quinta-feira, 20 de abril de 2023

Que será dos seres humanos e do planeta Terra?



Refeição Cultural

Osasco, 20 de abril de 2022. Quinta-feira.


Ando sem vontade alguma de escrever. Estou pensando com seriedade em deixar todas ou algumas das mídias sociais que se tem por aí. Essas mídias das plataformas das big techs acabaram mudando o comportamento humano, os seres humanos. Mesmo sabendo disso, não é fácil deixar de existir nas redes sociais e virtuais. Desconectar-se é mais difícil que deixar de usar qualquer droga ou abandonar um vício ou hábito. No mundo de hoje não existir nas redes é quase como não existir em carne e osso. E não é fácil desaparecer do mundo virtual e só existir, ser natureza. Aliás, as sociedades modernas com essas tecnologias virtuais nos obrigam a estar catalogados e "logados" até para acessar os direitos mais comezinhos da cidadania.

Ao andar por aí, fico observando de forma discreta, meio de soslaio, as pessoas ao meu redor. Os humanos parecem robôs, animais mamíferos andando por aí como os gados em pastos ou granjas (cercadinhos ou bolhas virtuais e presenciais), como os semoventes das propriedades capitalistas - animais que pertencem a alguém, do tipo vaca, galinha, humano escravizado -, somos animais humanos com as caras nas telas dos aparelhos conectados nas plataformas das big techs. Nunca imaginaria ser tão real aquela cena do filme Matrix (1999) na qual todos os humanos estão em ovos cheios de tubos, usados como baterias de energia do sistema central daquela sociedade distópica (estamos na distopia?).

Observo as pessoas ao meu redor ou nas imagens dos mundos virtuais: as pessoas caminhando no Parque do Sabiá no fim da tarde - tão diferentes, mas tão iguais, pois elas têm padrão determinado pelo sistema -; as pessoas no pequeno zoológico de Uberlândia, o pai chamando de "raposinha" um cachorro do mato com a placa de identificação bem na frente dele - estamos nos tornando analfabetos -; a atendente com quase trinta anos de idade que não sabe ou nunca ouviu falar do país chamado Cuba; um adulto hoje mal sabe o nome de uma ave comum de sua região - sabiá, bem-te-vi, joão-de-barro viraram tudo "passarinho".

O mundo todo foi terceirizado e uberizado, ninguém sabe mais porra nenhuma de assunto nenhum. As fontes de informação são fontes de desinformação e as referências do gado humano são influenciadores que não sabem porra nenhuma de assunto nenhum. Mas falam de tudo e influenciam milhões de animais humanos. As plataformas de busca virtuais têm algoritmos por trás e qualquer busca é direcionada de forma parcial, enviesada, com ideologia ou com objetivos de lucro no resultado de qualquer pesquisa on-line. 

Com a vitória da desinformação no mundo humano do século 21, não temos mais segurança para confiar em nada e em ninguém. Isso facilitou assassinar reputações de pessoas físicas e jurídicas honestas com fake news e acusações sem provas e facilitou a vida dos piores criminosos e corporações de seguirem impunes pelo poder que têm em pautar nas redes e grupos de poder suas versões das coisas (pós-verdade).

Aff... que cansaço descrever o mundo atual! 

As tecnologias que nós humanos criamos foram usadas por grandes corporações do mundo do capital para mudar o nosso comportamento. A lógica da dominação de massas por pequenos grupos existe desde sempre, desde nossa evolução no mundo animal. O que mudou em relação aos povos e culturas e impérios do passado é a capacidade das novas tecnologias em dar escala à manipulação humana global. 

Quando tento discutir a respeito da tendência atual do uso das tecnologias inviabilizarem a sobrevivência do homo sapiens sapiens com algumas pessoas que considero estudiosas ou intelectuais que estudam o mundo humano e que de alguma forma atuaram na política nas últimas décadas, praticamente todas dizem que não tem o que ser feito porque não se pode parar ou retroceder em tecnologias que criamos. Então, tá...

Entendo que os seres humanos já interromperam o uso de tecnologias que foram criadas no último século e que poderiam inviabilizar a espécie humana e todas as demais espécies animais e vegetais. A sequência de décadas desenvolvendo bombas atômicas em meados do século 20 deixou claro que se algumas delas fossem usadas a vida na Terra praticamente seria extinta. Com isso, tratados internacionais foram feitos naquele momento e soluções foram dadas para que não se tornasse algo corriqueiro ficar lançando bombas atômicas em comunidades humanas como fizeram os norte-americanos em Hiroshima e Nagasaki, no Japão, nos dias 6 e 9 de agosto de 1945. 

Ou seja, se estão desfazendo os seres humanos por que não frear e rever essas tecnologias de redes sociais, algoritmos e IA?

As tais tecnologias de comunicação dominadas por algumas corporações, as big techs, têm hoje um poder de manipular e alterar o comportamento de forma permanente de bilhões de seres humanos, têm a capacidade de interferir nas decisões políticas das comunidades e inviabilizar a soberania de países do mundo inteiro, e estão fazendo isso, e essas tecnologias atuais se concentram cada dia mais e estão na mão de menos seres humanos, a ponto de podermos citar uns dez nomes de pessoas que dominam o mundo todo. Isso não pode continuar assim, mas parece que nada pode ser feito porque na hora de se debater sobre a questão os senões predominam - é a liberdade blá blá blá - e tudo segue como está seguindo... pro fim do mundo humano. Estudos têm demonstrado que os humanos estão perdendo suas capacidades humanas - comunicação, inteligência, sociabilidade etc.

E nós não conseguimos mais estabelecer diálogos entre nós humanos, não conseguimos porque nosso comportamento foi alterado e muitos de nós não percebemos isso. No meu espectro político de esquerda, por exemplo, não existe mais espaço para divergência de ideias, ou somos apoiadores de alguns líderes tratados como deuses inquestionáveis e infalíveis, ou não somos mais nada, somos vaporizados, já não existimos. Isso no campo da esquerda e dos grupos democráticos. No outro espectro o mundo sempre foi o do mandonismo de quem detém o poder e da obediência canina de quem não tem e quer sobreviver: "manda quem pode, obedece quem tem juízo". 

