quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

85ª SÃO SILVESTRE 2009 - Completei!




Nesta São Silvestre, corri como Forrest Gump - tem muita coisa que me encanta naquele personagem contador de histórias.


FALTA DE PREPARO À PARTE, COMPLETEI A PROVA EM 107 MINUTOS.

FOI BASTANTE DIVERTIDO... E CANSATIVO!

COMO SEMPRE, O CLIMA DE FESTA FOI DEMAIS!

Olha a foto aí que bateram do "Forrest" nas ruas de São Paulo. (rsrsrs) 

Essas coisas são interessantes porque acabam chamando a atenção. 

Durante a prova, sempre aparecia um que dizia "olha lá o Forrest, run Forrest!" (isso foi coisa de gente da minha idade, né!)

São Silvestre 2009


Chegou a hora.


Já já saio pra ir correr/andar a São Silvestre.


Hoje participo da festa da corrida incorporado de Forrest Gump.


Foi um semestre difícil. Não consegui correr e treinar. Mas vou para a prova para correr e queimar algumas coisas aqui dentro do coração.


Eu vou chegar ao final, pegar a minha medalhinha e ir para casa descansar.


Perdi uma tia querida. Tenho algumas tristezas profundas a digerir. Mas vamos correr e queimar essas tristezas.


Run Forrest... run...

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Treinamento São Silvestre (XXII)

Está chegando a hora.

Nesta segunda-feira caminhei uns 5 km para relaxar.

Na terça caminhei um pouco e fui buscar o meu kit da corrida lá na Abílio Soares.

domingo, 27 de dezembro de 2009

Treinamento São Silvestre (XXI)

Poderia dizer que a nominação dessas postagens não é apropriada, pois eu não fiz "treinamento" para a corrida do fim de ano. Eu não treinei este semestre. Não foi possível.

No entanto, já que vou pra Paulista no dia 31, correr e caminhar na festa da São Silvestre, preciso ao menos soltar o corpo da comedeira e bebedeira de final de ano.

De anteontem pra cá, estou andando e correndo em 2 períodos ao dia.

Anteontem, caminhei 5 km pela manhã e corri 5 km à tarde.

Ontem, caminhei mais 5 km de manhã e depois corri 5 km à noite.

Vamos ver se vou nesse ritmo até o dia da corrida.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Estudo de idiomas - francês

Eu estou indo bem no estudo do italiano. Acredito que no próximo semestre eu terei aprendido a ler e falar o básico do italiano.

Em relação ao inglês, terei que recuperar o que está guardado no arquivo cerebral e melhorá-lo para o inglês formal, mais diplomático.

Não posso reclamar de meu espanhol. É lógico que o nível diplomático exige aperfeiçoamento constante.

Quanto ao francês, vou dar-me o tempo necessário para ir ATÉ O FIM com todos os materiais que comprei. O projeto é que eu leia primeiro. Depois vou avançando para as outras 3 habilidades - falar, escrever e ouvir.

BONJOUR, BONSOIR, BONNE NUIT, JE M'APELLE WILLIAM, ENCHANTÉ (m), ENCHANTÉE (f)
AU REVOIR, A BIENTÔT, A DEMAIN, MERCI BEAUCOUP

LES RELATIONS
LE GRAND-PÈRE, LE FRÈRE, LA SOEUR, LE PÈRE, LA MÈRE, LA GRAND-MÈRE, LE FILS, LA FILLE, LE MARI, LA FEMME, LA BELLE-SOEUR, LE BEAU-FRÈRE, LE DEMI-SOEUR, LE DEMI-FRÈRE, LES ENFANTS

NOUS SOMMES...

NUMÉROS: UN/UNE, DEUX, TROIS, QUATRE, CINQ, SIX, SEPT, HUIT, NEUF, DIX...

Presente do indicativo dos verbos ser e ter:

ÊTRE
JE SUIS
TU ES
IL EST
ELLE EST
NOUS SOMMES
VOUS ÊTES
ILS SONT
ELLES SONT

AVOIR
J'AI
TU AS
IL A
ELLE A
NOUS AVONS
VOUS AVEZ
ILS ONT
ELLES ONT

Aos poucos, vou identificando estruturas em frases francesas. Por exemplo, essas tiradas do Le Monde Diplomatique 21.12.09:

Qui sommes-nous ?
Le Monde diplomatique, un journal d’actualités internationales engagé

Amis du Diplo
Lecteurs, rejoignez l’Association des « Amis » du Monde diplomatique !

domingo, 20 de dezembro de 2009

Formação Econômica do Brasil, Celso Furtado





CANTO PRIMEIRO

106

"No mar tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida!
Na terra tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade aborrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno?"

(Os Lusíadas, Luís de Camões)


PRIMEIRA PARTE

Fundamentos econômicos da ocupação territorial

VII. Encerramento da etapa colonial

Alguns excertos do capítulo:

"A neutralidade em face das grandes potências era impraticável. Portugal compreendeu, assim, que para sobreviver como metrópole colonial deveria ligar o seu destino a uma grande potência, o que significaria necessariamente alienar parte de sua soberania. Os acordos concluídos com a Inglaterra em 1642-54-61 estruturaram essa aliança que marcará profundamente a vida política e econômica de Portugal e do Brasil durante os dois séculos seguintes".

A consequência desses acordos foi que "Portugal became virtually England's commercial vassal" (Alan K. Manchester)

Nessas trocas de favores "Com respeito às Índias Orientais, por exemplo, Portugal cedeu Bombaim permanentemente e a Inglaterra prometeu utilizar sua esquadra para manter a ordem nas possessões lusitanas".


PORTUGAL ABRE MÃO DE DESENVOLVIMENTO MANUFATUREIRO

"(...) o acordo comercial, celebrado com a Inglaterra em 1703, desempenhou papel básico no curso tomado pelos acontecimentos. Esse acordo significou para Portugal renunciar a todo desenvolvimento manufatureiro e implicou transferir para a Inglaterra o impulso dinâmico criado pela produção aurífera no Brasil".


CONFERÊNCIA DE UTRECHT

Com o acordo celebrado com a Inglaterra, o Brasil conseguiu boas posições em relação a formação de seu território.

"Aí conseguiu o governo lusitano que a França renunciasse a quaisquer reclamações sobre a foz do Amazonas e a quaisquer direitos de navegação nesse rio. Igualmente nessa conferência Portugal conseguiu da Espanha o reconhecimento de seus direitos sobre a colônia do Sacramento. Ambos os acordos receberam a garantia direta da Inglaterra e vieram a constituir fundamentos da estabilidade territorial da América Portuguesa"


RELAÇÃO COM A ECONOMIA INGLESA

"O ciclo do ouro constitui um sistema mais ou menos integrado, dentro do qual coube a Portugal a posição secundária de simples entreposto. Ao Brasil o ouro permitiu financiar uma grande expansão demográfica, que trouxe alterações fundamentais à estrutura de sua população, na qual os escravos passaram a constituir minoria e o elemento de origem europeia, maioria".


TUTELAGEM INGLESA SEGUE APÓS INDEPENDÊNCIA DE 1822

"Com efeito, se bem haja conseguido separar-se de Portugal em 1822, o Brasil necessitou vários decênios mais para eliminar a tutelagem que, graças a sólidos acordos internacionais, mantinha sobre ele a Inglaterra"

"(...) Pelo tratado de 1827, o governo brasileiro (o tratado foi firmado pelo Imperador, independentemente de quaisquer consultas às Câmaras) reconheceu à Inglaterra a situação de potência privilegiada, auto limitando sua própria soberania no campo econômico (O novo acordo não reconheceu, entretanto, tarifa preferencial à Inglaterra. Em razão de cláusula de nação favorecida, o Brasil concederia a vários outros países, posteriormente, a mesma tarifa de 15% ad valorem)"


COM O CAFÉ, RELAÇÃO COMERCIAL SE VOLTA PARA EUA

"Na medida em que o café aumenta sua importância dentro da economia brasileira, ampliam-se as relações econômicas com os EUA. Já na primeira metade do século esse país passa a ser o principal mercado importador do Brasil".


DE 1500 A 1850, POUCA ALTERAÇÃO HOUVE NA ESTRUTURA ECONÔMICA

Podemos concluir que pouca alteração houve nos 3 séculos e meio de Brasil colônia e imperial.

"O passivo político da colônia portuguesa estava liquidado. Contudo, do ponto de vista de sua estrutura econômica, o Brasil da metade do século XIX não diferia muito do que fora nos três séculos anteriores. A estrutura econômica, baseada principalmente no trabalho escravo, se mantivera imutável nas etapas de expansão e decadência. A ausência de tensões internas, resultante dessa imutabilidade, é responsável pelo atraso relativo da industrialização".


