do ônibus, refleti sobre a vida, imagens de décadas passaram por minha visão da memória, e concluí que a minha vida foi muito satisfatória. Muito. Efetivamente, fui uma pessoa de sorte, como tenho escrito em minhas reflexões.
O rapaz que saiu de Uberlândia em 1987 sobreviveu em São Paulo, viveu a vida do jeito que tinha que viver pelas veredas que entrou. Foi uma jornada dura, foi. Teve contradições características do que somos, seres humanos, sobreviventes de um dos países mais violentos e miseráveis do mundo, por causa de sua história de séculos de exploração por parte de uma minoria dominante desgraçada.
Eu vivi odiando a gente da casa-grande, que nem de burguesia poderia ser chamada, porque não produz um parafuso, não defende a indústria e a produção com valor agregado, é a mesma gente escravocrata de sempre, quer ser nobre sendo uma merda de gente, isso são os ricos do Brasil. Gente escrota.
Voltando a Uberlândia 37 anos depois que fui embora, e ainda podendo encontrar meus pais, minha irmã, meus sobrinhos e mais familiares que vivem nessa bela cidade onde cresci, é um privilégio, sou mesmo uma pessoa de sorte. Como diria Fernanda Montenegro, seria uma pena não poder viver esses instantes da vida.
E sei dos problemas que existem nas casas de todos, todos nós.
É isso. A vida é uma oportunidade diária. Nunca sabemos do instante seguinte de nenhum de nós. Nem o meu, nem o de vocês, nem o do mais poderoso e fdp da Faria Lima e de alguma casa-grande.
A vida de todos nós é um instante.
Então, viva este momento.
William Mendes
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