Não temos mais paciência sequer com as pessoas mais próximas, na família, no rol de amigos e conhecidos. Se discorda de mim, já cresço a voz e o outro já sacode a cabeça negativamente. Ninguém está aberto a ouvir qualquer coisa que não seja uma concordância... é o que estamos nos tornando.

Enfim, já escrevi muito nesta postagem-desabafo. 

O receio de não escrever é emburrecer, é deixar de ter a capacidade mínima de uma pessoa alfabetizada e com consciência e formação política. O cérebro é plástico e adaptável como nos ensina o professor e neurocientista Miguel Nicolelis. Se não usamos as capacidades que o nosso cérebro de 86 bilhões de neurônios desenvolveu ao longo do viver o cérebro se adapta rapidamente à nova realidade. Se aceitarmos sermos manipulados, seremos; se aceitarmos odiar, odiaremos; se aceitarmos o medo, seremos seres do medo (como diz Drummond); se não lermos e estudarmos mais, seremos seres menos lidos e estudados; se não refletirmos, seremos autômatos, seres de instintos (gado?); se não tivermos olhos pra ver e prestar atenção e refletir sobre o mundo ao nosso redor, seremos cegos que podendo ver não veem (como diz Saramago).

Está bem complicado viver, mas viver é oportunidade. Viver é uma luta diária para qualquer ser vivo. Seguimos vivendo, somos natureza.

William


quinta-feira, 13 de abril de 2023

Diário de uma difamação - Boaventura de Sousa Santos

Apresentação do blog:

Segue abaixo a posição do professor Boaventura de Sousa Santos, sociólogo português, a respeito de uma acusação de assédio por parte de alunas da instituição na qual ele trabalhou ao longo de mais de quarenta anos: Centro de Estudos Sociais (CES). Não faço juízo de valor a respeito da questão, mas acho importante ouvir o professor, que se coloca à disposição para a apuração dos fatos perante a lei.

O texto e os argumentos me parecem sólidos. Entendo que o professor merece o benefício da dúvida. Eu não o conheço pessoalmente, mas acompanho seu trabalho há muitos anos. 

Me lembro quando o companheiro João Vaccari Neto foi acusado de diversos crimes que depois se verificaram serem acusações mentirosas, ele foi inocentado. À época, eu me posicionei a respeito do caso de Vaccari, este sim conhecido e com quem atuei na direção do Sindicato dos Bancários.

Quando fui diretor eleito de uma instituição nacional de saúde sofri ao final de meu mandato um processo de lawfare que se iniciou com uma carta anônima asquerosa, com acusações claramente falsas e que não merecia o crédito que foi dado a ela para me imputar meses de sofrimento e humilhações por motivações claramente políticas, queriam tirar minha energia e tempo para aquilo que era mais importante, defender os direitos dos trabalhadores que eu representava num embate entre capital e trabalho. Ao final do processo, tudo foi arquivado porque era tudo falso e sem base na realidade. Contudo, as acusações levianas foram usadas contra a minha honra e contra a minha pessoa no processo eleitoral no qual participei. Tudo indica que as acusações mentirosas tinham esse objetivo, assassinato de reputações.

Enfim, segue abaixo o que o professor Boaventura de Sousa Santos argumenta em sua defesa. 

William Mendes

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(Fonte: Brasil247)


Diário de uma difamação



Um abraço solidário a todos e a todas, um abraço indignado, mas um abraço, um abraço longo, de crença na luta pela verdade e pela justiça

12 de abril de 2023, 18:46 h

Santiago do Chile, 12 de Abril de 2023

Caros e caras colegas e estudantes (antigos e actuais),

Escrevo-vos de Santiago do Chile onde estou para participar na feira do livro. O Centro de Estudos Sociais, eu próprio e alguns dos nossos investigadores acabam de ser vítimas de uma difamação anónima, vergonhosa e vil por parte de três autoras. Uma delas foi bolseira Marie Curie no CES (Lieselotte Viaene), as outras duas, estudantes de doutoramento (Miye Tom e Catarina Laranjeiro). À partida quero afirmar que todos os casos de conduta incorrecta referidos no texto por parte de quem seja, se confirmados, devem ser prontamente julgados tanto no CES como nas instancias judiciais e como ao tempo era director do CES assumo institucionalmente responsabilidades por eventual negligência que possa ter havido. Apesar de o artigo estar centrado na minha pessoa, nunca tive reuniões com duas das autoras (Miye Tom e Catarina Laranjeiro) e com a terceira, a principal autora (Lieselotte Viaene), tive duas reuniões, uma como seu supervisor do estágio Marie Curie quando chegou ao CES e outra como director estratégico do CES, a pedido do director executivo, para tentar resolver os problemas do comportamento incorrecto e indisciplinado do ponto de vista institucional desta investigadora. O seu comportamento foi de tal ordem insolente e incorrecto que o CES acabou por lhe abrir um processo disciplinar e não aceitou que ela indicasse o CES como instituição de acolhimento num projecto de candidatura ao European Research Council. Esta recusa teve como fundamento o comportamento anterior dela no CES. Em suma, esta investigadora foi expulsa do CES. Eis o texto de nota de culpa datado de 6 de junho de 2018 “Assunto: Processo disciplinar – Despedimento. À Sra. Doutora Lieselotte Viaene: Tendo sido objecto de um processo disciplinar pelo Centro de Estudos Sociais (CES), é notificada do processo de despedimento que lhe foi levantado (anexo). Comprovados os factos indicados na nota de acusação, entende o CES despedi-la com justa causa. Nos termos do artigo 335 do Código de Trabalho, pode refutar o registo de acusação por escrito, indicando os elementos que julgue relevantes para a clarificação dos factos e da sua conduta. Poderá anexar documentos provatórios considerados pertinentes para o esclarecimento da verdade. Os documentos que dizem respeito a este caso encontram-se na Secretaria do CES com Célia Viseu”

Na minha opinião, que obviamente não compromete a Direcção do CES, de que sou agora apenas Director Emérito, este artigo, no que respeita à sua principal autora, Lieselotte Viaene, é um acto miserável de vingança institucional e pessoal. Como podereis ler no texto publicado, toda a informação caluniosa que me diz respeito é anónima e assente em boatos, ou seja, em “factos” para os quais não é oferecida nenhuma prova ou modo de chegar a ela.