Bibliografia:

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. In: Grandes Nomes do Pensamento Brasileiro. Publifolha 2000.

Live to tell - Madonna

Eu não havia lido nem prestado atenção nesta letra ainda. Há pouco tempo, assisti ao filme do qual esta música é trilha sonora - Caminhos Violentos, 1986 - e tem como um dos protagonistas o jovem Sean Penn - ainda na década de 80, e, como não poderia ser diferente, gostei do filme (parece que tudo quanto é filme que o cara participa ou dirige é bom).

Gostei da letra. Há identificação.

Live to tell

I have a tale to tell.
Sometimes it gets so hard
to hide it well.
I was not ready for the fall
Too blind to see the writing on the wall.

A man can tell a thousand lies
I've learned my lesson well.
Hope I live to tell the secret I have learned
Till then it will burn inside of me.

I know where beauty lives.
I've seen it once
I know the one she gives.
The light that you could never see.
It shines inside you can't take that from me.

A man can tell a thousand lies
I've learned my lesson well.
Hope I live to tell the secret I have learned
Till then it will burn inside of me.

The truth is never far behind
you kept it hidden well.
If I live to tell the secret I knew then
Will I ever have the chance again?


If I ran away I'd never have the strength (força, resistência)
to go very far.
How would they hear
the beating of my heart?

Will it go cold (will it go cold?)
the secret that I hide - will I grow old?
How would they hear?
When will they learn.?
How would they know?

A man can tell a thousand lies
I've learned my lesson well.
Hope I live to tell the secret I have learned
Till then it will burn inside of me.

The truth is never far behind
you kept it hidden well.
If I live to tell the secret I knew then
Will I ever have the chance again?

sábado, 19 de dezembro de 2009

Refeição Cultural 41 - Leituras de Sábado

O que poderia dizer que aprendi hoje?

Bom, li alguns textos de jornais velhos e um desses jornais que falava sobre o dia da consciência negra diz que Zumbi não deveria ser usado como referência de luta de classes nem de democracia porque não havia no Brasil colonial esse tipo de divisão social ainda e no Quilombo dos Palmares existiria o mesmo regime dos povos africanos, ou seja, ditadura e regime de castas, onde a linhagem sanguínea ainda definia o status quo.

Li no mesmo jornal uma entrevista interessante de Gilberto Gil. Não me lembro de algum dia ter prestado atenção em algum discurso dele que evidenciasse seu posicionamento sobre qualquer coisa. Ele é defensor das cotas para negros e dos programas de ajuda aos mais necessitados como o Bolsa-Família por entender que essas políticas provisórias podem corrigir ou compensar problemas sociais históricos.

Treinamento São Silvestre (XX)

Hoje, caminhei em duas etapas. Pela manhã, fiz 4 km indo e voltando até a rodoviária de Osasco.

Na parte da tarde, caminhei mais 5,5 km dando uma volta no Parque Continental. Mas, sei que este ano minha participação na Paulista será simbólica, não melhorarei meu tempo.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Treinamento São Silvestre (XIX)

Caminhei cerca de 5 km à noite. Estou muito cansado! Não tenho ideia de como farei o percurso da São Silvestre.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Entendi o muro de Berlim - existia antes de subir e cair

Estou impressionado com a minha ignorância a respeito das alemanhas e do muro de Berlim!

Será que eu fui um péssimo aluno na escola fundamental ou seria o ensino escolar que não foi feito para as crianças e jovens aprenderem de verdade?

Ou será que nosso cérebro jovem não teria a natureza para focar tais conhecimentos abstratos e fosse, ao contrário, somente uma máquina encharcada de hormônios e sangue e oxigênio cuja atenção básica seria aquela do instinto animal de buscar-se o prazer dos sentidos em tempo integral?

Deve ser uma mistura disso tudo.

Peguei para ler um caderno de jornal sobre os 10 anos da queda do muro de Berlim (Folha, de 1999) - desses que sempre guardo para ler e nunca leio e já acumulo zilhões pelos cantos do apa(e)rtamento.

Tudo no texto é interessante! Desde o conhecimento histórico presente na recapitulação que a matéria faz sobre o fato dez anos antes (1989), até a observação do "quem está falando" - os clássicos definidores do ato de enunciação textual - eu, aqui, agora. Ou seja, quem fala é a Folha de S. Paulo, de novembro de 1999, no auge do neoliberalismo pró-Estado mínimo e contra direitos sociais públicos, no Brasil privatizante do PSDB/DEM de FHC...

Tá bom, sem mais esclarecimentos!

DESCOBRI O MURO DE BERLIM QUE HAVIA ANTES DE SUBIR E CAIR

Lendo sobre "A Queda", dez anos depois de cair, agora em meus 40 anos, vinte anos depois d'A Queda, e sedento de ser menos ignorante, "descobri" como aquele muro foi parar no meio da Alemanha.

Eu nunca soube, quer dizer, todos sabem, até o mundo mineral, que o muro dividia mundos capitalista e comunista, mas eu não sabia como ele havia aparecido lá.

Ao final da Segunda Guerra Mundial, com a invasão de Berlim pelas tropas aliadas e derrota dos nazistas, a Alemanha foi dividida em 4 zonas de ocupação pelos aliados - EUA, Reino Unido, França e URSS.

A parte norte ocidental ficou com o Reino Unido; a parte sul ocidental com a França; a parte sul oriental com os EUA e a parte norte oriental com a URSS.

Em 1949, EUA, França e Reino Unido se retiraram e essas áreas formaram a Alemanha Ocidental. O setor sob a esfera soviética passaria a ser a Alemanha Oriental.

Lá em 1961, o muro oficializaria a divisão daqueles dois mundos já existentes.


Então, eu não sabia...

Vou ser poliglota ainda...

Ouvi algumas músicas - lendo as letras - para ver como está minha pequena evolução diária, pequena mas contínua.

Estou avançando as páginas do italiano na ida e vinda diária no trem da CPTM. Tentando melhorar o meu inglês. Melhorando o meu espanhol. Soletrando uma ou outra palavra em francês (essa língua terei que focar a leitura primeiro)...

"Queira!
Basta ser sincero
E desejar profundo
Você será capaz
De sacudir o mundo
Vai!
Tente outra vez!"

(Tente outra vez - Raul Seixas)

"Well I never pray
But tonight I'm on my knees yeah
I need to hear some sounds that recognize the pain in me, yeah
I let the melody shine, let it cleanse my mind, I feel free now
But the airways are clean and there's nobody singing to me now"

(Bittersweet symphony - The Verve)

"Ya lo sé, que corazón que no ve,
Es corazón que no siente,
El corazón que te miente amor.
Pero, sabes que en lo más profundo de mi alma,
Sigue aquel dolor por creer en ti,
¿qué fue de la ilusión y de lo bello que es vivir?"

(Corazón partió - Alejandro Sanz)

"Ne me quitte pas
Il faut oublier
Tout peut s'oublier
Qui s'enfuit déjà
Oublier le temps
Des malentendus
Et le temps perdu
À savoir comment
Oublier ces heures
Qui tuaient parfois
À coups de pourquoi
Le coeur du bonheure
Ne me quitte pas"

(Ne me quittes pas - Maysa)

"Anche dentro alle prigioni della nostra ipocrisia
Anche in fondo agli ospedali nella nuova malattia
C'è una forza che ti guarda e che riconoscerai
È la forza più testarda che c'è in noi
Che sogna e non si arrende mai"

(La forza della vità - Renato Russo)

EU CHEGO LÁ...

domingo, 13 de dezembro de 2009

Pai contra mãe - Conto de Machado de Assis, 1906


Machado de Assis, mestre do Cosme Velho.

Publicado originalmente em Relíquias de casa velha - 1906


A escravidão levou consigo ofícios e aparelhos, como terá sucedido a outras instituições sociais. Não cito alguns aparelhos senão por se ligarem a certo ofício. Um deles era o ferro ao pescoço, outro o ferro ao pé; havia também a máscara de folha-de-flandres. A máscara fazia perder o vício da embriaguez aos escravos, por lhes tapar a boca. Tinha só três buracos, dois para ver, um para respirar, e era fechada atrás da cabeça por um cadeado. Com o vício de beber, perdiam a tentação de furtar, porque geralmente era dos vinténs do senhor que eles tiravam com que matar a sede, e aí ficavam dois pecados extintos, e a sobriedade e a honestidade certas. Era grotesca tal máscara, mas a ordem social e humana nem sempre se alcança sem o grotesco, e alguma vez o cruel. Os funileiros as tinham penduradas, à venda, na porta das lojas. Mas não cuidemos de máscaras.