Em face disto, a primeira questão que se me põe é a perplexidade sobre como é que uma editora respeitável (que tem publicado alguns dos meus livros) deu a lume um texto tão ardiloso, tão mentiroso no que me diz directamente respeito, tão mistificador como este de que vos falo. É um texto que tem uma mistura entre um quadro teórico sólido, retirado da literatura que foi produzida no seguimento do Movimento Me Too, à qual se sobrepõe uma informação empírica assente em referências anónimas, boatos e incidentes não identificados e não provados de maneira a poderem ser contestados. Pergunto-me quem foram os peer reviewers que analisaram este texto? Que tipo de ciência é esta que permite enxovalhar e lançar lama uma instituição de prestígio e especificamente o investigador que foi durante tantos anos seu director? Sou designado no texto como “Star professor”, uma designação que foi cunhada nos EUA para caracterizar os professores que pelo seu trabalho ou a sua fama auferiam salários imensamente superiores aos seus colegas. Nunca foi esse o meu caso. O que eu fui e com muito gosto o afirmo um caput scholae, um cabeça de escola que fundou há quarenta e quatro anos uma instituição com a colaboração de um dedicado e entusiasta pequeno grupo de jovens investigadores orientada para produzir conhecimento crítico, livre, plural e independente sobre a sociedade portuguesa e sobre a Europa e a suas relações com o mundo, sobretudo o que esteve sujeito ao colonialismo português. Foi essa instituição que cresceu efloresceu ao longo de décadas e que motivou as autoras para a escolherem como instituição para prosseguir os seus estudos. Aliás, as duas autoras na altura doutorandas, concluíram os seus doutoramentos com a nota máxima. O mesmo sucedeu com a principal autora. Reconheço que devido ao facto de partilhar o meu tempo entre Portugal e os EUA terei desiludido a autora principal quanto à orientação do seu estágio. Mas também é verdade que os bolseiros Marie Curie são em geral muito autónomos e não exigem apertada supervisão. Como quer que seja, nada disto justifica esta diatribe contra uma instituição e ainda por cima tão personalizada contra alguém que no máximo foi absentista na sua orientação. Como se justifica que se arraste para a lama toda uma instituição que na altura em que as autoras a frequentaram já tinha mais de cem investigadores e investigadoras, com perspectivas e centros de interesse que nada tinham a ver com o “star-professor”?

Verifiquei depois estarmos perante um padrão de comportamento. Entre setembro do ano passado e o corrente mês de abril recebi pedidos de ajuda de estudantes de doutoramento indígenas da Universidade espanhola onde está agora sediado o projecto que o CES decidiu não patrocinar. Sabendo dos problemas que a autora principal tinha causado no CES, pediam-me que as aconselhasse como proceder. Eis o teor dos emails que recebi de uma das estudantes indígenas expulsas do projecto coordenado pela autora principal, eliminando os detalhes que poderiam violar o anonimato: “Estimado profesor, es un gusto saludarle Hemos conversado con los compañeros de otros países y la mayoría de nosotros hemos sido víctimas de la misma persona. Es una larga y triste historia este Proyecto en mi vida y la de los compañeros, por eso nos gustaría conversar con usted. Le escribo hoy, justo porque mi indignación a su histeria envidiosa me conmueve…. Es por demás mi indignación. Hemos vivido muchas situaciones de violencia. Nadie de los compañeros llevó a cabo ninguna situación judicial porque no tenían los recursos económicos y los costes emocionales que requería un proceso judicial. Principalmente porque todos los afectados somos de otros países… Estamos viendo acciones para denunciar el extractivismo epistémico que Lieselotte a través del proyecto RIVERS comete contra los pueblos indigenas. Pero parece que ella es solo impune, esto es frustrante, al mismo tiempo que buscamos caminitos de esperanza para lograr justicia.” (mantenho o anonimato da autora do email mas o seu nome está depositado na direcçao de CES e pode ser revelada se a minha correspondente autorizar).

É para mim evidente que o texto difamatório de que sou vítima e a instituição que dirigi durante mais de quarenta anos configura uma intenção de assassinato de carácter que corresponde a um padrão de comportamento bem documentado na literatura e que neste caso se centrou minha pessoa para proceder à vingança institucional.

No que respeita às insinuações que me são feitas quero afirmar que confrontarei qualquer suposta vítima com serenidade e sentido de responsabilidade. Tenho a consciência bem tranquila. Revoltam-me particularmente dois aspectos deste texto indigno.

O primeiro, é o indigno envolvimento dos meus assistentes de investigação que, segundo a autora principal, eu teria explorado ou aproveitado indevidamente. Obviamente que me apoiaram na investigação porque foi para isso que foram contratados. Mas os meus livros fui quem os escreveu. Faculto ao CES o nome de todos os meus assistentes, portugueses, norteamericanos, brasileiros, moçambicanos, angolanos, colombianos que ao longo de cinquenta anos trabalharam comigo, se alguém entender interpela-los. Tenho um grande orgulho em ter trabalhado com todos eles e todas elas. Escrevi muitos livros porque trabalho incessantemente e nunca tive férias, porque amo o meu trabalho e porque tenho uma secretária e uma assistente de revisão de texto, duas pessoas maravilhosas e excelentes profissionais que há várias décadas me acompanham.

O segundo aspecto que particularmente me ofende e repugna diz respeito aos convívios que durante muitos anos ocorreram depois das minhas aulas no restaurante Casarão. Cito: “Nesta instituição, este tipo de desequilibradas relações de poder ocorria frequentemente sob a forma de eventos sociais como fazendo parte da cultura institucional, tais como jantares em restaurantes e casas particulares, onde se encorajavam relações pessoais mais íntimas entre investigadores de diferentes posições hierárquicas. A regra não escrita é que a seguir às aulas magistrais do Professor-Estrela todos os investigadores se reúnem num determinado restaurante. De facto, numa reunião com a Antiga Pós-doutoranda, o Professor-Estrela a aconselhou-a a ir a estes jantares para melhor se integrar na instituição. À Antiga Doutoranda Nacional o mesmo foi aconselhado por ambos os coordenadores do programa doutoral”. Como nunca promovi festas em minha casa só me posso referir aos convívios no restaurante Casarão. Só mentes perversas podem transformar o mais são convívio entre estudantes e professores em maquiavélicas maquinações de pastores de pobres rebanhos de estudantes. Convido todos e todas a irem ao restaurante ver os quadros de azulejos com os nomes dos estudantes de doutoramento que ao longo dos anos partilharam bons momentos de conversa, leitura de poesia e música. Diz-me o dono do restaurante que ainda hoje vêm estudantes do Brasil mostrar aos seus filhos os quadros onde estão os seus nomes quando eram aqui estudantes. Que perversidade pode transformar uma convivência no mais puro espírito académico em manipulações de consciência e em rituais de fidelidade.!

São referidos outros casos de conduta incorrecta que dizem respeito a outros investigadores. Em relação a eles estou certo que os investigadores e as investigadoras envolvidas e as vítimas/sobreviventes se as houver encontrarão no CES e nas instituições judiciais vários fóruns para discutir julgar e tirar consequências. A todas e a todos tem de ser dado espeço se explicarem. O CES tem uma estrutura governativa muito descentralizada distribuída por vários dos órgãos. Se houve omissões dos titulares desses órgãos elas devem ser analisadas, avaliadas e corrigidas.

Independentemente dos procedimentos internos e judiciais que o CES vier a adoptar, quero informar-vos de que vou apresentar uma queixa crime por difamação contra as autoras. Declaro-me disponível para dar todas as informações e prestar todos os esclarecimentos que me sejam pedidos, quer no âmbito do processo judicial, quer no âmbito dos processos internos, que o CES certamente vai pôr em movimento.

Um abraço solidário a todos e a todas, um abraço indignado, mas um abraço, um abraço longo, de crença na luta pela verdade e pela justiça. O CES é uma grande instituição, grangeou merecidamente prestígio tanto nacional como internacionalmente. Os seus investigadores e as suas investigadoras continuarão a lutar por merecer esse prestígio, corrigindo erros, sendo rigorosos e transparentes para com todos os actos de violação de ética profissional e denunciando aqueles e aquelas que, ao ultrapassarem os limites da verdade e da reclamação justa, nos pretendem distrair da nossa missão maior, a de contribuir para a ciência cidadã que é marca da nossa presença no meio académico nacional e internacional.

É esta a minha primeira informação respeitante a este processo de difamação e certamente darei outras informações à medida que se justificar. Deste texto vão ser elaboradas versões em espanhol e inglês.

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Post Scriptum (16/4/23): minha decepção com o comportamento humano e com a tendência de degenerescência de nossa espécie aumentou muito nas últimas semanas. Este caso do intelectual português se mostra bem mais sério do que o professor explicou no texto acima. Nesses 3 dias, soube de mais casos de vítimas que afirmam terem sofrido assédio sexual sendo Boaventura o assediador. Registro minha solidariedade às vítimas de qualquer forma de assédio sexual e opressão. Minhas decepções só aumentam em relação à humanidade... que foda isso!

terça-feira, 11 de abril de 2023

Vendo filmes e programas antigos (V)

 


Refeição Cultural

Osasco, 11 de abril de 2023. Terça-feira.


Lentamente, sigo tentando ver mídias acumuladas ao longo de décadas de vida. Já que o meu viver proletário foi vender minha força de trabalho e estudar e dormir um pouco nas horas livres das obrigações, acabei acumulando em casa, sem ver, filmes, revistas, livros, apostilas, jornais e demais objetos de cultura, pois o desejo de saber eu sempre tive, felizmente, só não tinha tempo e energia para aproveitar adequadamente toda aquela cultura que acumulava em casa.

Toda forma de conhecimento é interessante. Mais interessante ainda é adquirir conhecimento a partir de roteiros de cultura organizados a partir de uma consciência política e social. De certa forma, tudo que tenho foi fruto de algum interesse de saber em determinado tempo de minha vida pregressa. 

Ver agora coisas antigas serve ao menos para ver se o material e o conteúdo envelheceram bem ou não, se ainda trazem saber e reflexões ou não.

É isso!

William

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FILMES, DOCUMENTÁRIOS E PROGRAMAS QUE VI

Titanic (1997) - Filme escrito, dirigido e produzido por James Cameron e protagonizado por Leonardo DiCaprio e Kate Winslet e elenco. Eu tinha em casa o filme em VHS numa edição da revista Speak Up com legenda em inglês. Esse filme foi muito premiado e marcou época. Após rever a história do trágico naufrágio do Titanic, ocorrido em 14 de abril de 1912, com a morte de mil e quinhentas pessoas, li alguns textos sobre a produção do filme. 

Comentário: o filme é muito bom. Contar a história real do naufrágio mesclando a tragédia com a história de amor ficcional entre Jack (DiCaprio) e Rose (Winslet) foi uma estratégia acertada de James Cameron. Eu diria que o filme envelheceu bem e pode ser visto em qualquer época gerando bons debates sobre as questões sociais apontadas no enredo da obra.

Encontro marcado (1998) - Filme dirigido por Martin Brest e estrelado por Anthony Hopkins, Brad Pitt e Claire Forlani. Ao completar 65 anos, um ricaço (Hopkins) recebe a visita da Morte (Pitt), que vem lhe buscar. Sua filha (Forlani), médica, conhece um jovem numa lanchonete da cidade (Pitt), eles trocam olhares, tomam café juntos e se despedem já sentindo algo um pelo outro. A Morte pega o corpo do rapaz e a estória se desenvolve a partir daí. 

Comentário: por muitos anos, vi esse filme passando e nunca me sentei pra vê-lo. Tinha a impressão que a estória era boa. Finalmente assisti ao filme. Gostei bastante. A década de 1990 foi muito produtiva em relação a filmes. As expressões do jovem Brad Pitt são bem legais, Hopkins é um mestre, e a jovem Claire Forlani tem uma beleza e um olhar enfeitiçador. 