O ferro ao pescoço era aplicado aos escravos fujões. Imaginai uma coleira grossa, com a haste grossa também à direita ou à esquerda, até ao alto da cabeça e fechada atrás com chave. Pesava, naturalmente, mas era menos castigo que sinal. Escravo que fugia assim, onde quer que andasse, mostrava um reincidente, e com pouco era pegado.

Há meio século, os escravos fugiam com frequência. Eram muitos, e nem todos gostavam da escravidão. Sucedia ocasionalmente apanharem pancada, e nem todos gostavam de apanhar pancada. Grande parte era apenas repreendida; havia alguém de casa que servia de padrinho, e o mesmo dono não era mau; além disso, o sentimento da propriedade moderava a ação, porque dinheiro também dói. A fuga repetia-se, entretanto. Casos houve, ainda que raros, em que o escravo de contrabando, apenas comprado no Valongo, deitava a correr, sem conhecer as ruas da cidade. Dos que seguiam para casa, não raro, apenas ladinos, pediam ao senhor que lhes marcasse aluguel, e iam ganhá-lo fora, quitandando.

Quem perdia um escravo por fuga dava algum dinheiro a quem lho levasse. Punha anúncios nas folhas públicas, com os sinais do fugido, o nome, a roupa, o defeito físico, se o tinha, o bairro por onde andava e a quantia de gratificação. Quando não vinha a quantia, vinha promessa: “gratificar-se-á generosamente” — ou “receberá uma boa gratificação”. Muita vez o anúncio trazia em cima ou ao lado uma vinheta, figura de preto, descalço, correndo, vara ao ombro, e na ponta uma trouxa. Protestava-se com todo o rigor da lei contra quem o acoitasse.

Ora, pegar escravos fugidios era um ofício do tempo. Não seria nobre, mas por ser instrumento da força com que se mantêm a lei e a propriedade, trazia esta outra nobreza implícita das ações reivindicadoras. Ninguém se metia em tal ofício por desfastio ou estudo; a pobreza, a necessidade de uma achega, a inaptidão para outros trabalhos, o acaso, e alguma vez o gosto de servir também, ainda que por outra via, davam o impulso ao homem que se sentia bastante rijo para pôr ordem à desordem.

Cândido Neves — em família, Candinho —, é a pessoa a quem se liga a história de uma fuga, cedeu à pobreza, quando adquiriu o ofício de pegar escravos fugidos. Tinha um defeito grave esse homem, não agüentava emprego nem ofício, carecia de estabilidade; é o que ele chamava caiporismo. Começou por querer aprender tipografia, mas viu cedo que era preciso algum tempo para compor bem, e ainda assim talvez não ganhasse o bastante; foi o que ele disse a si mesmo. O comércio chamou-lhe a atenção, era carreira boa. Com algum esforço entrou de caixeiro para um armarinho. A obrigação, porém, de atender e servir a todos feria-o na corda do orgulho, e ao cabo de cinco ou seis semanas estava na rua por sua vontade. Fiel de cartório, contínuo de uma repartição anexa ao Ministério do Império, carteiro e outros empregos foram deixados pouco depois de obtidos.

Quando veio a paixão da moça Clara, não tinha ele mais que dívidas, ainda que poucas, porque morava com um primo, entalhador de ofício. Depois de várias tentativas para obter emprego, resolveu adotar o ofício do primo, de que aliás já tomara algumas lições. Não lhe custou apanhar outras, mas, querendo aprender depressa, aprendeu mal. Não fazia obras finas nem complicadas, apenas garras para sofás e relevos comuns para cadeiras. Queria ter em que trabalhar quando casasse, e o casamento não se demorou muito.

Contava trinta anos, Clara vinte e dois. Ela era órfã, morava com uma tia, Mônica, e cosia com ela. Não cosia tanto que não namorasse o seu pouco, mas os namorados apenas queriam matar o tempo; não tinham outro empenho. Passavam às tardes, olhavam muito para ela, ela para eles, até que a noite a fazia recolher para a costura. O que ela notava é que nenhum deles lhe deixava saudades nem lhe acendia desejos. Talvez nem soubesse o nome de muitos. Queria casar, naturalmente. Era, como lhe dizia a tia, um pescar de caniço, a ver se o peixe pegava, mas o peixe passava de longe; algum que parasse, era só para andar à roda da isca, mirá-la, cheirá-la, deixá-la e ir a outras.

O amor traz sobrescritos. Quando a moça viu Cândido Neves, sentiu que era este o possível marido, o marido verdadeiro e único. O encontro deu-se em um baile; tal foi — para lembrar o primeiro ofício do namorado — tal foi a página inicial daquele livro, que tinha de sair mal composto e pior brochado. O casamento fez-se onze meses depois, e foi a mais bela festa das relações dos noivos. Amigas de Clara, menos por amizade que por inveja, tentaram arredá-la do passo que ia dar. Não negavam a gentileza do noivo, nem o amor que lhe tinha, nem ainda algumas virtudes; diziam que era dado em demasia a patuscadas.

— Pois ainda bem, replicava a noiva; ao menos, não caso com defunto.

— Não, defunto não; mas é que...

Não diziam o que era. Tia Mônica, depois do casamento, na casa pobre onde eles se foram abrigar, falou-lhes uma vez nos filhos possíveis. Eles queriam um, um só, embora viesse agravar a necessidade.

— Vocês, se tiverem um filho, morrem de fome, disse a tia à sobrinha.

— Nossa Senhora nos dará de comer, acudiu Clara.

Tia Mônica devia ter-lhes feito a advertência, ou ameaça, quando ele lhe foi pedir a mão da moça; mas também ela era amiga de patuscadas, e o casamento seria uma festa, como foi.

A alegria era comum aos três. O casal ria a propósito de tudo. Os mesmos nomes eram objeto de trocados, Clara, Neves, Cândido; não davam que comer, mas davam que rir, e o riso digeria-se sem esforço. Ela cosia agora mais, ele saía a empreitadas de uma coisa e outra; não tinha emprego certo.

Nem por isso abriam mão do filho. O filho é que, não sabendo daquele desejo específico, deixava-se estar escondido na eternidade. Um dia, porém, deu sinal de si a criança; varão ou fêmea, era o fruto abençoado que viria trazer ao casal a suspirada ventura. Tia Mônica ficou desorientada, Cândido e Clara riram dos seus sustos.

— Deus nos há de ajudar, titia, insistia a futura mãe.

A notícia correu de vizinha a vizinha. Não houve mais que espreitar a aurora do dia grande. A esposa trabalhava agora com mais vontade, e assim era preciso, uma vez que, além das costuras pagas, tinha de ir fazendo com retalhos o enxoval da criança. À força de pensar nela, vivia já com ela, media-lhe fraldas, cosia-lhe camisas. A porção era escassa, os intervalos longos. Tia Mônica ajudava, é certo, ainda que de má vontade.

— Vocês verão a triste vida, suspirava ela.

— Mas as outras crianças não nascem também? perguntou Clara.

— Nascem, e acham sempre alguma coisa certa que comer, ainda que pouco...

— Certa como?

— Certa, um emprego, um ofício, uma ocupação, mas em que é que o pai dessa infeliz criatura que aí vem gasta o tempo?

Cândido Neves, logo que soube daquela advertência, foi ter com a tia, não áspero, mas muito menos manso que de costume, e lhe perguntou se já algum dia deixara de comer.

— A senhora ainda não jejuou senão pela Semana Santa, e isso mesmo quando não quer jantar comigo. Nunca deixamos de ter o nosso bacalhau...

— Bem sei, mas somos três.

— Seremos quatro.

— Não é a mesma coisa.

— Que quer então que eu faça além do que faço?

— Alguma coisa mais certa. Veja o marceneiro da esquina, o homem do armarinho, o tipógrafo que casou sábado, todos têm um emprego certo... Não fique zangado; não digo que você seja vadio, mas a ocupação que escolheu é vaga. Você passa semanas sem vintém.

— Sim, mas lá vem uma noite que compensa tudo, até de sobra. Deus não me abandona, e preto fugido sabe que comigo não brinca; quase nenhum resiste, muitos entregam-se logo.

Tinha glória nisto, falava da esperança como de capital seguro. Daí a pouco ria, e fazia rir à tia, que era naturalmente alegre, e previa uma patuscada no batizado.