Enquanto via o filme, me lembrei de passagens do fantástico livro de Saramago, Intermitências da morte (2005). Em ambas estórias, a Morte nos surpreende com suas atitudes humanas, demasiadamente humanas...


Ratatouville (2007) - Animação dirigida por Brad Bird e codireção de Jan Pinkava (história original). Sinopse: Em um dos restaurantes mais refinados de Paris, Remy, um ratinho que adora cozinhar, sonha em se tornar um renomado chef. Contrário aos desejos da família, ele segue sua vocação e, junto com o atrapalhado Linguini, se envolve em uma hilária sequência de acontecimentos que vão deixar a cidade-luz de cabeça para baixo.

Comentário: demorei pra ver essa animação porque nunca tive simpatia por esses programas sobre comida e essa moda da culinária. No capitalismo expor comidas maravilhosas fartamente em telas e mais telas à disposição de uma população famélica é um processo criminoso de tortura, é o que eu penso. Detesto isso! Distribuam a riqueza e acabem com a fome do povo primeiro, depois façam programas à vontade sobre como cozinhar. Enfim... Penso isso há décadas.

Vi o filme com a família nesses dias. O filme é muito divertido e a gente fica encantado com Remy! Gostei da animação! Excelente entretenimento!

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Melhores momentos do Brasil nas Copas 1954 - 1994: a fita apresenta um resumo breve da participação da seleção brasileira de futebol nas Copas desse período. A parte mais antiga eu já conhecia como o período glorioso no qual Pelé jogou. Foi legal rever a importância do Garrincha e do Vavá na Copa de 1962, quando Pelé se contundiu no início da competição. Da fase na qual eu já existia e tenho lembranças, a derrota em 1982 é a mais triste, a seleção comandada por Telê Santana. E me lembro da Copa de 1994, quando o Brasil virou tetracampeão.

- Uma estrela chamada Ayrton Senna (1998) - As fitas que assisti sobre a vida e a carreira do piloto brasileiro me trouxeram à lembrança os anos oitenta e noventa, quando eu iniciava minha vida adulta já de volta a São Paulo. É fato que as corridas de Fórmula 1 só despertaram interesse no povo brasileiro durante aquele período. Depois da morte de Senna, pouca gente seguiu acompanhando esse esporte. Me lembro que choramos a morte dele, eu era como quase todo mundo, torcedor e fã, e via nele um brasileiro que nos honrava. É bem provável que hoje eu teria uma leitura diferente a respeito de Senna e do esporte. Eu era um brasileiro do meu tempo naqueles anos.

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Post Scriptum: para ver a postagem anterior dessa série é só clicar aqui.


segunda-feira, 10 de abril de 2023

Leitura: O trono no morro - José J. Veiga



Refeição Cultural

Osasco, 10 de abril de 2023. Segunda-feira.


"Engraçado: e o medo? Fora exatamente como o Pifa e outros disseram, que no meio do fogo a pessoa não tem tempo de sentir medo. Será que viria depois? Parecia que não. O que ele sentia agora era bem o contrário de medo, era uma palpitação de coragem e valentia que o deixava até envergonhado de estar lembrando de medo." (VEIGA, O trono no morro. p. 23)


Acordei pensando em meus objetivos de leitura para o ano de 2023. Defini que gostaria de ler ao menos três livros por mês. É um esforço de leitura. Não quero me tornar um analfabeto como estamos nos tornando enquanto espécie. Analfabetos no sentido literal, aqueles que não sabem escrever, e analfabetos funcionais, aqueles que sabem juntar as letras, mas não entendem porra nenhuma ao ler as letras juntadas.

A inteligência humana está em franca decadência, os homo sapiens sapiens caminham para a extinção como aqueles animais hominídeos que sabem que sabem, que têm conhecimentos culturais acumulados ao longo de centenas de milhares de anos. Inclusive pode ser que nos tornemos analfabetos, sem o uso da grafia e do símbolo linguístico porque as novas tecnologias tornaram "desnecessário" saber escrever.

Que começo de postagem... está ruim, sei, são os sentimentos do escriba no momento de escrever.

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Como disse acima, ao acordar nesse dia 10 de abril, primeiro terço do mês, pensei em pegar um livro de romance ou poesia para ler porque os livros que estou lendo são grandes ou de leitura lenta e levarão semanas até o final da leitura. Tanto em abril quanto em maio, para ler seis livros, terei que ler livros de volume pequeno. Livro menor no tamanho não quer dizer livro menor no conteúdo.

Pensei num romance, uma pequena novela ou conto, ou um livro de poesia. A primeira coisa foi escolher na estante o autor e o livro. Tenho livros adquiridos recentemente de conhecidos bancários e tenho livros de coletâneas de artigos. Mas não era o que procurava. Pensei em textos com estórias do tipo "E se..." e com essa característica pensei em José Saramago, Guimarães Rosa ou José J. Veiga. Peguei um de Veiga.

Nem olhei para o celular até o final da tarde... (básico isso!)

Assim fiz a leitura do 10º livro do ano.

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O TRONO NO MORRO 

(lançado por J. Veiga no livro De jogos e festas, em 1980, e depois relançado em 1987)

Ao abrir o livro, conheci a estória de Dom Quintino, governador e senhor supremo da serra do Mossongo.

Quintino Jerônimo Júlio foi sequestrado ainda novo pelo bando do Gumercindo Frade. Não tinha família, nasceu nas terras do seu Demoste e foi ficando por lá trabalhando por um prato de comida. Era medroso e não conseguiu voltar do sequestro dos jagunços. Foi ficando. Aprendeu a atirar e o primeiro bicho que mirou, acertou. Matou um urubu e deixou todo o bando aperreado porque dá azar matar urubu. Mas por atirar bem e por ter o corpo fechado, foi aceito no bando. Viveu assim por um tempo.

Depois, Quintino viveu numa corrutela chamada vila de Três Alferes, região de garimpo. Ali viveu outro tanto de sua vida. 

Os leitores acompanham a vida desse personagem, que apesar de ter o corpo fechado, poderia ter um pouco mais de sorte na vida. Difícil não se solidarizar com o rapaz pelos infortúnios que as veredas da vida trazem a ele.

Ao longo da leitura, J. Veiga me transportou para momentos diversos da vida ao longo de décadas, seus enredos e seu estilo têm essa característica de nos colocar dentro da estória ou de nos fazer ver o mundo aqui fora como suas estórias. 

Este leitor em particular passou a juventude nas Minas Gerais, região próxima ou similar às regiões imaginárias de seus contos, novelas e romances.

MEDO - Talvez eu tenha escolhido a citação sobre o medo porque esse sentimento é um dos sentimentos mais intensos no animal que somos. O medo e o ódio, talvez mais que o amor, são sentimentos que movem o mundo humano. Biologicamente somos racionais com um cérebro altamente desenvolvido, e mesmo sendo homo sapiens sapiens somos levados por indução e manipulação grosseira a praticar as ações mais estúpidas possíveis e a acreditar nas maiores bobagens que se possa imaginar... que foda!

É isso! Conheci mais uma narrativa de J. Veiga. Agora faltam poucas para eu completar a leitura de toda a sua obra. Só li o primeiro livro do autor goiano em 2016, e saí procurando seus livros em livrarias e sebos. Acabei de comprar o último que faltava.

Seguimos fruindo a vida instante a instante, como nos ensina Ailton Krenak, sem a necessidade de ser útil. Tenho que lidar com essa inutilidade que sinto após achar que fui útil algum dia. Es decir, achar que fui útil não quer dizer nada, claro, pode ser que eu tenha sido apenas útil em relações utilitárias como a vida moderna nos demonstra.

William


Bibliografia:

VEIGA, José Jacinto. O trono no morro. 8ª ed. - São Paulo: Ática, 2007.


sábado, 8 de abril de 2023

Diário e reflexões - Cuba XVI (08/04/23)



Refeição Cultural - Cuba (XVI)

Osasco, 8 de abril de 2023. Sábado de Aleluia, dia nublado.


Já faz um tempinho que não posto texto sobre meus estudos e leituras sobre Cuba e o povo cubano. Da última vez que postei esta série de textos, estava lendo o livro de Leonardo Padura - O homem que amava os cachorros - e havia decidido que teria que acabar a leitura de uma vez (ler aqui). Fiz isso. 

Depois do fim da leitura de Padura, li o livro reportagem de Fernando Morais sobre Cuba, escrito em 1976 e depois atualizado em 2001, ao rever A Ilha (ler aqui). Agora comecei a leitura do livro da educadora Maria Leite, Cuba insurgente - Identidade e Educação (2023). Estou gostando demais do enfoque abordado, a pedagogia da educação cubana.

A leitura do livro sobre a educação e a identidade do povo cubano coincide com a grave questão em disputa no Brasil na ocasião dos 100 dias de governo Lula: a "deforma" do ensino médio feita pelos golpistas Temer e Bolsonaro segue sendo mantida por nosso presidente e por seu ministro da educação. Lula está cometendo um erro grave, manter essa destruição do ensino brasileiro será fatal para nosso futuro.

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"Entretanto, esperar de uma sociedade mercantilizada, a tolerância a um sistema educativo emancipador e contrário aos esquemas de exploração, que perduraram por séculos, seria inútil. Romper a lógica do capital em Cuba implicava, nos anos da década de 1960, substituir as formas enraizadas de internalização por uma alternativa concreta. A aplicação do materialismo dialético como método filosófico foi o caminho trilhado nos processos educativos cubanos em suas dimensões histórica, econômica, política, social e técnico-científica, em um percurso no qual o homem consciente buscaria os seus objetivos com determinação." (LEITE, Cuba insurgente, p. 35)

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A autora do livro Cuba insurgente passou décadas estudando e compreendendo os métodos de educação e ensino na Ilha socialista. Bastou ler as primeiras trinta páginas para clarear algo que já era a base de minha resposta para a pergunta sobre prováveis explicações para Cuba resistir aos ataques do imperialismo norte-americano mesmo após a derrota da experiência socialista na URSS no início dos anos noventa. Importante lembrar que os soviéticos eram parceiros centrais de Cuba em relação à economia do país. 

Pra mim, Cuba e o povo cubano só resistiu até hoje ao massacre criminoso dos embargos econômicos de décadas - cujos objetivos são causar fome e miséria absoluta ao povo -, à crise dos anos noventa e às antigas tentativas de golpes contrarrevolucionários por causa da pedagogia empreendida na Ilha, educação que reforça muito a questão da identidade do povo cubano.

Enquanto isso, no Brasil, tivemos nas últimas duas décadas, a ascensão e queda do governo do Partido dos Trabalhadores (2003-2016) sem resistência alguma por parte do povo beneficiado pelas políticas e efeitos econômicos e sociais dos governos Lula e Dilma, governos que mais fizeram por seu povo em cinco séculos de colonialismo e colonialidad (algo como a manutenção no país de uma mentalidade colonialista mesmo após a independência formal) como nos explica o livro de Maria Leite. Talvez tenha nos faltado justamente o foco na pedagogia, no tipo de educação que NÃO se aplicou a dezenas de milhões de estudantes ao longo dos governos do PT.

E agora, no início do 3º mandato do presidente Lula, ele afirma nesta semana, em meio a um grande debate por parte de seus apoiadores, que não vai revogar a reforma do ensino médio, questão consensual em todas as bases de apoio ao governo e a Lula.

Acho isso muito foda... mas vamos acompanhar o dia a dia. Tenho dito que hoje compreendo muito mais nosso líder e sábio presidente Lula, só ele sabe onde o sapato aperta o calo. Os bilionários que estão por trás da destruição da educação brasileira têm muito poder de pressão e capacidade para inviabilizar o mandato de Lula. Contudo, se Lula decepcionar professores e estudantes mais organizados, perderá apoio importante. É foda, como disse!

Amig@s leitoras e leitores, recomendo muito o livro da professora Maria Leite, saiu poucos dias atrás e é o resultado de décadas de estudos e pesquisas. Vamos ler, comentar e discutir. O momento é muito propício.