Cândido Neves perdera já o ofício de entalhador, como abrira mão de outros muitos, melhores ou piores. Pegar escravos fugidos trouxe-lhe um encanto novo. Não obrigava a estar longas horas sentado. Só exigia força, olho vivo, paciência, coragem e um pedaço de corda. Cândido Neves lia os anúncios, copiava-os, metia-os no bolso e saía às pesquisas. Tinha boa memória. Fixados os sinais e os costumes de um escravo fugido, gastava pouco tempo em achá-lo, segurá-lo, amarrá-lo e levá-lo. A força era muita, a agilidade também. Mais de uma vez, a uma esquina, conversando de coisas remotas, via passar um escravo como os outros, e descobria logo que ia fugido, quem era, o nome, o dono, a casa deste e a gratificação; interrompia a conversa e ia atrás do vicioso. Não o apanhava logo, espreitava lugar azado, e de um salto tinha a gratificação nas mãos. Nem sempre saía sem sangue, as unhas e os dentes do outro trabalhavam, mas geralmente ele os vencia sem o menor arranhão.

Um dia os lucros entraram a escassear. Os escravos fugidos não vinham já, como dantes, meter-se nas mãos de Cândido Neves. Havia mãos novas e hábeis. Como o negócio crescesse, mais de um desempregado pegou em si e numa corda, foi aos jornais, copiou anúncios e deitou-se à caçada. No próprio bairro havia mais de um competidor. Quer dizer que as dívidas de Cândido Neves começaram de subir, sem aqueles pagamentos prontos ou quase prontos dos primeiros tempos. A vida fez-se difícil e dura. Comia-se fiado e mal; comia-se tarde. O senhorio mandava pelos aluguéis.

Clara não tinha sequer tempo de remendar a roupa ao marido, tanta era a necessidade de coser para fora. Tia Mônica ajudava a sobrinha, naturalmente. Quando ele chegava à tarde, via-se-lhe pela cara que não trazia vintém. Jantava e saía outra vez, à cata de algum fugido. Já lhe sucedia, ainda que raro, enganar-se de pessoa, e pegar em escravo fiel que ia a serviço de seu senhor; tal era a cegueira da necessidade. Certa vez capturou um preto livre; desfez-se em desculpas, mas recebeu grande soma de murros que lhe deram os parentes do homem.

— É o que lhe faltava! exclamou a tia Mônica, ao vê-lo entrar, e depois de ouvir narrar o equívoco e suas conseqüências. Deixe-se disso, Candinho; procure outra vida, outro emprego.

Cândido quisera efetivamente fazer outra coisa, não pela razão do conselho, mas por simples gosto de trocar de ofício; seria um modo de mudar de pele ou de pessoa. O pior é que não achava à mão negócio que aprendesse depressa.

A natureza ia andando, o feto crescia, até fazer-se pesado à mãe, antes de nascer. Chegou o oitavo mês, mês de angústias e necessidades, menos ainda que o nono, cuja narração dispenso também. Melhor é dizer somente os seus efeitos. Não podiam ser mais amargos.

— Não, tia Mônica! bradou Candinho, recusando um conselho que me custa escrever, quanto mais ao pai ouvi-lo. Isso nunca!

Foi na última semana do derradeiro mês que a tia Mônica deu ao casal o conselho de levar a criança que nascesse à Roda dos Enjeitados. Em verdade, não podia haver palavra mais dura de tolerar a dois jovens pais que espreitavam a criança, para beijá-la, guardá-la, vê-la rir, crescer, engordar, pular... Enjeitar quê? enjeitar como? Candinho arregalou os olhos para a tia, e acabou dando um murro na mesa de jantar. A mesa, que era velha e desconjuntada, esteve quase a se desfazer inteiramente. Clara interveio.

— Titia não fala por mal, Candinho.

— Por mal? replicou tia Mônica. Por mal ou por bem, seja o que for, digo que é o melhor que vocês podem fazer. Vocês devem tudo; a carne e o feijão vão faltando. Se não aparecer algum dinheiro, como é que a família há de aumentar? E depois, há tempo; mais tarde, quando o senhor tiver a vida mais segura, os filhos que vierem serão recebidos com o mesmo cuidado que este ou maior. Este será bem-criado, sem lhe faltar nada. Pois então a Roda é alguma praia ou monturo? Lá não se mata ninguém, ninguém morre à toa, enquanto que aqui é certo morrer, se viver à míngua. Enfim...

Tia Mônica terminou a frase com um gesto de ombros, deu as costas e foi meter-se na alcova. Tinha já insinuado aquela solução, mas era a primeira vez que o fazia com tal franqueza e calor — crueldade, se preferes. Clara estendeu a mão ao marido, como a amparar-lhe o ânimo; Cândido Neves fez uma careta, e chamou maluca à tia, em voz baixa. A ternura dos dois foi interrompida por alguém que batia à porta da rua.

— Quem é? perguntou o marido.

— Sou eu.

Era o dono da casa, credor de três meses de aluguel, que vinha em pessoa ameaçar o inquilino. Este quis que ele entrasse.

— Não é preciso...

— Faça favor.

O credor entrou e recusou sentar-se; deitou os olhos à mobília para ver se daria algo à penhora; achou que pouco. Vinha receber os aluguéis vencidos, não podia esperar mais; se dentro de cinco dias não fosse pago, pô-lo-ia na rua. Não havia trabalhado para regalo dos outros. Ao vê-lo, ninguém diria que era proprietário; mas a palavra supria o que faltava ao gesto, e o pobre Cândido Neves preferiu calar a retorquir. Fez uma inclinação de promessa e súplica ao mesmo tempo. O dono da casa não cedeu mais.

— Cinco dias ou rua! repetiu, metendo a mão no ferrolho da porta e saindo.

Candinho saiu por outro lado. Nesses lances não chegava nunca ao desespero, contava com algum empréstimo, não sabia como nem onde, mas contava. Demais, recorreu aos anúncios. Achou vários, alguns já velhos, mas em vão os buscava desde muito. Gastou algumas horas sem proveito, e tornou para casa. Ao fim de quatro dias, não achou recursos; lançou mão de empenhos, foi a pessoas amigas do proprietário, não alcançando mais que a ordem de mudança.

A situação era aguda. Não achavam casa, nem contavam com pessoa que lhes emprestasse alguma; era ir para a rua. Não contavam com a tia. Tia Mônica teve arte de alcançar aposento para os três em casa de uma senhora velha e rica, que lhe prometeu emprestar os quartos baixos da casa, ao fundo da cocheira, para os lados de um pátio. Teve ainda a arte maior de não dizer nada aos dois, para que Cândido Neves, no desespero da crise, começasse por enjeitar o filho e acabasse alcançando algum meio seguro e regular de obter dinheiro; emendar a vida, em suma. Ouvia as queixas de Clara, sem as repetir, é certo, mas sem as consolar. No dia em que fossem obrigados a deixar a casa, fá-los-ia espantar com a notícia do obséquio e iriam dormir melhor do que cuidassem.

Assim sucedeu. Postos fora da casa, passaram ao aposento de favor, e dois dias depois nasceu a criança. A alegria do pai foi enorme, e a tristeza também. Tia Mônica insistiu em dar a criança à Roda. “Se você não a quer levar, deixe isso comigo; eu vou à Rua dos Barbonos.” Cândido Neves pediu que não, que esperasse, que ele mesmo a levaria. Notai que era um menino, e que ambos os pais desejavam justamente este sexo. Mal lhe deram algum leite; mas, como chovesse à noite, assentou o pai levá-lo à Roda na noite seguinte.

Naquela reviu todas as suas notas de escravos fugidos. As gratificações pela maior parte eram promessas; algumas traziam a soma escrita e escassa. Uma, porém, subia a cem mil-réis. Tratava-se de uma mulata; vinham indicações de gesto e de vestido. Cândido Neves andara a pesquisá-la sem melhor fortuna, e abrira mão do negócio; imaginou que algum amante da escrava a houvesse recolhido. Agora, porém, a vista nova da quantia e a necessidade dela animaram Cândido Neves a fazer um grande esforço derradeiro. Saiu de manhã a ver e indagar pela Rua e Largo da Carioca, Rua do Parto e da Ajuda, onde ela parecia andar, segundo o anúncio. Não a achou; apenas um farmacêutico da Rua da Ajuda se lembrava de ter vendido uma onça de qualquer droga, três dias antes, à pessoa que tinha os sinais indicados. Cândido Neves parecia falar como dono da escrava, e agradeceu cortesmente a notícia. Não foi mais feliz com outros fugidos de gratificação incerta ou barata.