William


Bibliografia:

LEITE, Maria do Carmo Luiz Caldas. Cuba insurgente: identidade e educação. Curitiba: CRV, 2023.


quinta-feira, 6 de abril de 2023

Cem dias de Lula - Sem dias tranquilos



Refeição Cultural

Osasco, 6 de abril de 2023. Quinta-feira.


SEM DIAS TRANQUILOS

O nosso governo Lula está completando cem dias de administração. Já tivemos uma tentativa de golpe de Estado nos primeiros dias (8/01). Já tivemos a volta do comportamento fascista da grande imprensa, golpista e manipuladora (depois querem que eu seja a favor da "liberdade de imprensa"). 

Já tivemos a volta ao Brasil do genocida, lesa-pátria e ladrão de joias, e a grande imprensa trata o "ex-presidente" como uma oposição "democrática". Já tivemos o embargo econômico do neto de chefão da ditadura do Banco Central "autônomo", fodendo a economia com taxas de juros elevadas para inviabilizar o governo Lula. Já tivemos a continuidade (incontrolável?) da política de ódio e violência propagada não só pelas redes virtuais e pelo submundo da internet, mas também pela boca fétida dos bolsonaristas eleitos em mandatos legislativos (essa gente não é democrática).

Os cem dias foram dias de muito trabalho para o governo de frente ampla de Lula e do PT. Sem dias tranquilos... é o que tivemos e o que teremos pela frente.

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CEM DIAS REFAZENDO AS POLÍTICAS SOCIAIS

Os cem dias do governo Lula foram muito satisfatórios se considerarmos os segmentos beneficiados como foco do governo que salvou o Brasil da catástrofe e perdição total caso aquela máfia fascista e bandida continuasse no Palácio do Planalto. O foco do governo são os mais pobres e aqueles segmentos que mais necessitam do Estado. E nesse ponto, Lula está indo bem: Lula retomou nos cem dias todas as políticas sociais que melhoraram a vida do povo durante os governos do PT.

As simbologias também foram importantes. Medidas que demonstram a preocupação do governo com políticas afirmativas e com as questões ambientais.

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SEM COMUNICAÇÃO SOCIAL

Avalio que uma questão séria para o governo Lula é a área de comunicação social. Na minha opinião, não é satisfatório o que vimos até agora. Lula deveria no mínimo ter começado um programa semanal para ele falar diretamente ao povo brasileiro. Não o fez. Aliás, deu certas prioridades e exclusividades às Organizações Globo que não vejo nenhum sentido após tudo o que aconteceu nas últimas décadas.

Outra medida básica que ouço de jornalistas renomados e veículos alternativos à grande mídia da casa-grande seria o governo voltar a fazer propaganda oficial também nas mídias pulverizadas do campo progressista. Nossas mídias são inviabilizadas por falta de recursos e por lawfare de setores do próprio Estado como ações judiciais com multas impagáveis. Não o fez. Aí fica difícil!

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SEM REVOGAÇÃO DA DESTRUIÇÃO DO ENSINO MÉDIO

Li hoje que o governo Lula disse que não vai revogar essa desgraça dessa reforma de Temer e Bolsonaro que destrói a educação brasileira que abrange mais de 50 milhões de crianças e adolescentes. Aí é foda pra defender o governo nessa questão da educação brasileira.

Fiquei tão feliz ao ver o governo em poucos dias de administração corrigir as bolsas de iniciação científica, mestrado e doutorado em cerca de 40% e também os valores relativos à alimentação dos estudantes nas escolas...

Aí vem o governo e fica do lado dos bilionários que estão por trás das fundações e corporações privadas da educação ao invés de revogar essa merda e abrir um debate nacional sobre o ensino brasileiro.

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SIGO NA TORCIDA E NO APOIO AO NOSSO GOVERNO LULA

Enfim, o cenário colocado é complicadíssimo tanto no Brasil quanto no mundo. Hoje eu compreendo bem melhor o presidente Lula e algumas lideranças do nosso campo. Posso não concordar com diversas medidas e decisões tomadas por nossos governantes e indicados do governo nas mais diversas instâncias da estrutura do Estado, mas tenho uma clara noção de o porquê das coisas. Às vezes, isso é foda.

SOCIALISMO

Hora de encerrar o registro.

Antes, registro que me incomoda muito perceber que o socialismo virou palavrão no campo da esquerda onde me formei politicamente em quase 3 décadas de militância. Percebo isso inclusive na CUT e no PT.

O socialismo é uma referência para mim e foi para nós inclusive nos documentos históricos da CUT e do PT. Estou lendo sobre Cuba porque o país é socialista e por incrível que pareça ainda resiste aos ataques fatais do imperialismo com embargos criminosos há 6 décadas.

Não me conformo de não ver o socialismo como referência no campo hegemônico da esquerda brasileira. Se eu estiver equivocado, peço ajuda aos universitários a respeito.

William


quarta-feira, 5 de abril de 2023

Leitura: Gen Pés Descalços (4) - Keiji Nakazawa



Refeição Cultural

Gen Pés Descalços - Cresça firme, trigo verde

Volume 4


Registro impressões sobre a leitura do quarto volume de Gen Pés Descalços influenciado pela tristeza de uma tragédia ocorrida hoje em nosso país. Um homem de 25 anos assassinou crianças em uma creche em Blumenau, Santa Catarina. Nossa sociedade humana falhou miseravelmente! 

O mangá que estou lendo de Keiji Nakazawa é um clássico das Histórias em Quadrinhos. Gen Pés Descalços foi publicado nos anos 70 e o autor é um sobrevivente da bomba atômica lançada em Hiroshima pelos norte-americanos. Ele tinha 6 anos e toda sua família foi morta pela bomba, com exceção de sua mãe.

No primeiro volume vemos a miséria à qual está submetida a população japonesa por causa da guerra. Vemos o clima fascista do império militarista japonês. E vemos a forma de tratamento dura e preconceituosa imposta à família Nakaoka por ela ser contra a guerra. 