Voltou para a triste casa que lhe haviam emprestado. Tia Mônica arranjara de si mesma a dieta para a recente mãe, e tinha já o menino para ser levado à Roda. O pai, não obstante o acordo feito, mal pôde esconder a dor do espetáculo. Não quis comer o que tia Mônica lhe guardara; não tinha fome, disse, e era verdade. Cogitou mil modos de ficar com o filho; nenhum prestava. Não podia esquecer o próprio albergue em que vivia. Consultou a mulher, que se mostrou resignada. Tia Mônica pintara-lhe a criação do menino; seria maior a miséria, podendo suceder que o filho achasse a morte sem recurso. Cândido Neves foi obrigado a cumprir a promessa; pediu à mulher que desse ao filho o resto do leite que ele beberia da mãe. Assim se fez; o pequeno adormeceu, o pai pegou dele, e saiu na direção da Rua dos Barbonos.

Que pensasse mais de uma vez em voltar para casa com ele, é certo; não menos certo é que o agasalhava muito, que o beijava, que lhe cobria o rosto para preservá-lo do sereno. Ao entrar na Rua da Guarda Velha, Cândido Neves começou a afrouxar o passo.

— Hei de entregá-lo o mais tarde que puder, murmurou ele.

Mas não sendo a rua infinita ou sequer longa, viria a acabá-la; foi então que lhe ocorreu entrar por um dos becos que ligavam aquela à Rua da Ajuda. Chegou ao fim do beco e, indo a dobrar à direita, na direção do Largo da Ajuda, viu do lado oposto um vulto de mulher; era a mulata fugida. Não dou aqui a comoção de Cândido Neves por não podê-lo fazer com a intensidade real. Um adjetivo basta; digamos enorme. Descendo a mulher, desceu ele também; a poucos passos estava a farmácia onde obtivera a informação, que referi acima. Entrou, achou o farmacêutico, pediu-lhe a fineza de guardar a criança por um instante; viria buscá-la sem falta.

— Mas...

Cândido Neves não lhe deu tempo de dizer nada; saiu rápido, atravessou a rua, até ao ponto em que pudesse pegar a mulher sem dar alarma. No extremo da rua, quando ela ia a descer a de S. José, Cândido Neves aproximou-se dela. Era a mesma, era a mulata fujona.

— Arminda! bradou, conforme a nomeava o anúncio.

Arminda voltou-se sem cuidar malícia. Foi só quando ele, tendo tirado o pedaço de corda da algibeira, pegou dos braços da escrava, que ela compreendeu e quis fugir. Era já impossível. Cândido Neves, com as mãos robustas, atava-lhe os pulsos e dizia que andasse. A escrava quis gritar, parece que chegou a soltar alguma voz mais alta que de costume, mas entendeu logo que ninguém viria libertá-la, ao contrário. Pediu então que a soltasse pelo amor de Deus.

— Estou grávida, meu senhor! exclamou. Se Vossa Senhoria tem algum filho, peço-lhe por amor dele que me solte; eu serei tua escrava, vou servi-lo pelo tempo que quiser. Me solte, meu senhor moço!

— Siga! repetiu Cândido Neves.

— Me solte!

— Não quero demoras; siga!

Houve aqui luta, porque a escrava, gemendo, arrastava-se a si e ao filho. Quem passava ou estava à porta de uma loja, compreendia o que era e naturalmente não acudia. Arminda ia alegando que o senhor era muito mau, e provavelmente a castigaria com açoites — coisa que, no estado em que ela estava, seria pior de sentir. Com certeza, ele lhe mandaria dar açoites.

— Você é que tem culpa. Quem lhe manda fazer filhos e fugir depois? perguntou Cândido Neves.
Não estava em maré de riso, por causa do filho que lá ficara na farmácia, à espera dele. Também é certo que não costumava dizer grandes coisas. Foi arrastando a escrava pela Rua do Ourives, em direção à da Alfândega, onde residia o senhor. Na esquina desta a luta cresceu; a escrava pôs os pés à parede, recuou com grande esforço, inutilmente. O que alcançou foi, apesar de ser a casa próxima, gastar mais tempo em lá chegar do que devera. Chegou, enfim, arrastada, desesperada, arquejando. Ainda ali ajoelhou-se, mas em vão. O senhor estava em casa, acudiu ao chamado e ao rumor.

— Aqui está a fujona, disse Cândido Neves.

— É ela mesma.

— Meu senhor!

— Anda, entra...

Arminda caiu no corredor. Ali mesmo o senhor da escrava abriu a carteira e tirou os cem mil-réis de gratificação. Cândido Neves guardou as duas notas de cinqüenta mil-reis, enquanto o senhor novamente dizia à escrava que entrasse. No chão, onde jazia, levada do medo e da dor, e após algum tempo de luta a escrava abortou.

O fruto de algum tempo entrou sem vida neste mundo, entre os gemidos da mãe e os gestos de desespero do dono. Cândido Neves viu todo esse espetáculo. Não sabia que horas eram. Quaisquer que fossem, urgia correr à Rua da Ajuda, e foi o que ele fez sem querer conhecer as conseqüências do desastre.

Quando lá chegou, viu o farmacêutico sozinho, sem o filho que lhe entregara. Quis esganá-lo. Felizmente, o farmacêutico explicou tudo a tempo; o menino estava lá dentro com a família, e ambos entraram. O pai recebeu o filho com a mesma fúria com que pegara a escrava fujona de há pouco, fúria diversa, naturalmente, fúria de amor. Agradeceu depressa e mal, e saiu às carreiras, não para a Roda dos Enjeitados, mas para a casa de empréstimo com o filho e os cem mil-réis de gratificação. Tia Mônica, ouvida a explicação, perdoou a volta do pequeno, uma vez que trazia os cem mil-réis. Disse, é verdade, algumas palavras duras contra a escrava, por causa do aborto, além da fuga. Cândido Neves, beijando o filho, entre lágrimas, verdadeiras, abençoava a fuga e não se lhe dava do aborto.

— Nem todas as crianças vingam, bateu-lhe o coração.

FIM

Fonte do texto: Uol.


COMENTÁRIO: SEGUE ABAIXO UMA AULA QUE TIVEMOS SOBRE O CONTO EM QUESTÃO:

AULA NA USP SOBRE O CONTO "PAI CONTRA MÃE".

Treinamento São Silvestre (XVIII)

Hoje fiz uma caminhada de 5 km no final da tarde. Tarde chuvosa e fria de domingo.

Leitura: Raízes do Brasil, de Sérgio B. de Holanda



Refeição Cultural

Leitura do capítulo 4. 

O SEMEADOR E O LADRILHADOR 

- A fundação de cidades como instrumento de dominação 
- Zelo urbanístico dos castelhanos: o triunfo completo da linha reta 
- Marinha e interior 
- A rotina contra a razão abstrata. O espírito da expansão portuguesa. A nobreza nova do Quinhentos 
- O realismo lusitano 
- Papel da igreja 

O autor vai acentuar ao longo do capítulo as diferenças características entre a colonização portuguesa e a castelhana. Eu achei seus pontos de vista bem interessantes. Me pareceu ver nas coisas cotidianas um pouco do que ele diz de nossa origem. 

O TRAÇADO URBANO CASTELHANO 

"Já à primeira vista, o próprio traçado dos centros urbanos na América espanhola denuncia o esforço determinado de vencer e retificar a fantasia caprichosa da paisagem agreste: é um ato definido da vontade humana. As ruas não se deixam modelar pela sinuosidade e pelas asperezas do solo; impõem-lhes antes o acento voluntário da linha reta." 

TRAÇADO CASTELHANO: DO CENTRO AOS QUATRO VENTOS 

"A construção da cidade começaria sempre pela chamada praça maior. Quando em costa de mar, essa praça ficaria no lugar de desembarque do porto; quando em zona mediterrânea, ao centro da povoação. A forma da praça seria a de um quadrilátero, cuja largura correspondesse pelo menos a dois terços do comprimento, de modo que, em dias de festa, nelas pudessem correr cavalos [...] A praça servia de base para o traçado das ruas: as quatro principais sairiam do centro de cada face da praça. De cada ângulo, sairiam mais duas, havendo o cuidado de que os quatro ângulos olhassem para os quatro ventos." 

AS UNIVERSIDADES CASTELHANAS PROVAM PROLONGAMENTO DO REINO 

"[...] o empreendimento de Portugal parece tímido e mal aparelhado para vencer. Comparado ao dos castelhanos em suas conquistas, o esforço dos portugueses distingue-se principalmente pela predominância de seu caráter de exploração comercial, repetindo assim o exemplo da colonização na Antiguidade, sobretudo da fenícia e da grega; os castelhanos, ao contrário, querem fazer do país ocupado um prolongamento orgânico do seu [...] ao encerrar-se o período colonial, tinham sido instaladas nas diversas possessões de Castela nada menos de 23 universidades, seis das quais de primeira categoria (sem incluir as do México e Lima)." 

CASTELHANOS BUSCARAM CLIMA MAIS AMENO NA COLONIZAÇÃO 

"Os grandes centros de povoação que edificaram os espanhóis no Novo Mundo estão situados precisamente nesses lugares onde a altitude permite aos europeus, mesmo na zona tórrida, desfrutar um clima semelhante ao que lhes é habitual em seu país. Ao contrário da colonização portuguesa, que foi antes de tudo litorânea e tropical, a castelhana parece fugir deliberadamente da marinha, preferindo as terras do interior e os planaltos." 

PARA OS PORTUGUESES A ORDEM ERA POVOAR O LITORAL 

"Os portugueses, esses criavam todas as dificuldades às entradas terra adentro, receosos de que com isso se despovoasse a marinha." 

AOS PAULISTAS COUBE ESTENDER O TRAÇADO DE TORDESILHAS 

"A providência de Martim Afonso parecia a frei Gaspar, mesmo depois que os paulistas, graças à sua energia e ambição, tinham corrigido por conta própria o traçado de Tordesilhas, estendendo a colônia sertão adentro, como a mais ajustada ao bem comum do Reino e a mais propícia ao desenvolvimento da capitania." (providência de restringir a entrada ao interior da colônia) 

ATÉ HOJE, "INTERIOR" TEM ESTIGMA DE ATRASO 

"A influência dessa colonização litorânea, que praticavam, de preferência, os portugueses, ainda persiste até aos nossos dias. Quando hoje se fala em 'interior', pensa-se, como no século XVI, em região escassamente povoada e apenas atingida pela cultura urbana." (lembrar que o texto é de meio século atrás) 

PORTUGUESES: COMUNICAÇÃO FLUVIAL E MARÍTIMA 

"A facilidade das comunicações por via marítima e, à falta desta, por via fluvial, tão menosprezada pelos castelhanos, constituiu pode-se dizer que o fundamento do esforço colonizador de Portugal. Os regimentos forais concedidos pela Coroa portuguesa, quando sucedia tratarem de regiões fora da beira-mar, insistiam sempre em que se povoassem somente as partes que ficavam à margem das grandes correntes navegáveis, como o rio São Francisco. A legislação espanhola, ao contrário, mal se refere à navegação fluvial como meio de comunicação; o transporte dos homens e mantimentos podia ser feito por terra." 

COLONIZAÇÃO PORTUGUESA AVANÇOU COM APOIO DOS TUPIS 

"E é significativo que a colonização portuguesa não se tenha firmado ou prosperado muito fora das regiões antes povoadas pelos indígenas da língua-geral. Estes, dir-se-ia que apenas preparavam terreno para a conquista lusitana. Onde a expansão dos tupis sofria um hiato, interrompia-se também a colonização branca..." 

A COLONIZAÇÃO PORTUGUESA, NA VISÃO DE P. MANUEL DA NÓBREGA 

"O padre Manuel da Nóbrega, em carta de 1552, exclamava: '[...] de quantos lá vieram, nenhum tem amor a esta terra [...] todos querem fazer em seu proveito, ainda que seja a custa da terra, porque esperam de se ir' ". 

E mais adiante segue: "Não querem bem à terra, pois têm sua afeição em Portugal; nem trabalham tanto para a favorecer, como por se aproveitarem de qualquer maneira que puderem; isto é geral, posto que entre eles haverá alguns fora desta regra." 

FEITORIZAÇÃO PORTUGUESA E NÃO COLONIZAÇÃO 

"Mesmo em seus melhores momentos, a obra realizada no Brasil pelos portugueses teve um caráter mais acentuado de feitorização do que de colonização." 

TRAÇADO DA CIDADE PORTUGUESA: OBEDIÊNCIA À TOPOGRAFIA 

"Seja como for, o traçado geométrico jamais pôde alcançar, entre nós, a importância que veio a ter em terras da Coroa de Castela: não raro o desenvolvimento ulterior dos centros urbanos repeliu aqui esse esquema inicial para obedecer antes às sugestões topográficas". 

"A cidade que os portugueses construíram na América não é produto mental, não chega a contradizer o quadro da natureza, e sua silhueta se enlaça na linha da paisagem. Nenhum rigor, nenhum método, nenhuma providência, sempre esse significativo abandono que exprime a palavra 'desleixo' - palavra que o escritor Aubrey Bell considerou tão tipicamente portuguesa como 'saudade' e que, no seu entender, implica menos falta de energia do que uma íntima convicção de que 'não vale a pena...'." 

EXPANSÃO PORTUGUESA: FRUTO DA RACIONALIDADE E DA PRUDÊNCIA CALCULADA 

"Comparada ao delirante arroubo de um Colombo, por exemplo, não há dúvida que mesmo a obra do grande Vasco da Gama apresenta, como fundo de tela, bom senso atento a minudências e uma razão cautelosa e pedestre [...] A expansão dos portugueses no mundo representou sobretudo obra de prudência, de juízo discreto, de entendimento 'que experiências fazem repousado' [...] Uma coragem sem dúvida obstinada, mas raramente descomedida, constitui traço comum de todos os grandes marinheiros lusitanos, exceção feita de Magalhães". 

SEMEADOR X LADRILHADOR 

Na poesia portuguesa e dos portugueses: "A ordem que aceita não é a que compõem os homens com trabalho, mas a que fazem com desleixo e certa liberdade; a ordem do semeador, não a do ladrilhador. É também a ordem em que estão postas as coisas divinas e naturais pois que, já o dizia Antônio Vieira, se as estrelas estão em ordem, 'he ordem que faz influência, não he ordem que faça favor. Não fez Deus o Céu em xadrez de estrelas [...]". 

O autor nos diz que a rigorosidade castelhana da ordem e na uniformidade é fruto de sua falta de unidade interna, diferente do caso português. 

"A fúria centralizadora, codificadora, uniformizadora de Castela, que tem sua expressão mais nítida no gosto dos regulamentos meticulosos - capaz de exercer-se, conforme já se acentuou, até sobre o traçado das cidades coloniais -, vem de um povo internamente desunido e sob permanente ameaça de desagregação. Povo que precisou lutar, dentro de suas próprias fronteiras peninsulares, com o problema dos aragoneses, o dos catalães, o dos euscaros e, não só até 1492, mas até 1611, o dos mouriscos". 

O povo português foi o que conseguiu unidade primeiro, em relação a todos os povos europeus. 

Para finalizar o capítulo, Sérgio Buarque nos fala um pouco de como a igreja católica deu excessivos poderes à Coroa Portuguesa, de maneira que esta determinasse todo o funcionamento da igreja aqui na colônia. Esta seria uma das razões para haver discrepância entre a instituição igreja no Brasil e os padres (as pessoas) contrários aos desmandos da Coroa. 


Bibliografia: 

HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. Companhia das Letras, 26ª edição, 27ª reimpressão 2007.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Treinamento São Silvestre (XVII)

Apesar de já saber que meu projeto São Silvestre 2009 foi pro saco, a vida segue.

Hoje fiz um percurso de 10 km, sendo 3 km andando, 3 km correndo, 2 km andando e mais 2 km correndo. Ao todo foram 80 minutos.

O dia esteve chuvoso.

Leituras sobre a origem da grafia de nossa Língua Brasileira

(o texto foi parte de um trabalho em grupo feito na Usp)

Dados históricos interessantes acerca do texto "Breve notícia da Ortografia Portuguesa", de Antonio Martins de Araújo, da UFRJ.

Ao pesquisarmos a respeito da longa história da grafia da Língua Portuguesa, de sua origem aos dias atuais, é fácil perceber o porquê da “verdadeira floresta de variantes léxicas” existente desde os primórdios da língua, como diz Antonio Martins de Araújo.

A existência de grande número de variantes léxicas é fruto dos dilemas dos “manuscritores” desde o século XIII. Ou se grafava as palavras cunhadas a partir de matrizes da língua-mãe, ou se grafava a partir da impressão auditiva vinda da emissão dos novos vocábulos.

Só a palavra IGREJA, por exemplo, já conta nas pesquisas filológicas atuais com mais de 50 variantes morfológicas e/ou meramente gráficas.

Ex: ecclesia, egleja, eglesa, eglessa, eglisa, eigleja, eygreya, eygreygya, igleja, igrejja, iglisa, igriga etc.