Ao longo dos volumes que já vi o leitor toma contato com as consequências da bomba atômica, que matou na hora mais de 100.000 civis e os efeitos da radioatividade seguiu matando dezenas de milhares de pessoas ao longo dos meses e anos seguintes. 

Imaginem vocês, leitores e leitoras, mulheres, crianças e idosos vaporizados na hora e depois morrendo dolorosamente por causa de uma bomba lançada pelos poderosos norte-americanos mesmo após a guerra estar vencida pelos aliados. Imaginem a fome durante anos e a miséria assolando um país... esse é o cenário de Gen Pés Descalços.

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A MISÉRIA E A VIOLÊNCIA COMO RESULTADOS DO FASCISMO

A leitura desse volume foi bem mais difícil que a leitura do anterior (ler comentário aqui). Foram quase 300 páginas e eu tive que parar de ler algumas vezes porque ficava mal durante a leitura. 

O sofrimento da família Nakaoka seguiu nesta parte da história - nos dois anos seguintes ao 6 de agosto de 1945 - da mesma forma que nos volumes anteriores. É muito duro acompanhar tanto infortúnio de uma família como vemos no mangá de Nakazawa.

O autor ficou conhecido por ser um pacifista, no entanto a expressão dos desenhos é marcada por muita violência. É o retrato fiel do que são sociedades cuja essência cultural é a violência e o autoritarismo. Estamos vivendo isso neste momento do mundo de 2023, décadas depois da 2ª GM.

A fome é a marca dos 4 volumes que li até agora. A maldade nas pessoas também. Crianças são más, maltratam e humilham umas às outras; pessoas com um pouquinho a mais são egoístas e se aproveitam dessa condição para explorar miseráveis; raros são aqueles e aquelas que se preocupam com os outros como é o caso do garoto Gen. Dureza, viu!

Neste volume a família Nakaoka voltou a sofrer com perdas e teve que se reinventar para seguir adiante na luta pela sobrevivência na Hiroshima destruída pela bomba atômica dos EUA.

É isso. Seguiremos na leitura dos 10 volumes do mangá Gen Pés Descalços. A mãe de Nakazawa faleceu de câncer em 1966 e ele faleceu de câncer em 2012. Apesar disso, sua obra denunciando a guerra e a violência como cultura é atemporal.

O texto sobre o volume seguinte (nº 5) pode ser lido aqui.

William


Bibliografia:

NAKAZAWA, Keiji. Gen Pés Descalços - Cresça firme, trigo verde. Vol. 4. Tradução Drik Sada. - São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2012.


segunda-feira, 3 de abril de 2023

3 de abril



3 de abril

Osasco, São Paulo. Segunda-feira.


Hoje completei 54 anos de idade. Se fosse para avaliar o caminho percorrido até aqui diria que vivi mais do que qualquer expectativa que tivesse imaginado até vinte e poucos anos. Fui favorecido pelo acaso diversas vezes ao longo da jornada.

Não sendo mais pessoa pública, representante de alguém, como fui por tanto tempo, não preciso mais ter cuidados com as negatividades dos sentimentos expressos. Não atuo mais no palco da vida pública. Não tenho que levantar o ânimo de ninguém.

Não estou triste nem feliz, de novo. Já escrevi isso em outras datas como essa. Tenho a noção de minha fortuna, tive sorte pra cacete, o acaso como disse me favoreceu muito. A vida simplesmente é. Estou. Sou natureza.

Para onde meus pés vão me levar ainda? Caminhei muito até aqui. No romance clássico de Machado de Assis, o defunto autor, Brás Cubas, nos conta sobre certa vez que seus pés o levaram por caminhos que ele não escolheu. Meus pés me levaram por aí por décadas. Minha alma - meu cérebro - ia ao sabor dos desejos e necessidades, e as veredas pegas definiam outros destinos.

Poderia estar "curtindo" a vida, mas minha ética não me permite isso. Sou triste por sentir a tristeza e a miséria de meu mundo, de meu entorno. A miséria da humanidade me entristece de maneira inescapável. Sou assim. Já era triste desde pequeno, adolescente. Talvez sempre tenha sentido uma certa dor do mundo. E segui vivendo. E o acaso me abrindo caminhos.

O caráter e a ética que fui adquirindo durante o percurso de minha existência são fundamentais para meu controle da tristeza, minha responsabilidade me faz ter consciência de minha importância por estar vivo. Se eu não tivesse relação humana nenhuma, não gostaria de seguir vivendo nem um minuto a mais. Vejam a importância das relações humanas!

Das coisas que possa imaginar dar prazer ao meu viver como, por exemplo, literatura, natureza, música, esportes, arte, viagens, nada disso faria contrapeso na balança da vida com minha noção das misérias do mundo ao meu redor que justificasse eu ficar de boa por aí vivendo com os recursos que tenho e curtindo a vida como se não existissem as merdas ao meu redor.

Minhas relações humanas são o contrapeso na balança do viver. Por ter relações que de alguma forma me prendem à vida, sigo firme buscando sentidos e utopias. Isso é bom! Talvez isso seja até uma forma de amor. Não quero deixar ninguém que considero triste ou em má situação. Quero ver bem as pessoas de minha relação. 

Compreendendo a dinâmica do mundo humano após décadas do viver, penso que nós humanos teríamos que colocar toda a nossa energia em uma mudança radical do mundo, interrompendo imediatamente a destruição do planeta Terra de forma tão acelerada como estamos fazendo.

Se o acaso me tirasse o motivo do viver, as relações humanas que me dão algum sentido pra seguir, ainda assim minha ética humana e minha formação de esquerda me exigiriam escolher outros motivos para o viver.

"A vida é uma oportunidade" eu responderia se me perguntassem "o que é a vida?".

Tenho uma leitura clara disso. Apesar do sábio Ailton Krenak nos ensinar que a vida é fruição e que não tem utilidade alguma, que a vida não é útil, quando olho minha jornada pregressa vejo que o que realmente me deu sentido foi o período no qual fui "útil" para a sociedade, para a coletividade. Porque quando eu só olhava meu umbigo fui uma merda total, alguém que eu recordo com um sentimento muito ruim.

Registro feito dos instantes de passagem do dia 3 de abril para 4 de abril.

William