A pesquisa das regras gramaticais ou ortográficas vigentes para o período de nosso corpus ou amostra – relatos colhidos por escrivães em 1862 – mostra que é proposta à Academia Brasileira de Letras - ABL - uma reforma ortográfica em 1907 por Medeiros e Albuquerque que abriga normas usadas no dicionário do filólogo português Cândido de Figueiredo.

Essa proposta de reforma teve a capacidade de quebrar a inércia com que o tema era tratado no Brasil até então.

Araújo faz referência à primeira gramática no Brasil, editada em 1835, mantendo as tradições portuguesas de dobrar as consoantes:

Nossa primeira gramática, o Compendio de grammatica da lingua nacional, de Antonio Álvares Pereira Coruja, foi editada treze anos após a proclamação de nossa independência política, e suas edições mantiveram o figurino português dobrando consoantes e repetindo os grupos consonantais chamados etimológicos (ph, th, ch), e usando o k e o y. Sotero dos Reis em 1865, e Júlio Ribeiro em 1881, em questões de ortografia praticamente nada inovaram em suas gramáticas pioneiras.” (P.441)

A história da ortografia brasileira é uma verdadeira barafunda, um festival de idas e vindas entre as regras portuguesa, brasileira e um misto entre ambas.

Toda marcha e contramarcha a que se assistiu em nosso país, por falta de assessoramento adequado aos governantes, lembra a figura do mágico que esconde na manga do casaco uma carta de baralho a que faz reaparecer por várias vezes, para estarrecimento do publico boquiaberto.” (P.442)

Depois da reforma da A.B.L. de 1907, ocorreram várias idas e vindas nas regras portuguesa e brasileira. Araújo chega a dizer o seguinte do período do Estado Novo:

Por cerca de três anos (1934-37), a ortografia brasileira é do tipo cada-um-por-si-e-Deus-por-todos, pois a Constituição do Estado Novo faz-nos voltar à ortografia de nossa primeira Constituição Republicana (pasmem!) de 1891.” (P.442)

E para terminar esse período conturbado do regramento de nossa língua pátria já no século XX, Araújo afirma:

Enfim, em meio a tantas reviravoltas, o presidente (Getúlio) decidiu deixar ficar como estava, para ver como ficava. E assim foi feito. Nada mais. Ficou tudo como dantes, no quartel de Abrantes. Com exceção de uma espanadelazinha no acento diferencial e no trema de ditongos átonos, em 1971, ficou assim até nossos dias. Até quando, só Deus sabe.” (P.443)

Bibliografia:

PEREIRA, Cilene da Cunha & PEREIRA, Paulo Roberto Dias. ORG. e COORD. Miscelânea de estudos lingüísticos, filológicos e literários. In Memoriam Celso Cunha. Ed. Nova Fronteira, 1995, RJ.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Refeição Cultural 40 - Cansaço! Mas buscando energia nos desafios

Como estou cansado! Aliás, ando deprimido.

Apesar disso, estou buscando um desafio que me estimule e me dê ganas de atingir algo.

Estou tentando ser "acabativo" ao contrário de ser sempre "iniciativo" em tudo. Quero ver se depois de tanto ter vontade, e não fazê-lo, aprendo outros idiomas como o italiano e o francês. Além de ressuscitar o inglês e melhorar o espanhol.

É só encarar como um jogo de desafio. Algo como o jogo Master. Cada dia aprendo alguma coisa. Depois vou revendo e acrescentando pouco a pouco.

Hoje brinquei com o idioma italiano durante a ida e a volta para casa, no trenzão da CPTM.

Também precisei escrever para a OIT, em espanhol, pedindo informações sobre o paradeiro de meus materiais do curso sobre a Crise Mundial, enviados da Itália para cá, por alguma empresa de transporte, há três meses.

EU VOU APRENDER MAIS IDIOMAS.

Leitura de Raízes do Brasil, de S. B. Holanda



Refeição Cultural

Seguindo a leitura dessa obra descortinadora, o capítulo 3 tratará dos seguinte tópicos: 

HERANÇA RURAL 

- A Abolição: marco divisório entre duas épocas 
- Incompatibilidade do trabalho escravo com a civilização burguesa e o capitalismo moderno 
- Da Lei Eusébio à crise de 64. O caso de Mauá 
- Patriarcalismo e espírito de facção 
- Causas da posição suprema conferida às virtudes da imaginação e da inteligência 
- Cairu e suas ideias 
- Decoro Aristocrático 
- Ditadura dos domínios agrários 
- Contraste entre a pujança das terras de lavoura e a mesquinhez das cidades na era colonial 

O autor faz uma diferenciação interessante: 

Os portugueses não instauraram aqui uma civilização agrícola* e sim uma civilização de raízes rurais. 

"É efetivamente nas propriedades rústicas que toda a vida da colônia se concentra durante os séculos iniciais da ocupação europeia: as cidades são virtualmente, se não de fato, simples dependências delas." 

*por não utilizarem aqui as técnicas modernas de plantio e ferramentas disponíveis à época. 

MUDANÇAS NA DÉCADA DE 1850 

Além da proibição do tráfico de escravos, o período entre 51 e 55 teve um 'boom' de criação de sociedades anônimas. Refundação do Banco do Brasil, linhas telegráficas, Banco Rural e Hipotecário, estradas de ferro (Mauá). 

Os partidários do status quo vigente são contrários às mudanças que se processavam, principalmente no que diz respeito ao fim do tráfico de escravos. 

"Estes eram, naturalmente, do parecer que, em país novo e mal povoado como o Brasil, a importação de negros, por mais algum tempo, seria, na pior hipótese, um mal inevitável, em todo o caso diminuto, se comparado à miséria geral que a carência de mão-de-obra poderia produzir" 

LEI EUSÉBIO DE QUEIRÓS 

A partir de 1850 reduziram-se drasticamente a importação de humanos escravos para o Brasil, tanto pela lei quanto pela intensificação das atividades britânicas de repressão ao tráfico. 

BANCO DO BRASIL - FUNDING: $ QUE ERA INVESTIDO NA ESCRAVIDÃO 

"A própria fundação do Banco do Brasil de 1851 está, segundo parece, relacionada com um plano deliberado de aproveitamento de tais recursos (capital do comércio de humanos) na organização de um grande instituto de crédito". 

Mauá pensou no funding a partir do extinto tráfico negreiro, para que os capitalistas investissem em banco de crédito - Banco do Brasil: 

"Reunir os capitais que se viam repentinamente deslocados de ilícito comércio e fazê-los convergir a um centro onde pudessem ir alimentar as forças produtivas do país foi o pensamento que me surgiu na mente, ao ter a certeza de que aquele fato era irrevogável" (Visconde de Mauá, Autobiografia) 

A GÊNESE DO FAVOR, CLIENTELISMO E NEPOTISMO 

As raízes de grandes males do Brasil estariam na forma como era instituído o patrimonialismo e o personalismo. Ao redor do patriarca existia uma concentração de gentes - famílias, agregados e apaniguados - que criavam estreitas relações fechadas de dependência e autoproteção. 

"Segundo tal concepção, as facções são constituídas à semelhança das famílias, precisamente das famílias de estilo patriarcal, onde os vínculos biológicos e afetivos que unem ao chefe os descendentes, colaterais e afins, além da famulagem e dos agregados de toda sorte, hão de preponderar sobre as demais considerações. Formam, assim, como um todo indivisível, cujos membros se acham associados, uns aos outros, por sentimentos e deveres, nunca por interesses ou ideias". 

O ENGENHO - UM MICROCOSMO COMPLETO 

"Nos domínios rurais, a autoridade do proprietário de terras não sofria réplica. Tudo se fazia consoante sua vontade, muitas vezes caprichosa e despótica. O engenho constituía um organismo completo e que, tanto quanto possível, se bastava a si mesmo". 

A IDEIA DE 'FAMÍLIA' NOS ENGENHOS 

"Nos domínios rurais é o tipo de família organizada segundo as normas clássicas do velho direito romano-canônico, mantidas na península Ibérica através de inúmeras gerações, que prevalece como base e centro de toda a organização. Os escravos das plantações e das casas, e não somente escravos, como os agregados, dilatam o círculo familiar e, com ele, a autoridade imensa do pater-famílias. Esse núcleo bem característico em tudo se comporta como seu modelo da Antiguidade, em que a própria palavra 'família', derivada de famulus, se acha estreitamente vinculada à ideia de escravidão, e em que mesmo os filhos são apenas os membros livres do vasto corpo, inteiramente subordinado ao patriarca, os liveri

"Sempre imerso em si mesmo, não tolerando nenhuma pressão de fora, o grupo familiar mantém-se imune de qualquer restrição ou abalo. Em seu recatado isolamento pode desprezar qualquer princípio superior que procure perturbá-lo ou oprimi-lo". 

UMA GÊNESE DA PROMISCUIDADE DO PRIVADO NO PÚBLICO 

"Representando, como já se notou acima, o único setor onde o princípio de autoridade é indisputado, a família colonial fornecia a ideia mais normal do poder, da respeitabilidade, da obediência e da coesão entre os homens. O resultado era predominarem, em toda a vida social, sentimentos próprios à comunidade doméstica, naturalmente particularista e antipolítica, uma invasão do público pelo privado, do Estado pela família". 

EXPLICAÇÃO DE NOSSA ELITE PSEUDO-ESCLARECIDA 

"O trabalho mental, que não suja as mãos e não fatiga o corpo, pode constituir, com efeito, ocupação em todos os sentidos digna de antigos senhores de escravos e dos seus herdeiros. Não significa forçosamente, neste caso, amor ao pensamento especulativo - a verdade é que, embora presumindo o contrário, dedicamos, de modo geral, pouca estima às especulações intelectuais - mas amor à frase sonora, ao verbo espontâneo e abundante, à erudição ostentosa, à expressão rara. É que para bem corresponder ao papel que, mesmo sem o saber, lhe conferimos, inteligência há de ser ornamento e prenda, não instrumento de conhecimento e de ação". 

(fala sério!, não é perfeito com o que temos no Brasil? Os leitores de Veja, Estadão, Folha achando que são esclarecidos e as mirians leitões, jôs soares, e os 'técnicos' imbecis que ditam as regras de economia etc) 

UMA POSSÍVEL SÍNTESE (e gênese dos nossos ruralistas) 

"Procurou-se mostrar no presente capítulo como, ao menos em sua etapa inicial, esse processo correspondeu de fato a um desenvolvimento da tradicional situação de dependência em que se achavam colocadas as cidades em face dos domínios agrários. Na ausência de uma burguesia urbana independente, os candidatos às funções novamente criadas recrutam-se, por força, entre indivíduos da mesma massa dos antigos senhores rurais, portadores de mentalidade e tendência características dessa classe. Toda a ordem administrativa do país, durante o Império e mesmo depois, já no regime republicano, há de comportar, por isso, elementos estreitamente vinculados ao velho sistema senhorial". 

AS CIDADES COMO APÊNDICES DAS CASAS-GRANDES 

"No Brasil colonial, entretanto, as terras dedicadas à lavoura eram a morada habitual dos grandes. Só afluíam eles aos centros urbanos a fim de assistirem aos festejos e solenidades." 

Amigos, como é fácil ver os ruralistas, os coronéis sarneis, barbalhos etc, lendo este ensaio de Sérgio Buarque de Holanda. 


Bibliografia: 

HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. Companhia das Letras, 26ª edição, 27ª reimpressão 2007.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Estudos de francês

BONJOUR, MADEMOISELLE, VOUS ÊTES BIEN MADEMOISELLE SILVA?
Bom dia, senhorita, é a senhorita Silva?

OUI, C'EST MOI, VOUS ÊTES MONSIEUR OLIVEIRA?
Sim, sou eu, o senhor (formal) é o sr. Oliveira?

OUI, JE M'APPELLE WILLIAM.
Sim, me chamo William.

ET MOI, C'EST JULIA.
O meu é Júlia.

VOUS AVEZ DES BAGAGES? (DES=uns/umas)
A senhorita (formal) tem alguma bagagem?

J'AI JUSTE UN SAC ET UNE VALISE.
Tenho apenas uma sacola e uma mala.

DONNEZ-MOI TOUT ÇA (isso). JE SUIS EN VOITURE, LA VOITURE EST GARÉE RUE VICTOR, C'EST TOUT PRÈS.
Me dê isso tudo. Estou de carro, ele está estacionado na rua Vitor, que é logo ao lado.

Treinamento São Silvestre (XVI)

Depois de um noite mal-dormida, caminhei hoje à tarde uns 6,5 km em ritmo forte.

Ao fim do dia, caminhei mais 4,5 km em ritmo leve, dando uma volta no Parque Continental.

sábado, 5 de dezembro de 2009

A política de equilíbrio - texto de Raymond Aron

Leitura e fichamento do texto de Raymond Aron - muitas frases são citações, tanto em inglês quanto em português.

O autor discorre sobre as questões de equilíbrio de poder entre os Estados, baseado na ideia da escola realista de equilíbrio de forças, ou seja, capacidade dos Estados de exercerem pressão ou coação sobre os demais.

Aron trabalha com referência a um ensaio de David Hume intitulado On the Balance of Power.

Ao citar várias nações do passado, é enfatizado que, em geral, pertencem ao sistema de equilíbrio de poder as populações que podem intervir na guerra.

A ideia de equilíbrio seria algo moderno enquanto conceito. Aron cita Hume:

"In all the politics of Greece, the anxiety with regard to (a angústia com respeito a) the balance of power is apparent, and is expressly pointed out to us, even by ancient historians. Thucydides represents the league which was formed against Athens, and which produced the Peloponesian war, as entirely owing (totalmente devido a) to this principle. And after the decline of Athens, when the Tebans and Lacedemonians disputed for sovereignty (soberania), we find that the Athenians (as well as many other Republics) always threw themselves (se lançaram) into the lighter scale (em escala muito clara), and endeavoured (esforçaram-se) to preserve the balance".

Aron afirma que muitos povos antigos ignoraram a política de equilíbrio de forças devido à espantosa história do império romano, pois Roma foi subjugando todos os seus adversários, um após outro.

A exceção seria Hiero, rei de Siracusa.

"Hiero, rei de Siracusa, foi o único príncipe que parece ter compreendido o princípio do equilíbrio de forças, durante a história romana: 'Nor ought such a force ever to be trown into one hand (nenhum poder deveria ser lançado assim em mão única) as to incapacitate the neighbouring states from defending their rights against it'. Esta é a fórmula mais simples do equilíbrio: nenhum Estado deve possuir uma força tal que os Estados vizinhos sejam incapazes de defender, contra ele, seus direitos. Uma fórmula fundada sobre o common sense and obvious reasoning, simples demais para haver escapado à percepção dos antigos".

Depois Hume cita o sistema europeu e a rivalidade entre a FRANÇA e a INGLATERRA. Após cinco guerras entre eles, quatro vencidas pela monarquia francesa, os ingleses passaram a ser os fiéis parceiros de qualquer outro reino que entrasse em guerra contra a França.

"A hostilidade da Inglaterra contra a França passa por certa, em qualquer circunstância, e os aliados contam com as forças inglesas como com suas próprias forças, demonstrando uma intransigência extrema: a Inglaterra deve sempre assumir o ônus das hostilidades. Finalmente, 'we are such true combatants that, when once engaged, we loose all concern (interesse, preocupação) for ourselves and our posterity, and consider only how we may best annoy (irritar, incomodar) the enemy' ".

Aron afirma que Hume é favorável à política do equilíbrio porque é hostil aos impérios extensos. "Enormous monarchies are probably destructive to human nature in their progress, in their continuance, and even in their downfall, which never can be very distant from their establishment".

Hume, assim como Montesquieu, pensava que o "Estado perderia fatalmente suas qualidades com a expansão territorial, a política de equilíbrio impõe-se razoavelmente em função da experiência histórica e dos valores morais".

"A política de equilíbrio obedece a uma regra de bom-senso e deriva da prudência necessária aos Estados desejosos de preservar sua independência, de não estar à mercê de outro Estado que disponha de meios incontrastáveis".

UMA VISÃO DA ESCOLA REALISTA
"Parece condenável aos olhos dos estadistas ou dos políticos doutrinários que interpretam o uso da força, aberto ou clandestino, como a marca e a expressão da maldade humana. Esses censores devem assim conceder um substituto, jurídico ou espiritual, para o equilíbrio de vontades autônomas"

CONCLUSÃO DO AUTOR
No nível mais elevado de abstração, a política de equilíbrio se reduz à manobra destinada a impedir que um Estado acumule forças superiores às de seus rivais coligados. Todo Estado, se quiser salvaguardar o equilíbrio, tomará posição contra o Estado ou a coalizão que pareça capaz de manter tal superioridade. Esta é uma regra geral válida para todos os sistemas internacionais.

Dois modelos de sistemas irão configurar as relações de forças entre os Estados: o Pluripolar e o Bipolar.


Bibliografia:
MAGNOLI, Demétrio. Questões Internacionais Contemporâneas - manual do candidato. Funag, IRBr. Brasília, 1995.