Refeição Cultural - 2023
Osasco, 31 de dezembro de 2023. Domingo.
Para reflexão: que perspectivas de futuro teremos caso prevaleça a tendência nas gerações que estão chegando ao mundo de serem aculturadas para desejarem ser youtubers e "influenciadores digitais" sem conhecimento de nada, sem o sonho de serem pessoas educadas, formadas e cientistas?
RETROSPECTIVA E BALANÇO
Como começo esta retrospectiva pessoal? Do fim para o início ou do início para o fim? Ou in medias res para chamar a atenção das leitoras e leitores? Talvez essa seja a melhor estratégia de narrativa do meu ano vivido.
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VIAGENS
Praia Grande (SP) - A primeira viagem do ano foi uma das que mais gostamos na família: passamos alguns dias da segunda quinzena de janeiro na Colônia do Sindicato dos Professores de São Paulo, Sinpro, na Vila Caiçara, Praia Grande. Desta vez, levamos o Lost, amigo do filhão, e os dias foram muito legais.
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Guarapari (ES) - Minha companheira sempre quis que eu conhecesse a cidade turística de Guarapari, no Espírito Santo. Ela ia para lá nos anos noventa e nosso filho chegou a ir também quando criança. Nossos tios ficavam numa casa bem legal no alto de uma ladeira no centrinho da cidade, entre a Praia das Castanheiras e a Praia dos Namorados. Perto também da Praia da Areia Preta. Eu não conhecia a região ainda.
Ficamos num hotel bem de frente para a Praia dos Namorados e passamos dias bem legais, lá. Caminhei e corri quase todos os dias. Valeu a pena e vamos voltar.
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Uberlândia (MG) - Antes de viajar para Cuba, fui ver meus pais e familiares em Minas Gerais. Foi uma viagem rápida. Também fui me encontrar em minhas caminhadas e reflexões no Parque do Sabiá, lugar que amo. Na oportunidade, decidi visitar o Zoológico local. O Sabiá é um dos lugares que mais gosto no mundo. Sério mesmo!
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Cuba - Finalmente conheci Cuba. Fui pra Cuba! Foi uma experiência interessante! E para ser mais legal a experiência, meu filho foi comigo, foi sua primeira viagem para fora do país.
Antes da viagem, procurei ler um pouco a respeito da história da Ilha e do povo cubano. Li uma obra impactante - O homem que amava os cachorros (2009), de Leonardo Padura -, impactante tanto do ponto de vista da própria história do povo cubano após a Revolução em 1959, quanto do ponto de vista da Revolução Russa e a história de Leon Trótski. Foi difícil a leitura. Mas ela me colocou em reflexões duras a respeito do mundo humano.
Conheci um pouco da história de José Martí, grande figura humana e um dos principais pensadores da história cubana, referência na educação do país. Aliás, a leitura do livro da professora Maria Leite - Cuba insurgente - Identidade e Educação (2023), leitura terminada após a viagem a Cuba, deu clareza à minha hipótese de por que até hoje Cuba resiste ao embargo e ao capitalismo. Li o livro de Fernando Morais A Ilha (1976 e 2001) e essa leitura também me deixou em alerta para quando chegasse a Cuba em abril deste ano.
Da permanência em Cuba por duas semanas, eu tanto fiquei impressionado e me questionando como é possível a manutenção até hoje, 65 anos depois, do regime socialista na Ilha, quanto compreendi por que até hoje o regime socialista se mantém em Cuba... pode parecer estranho afirmar isso, mas tenho a impressão de que a pedagogia da educação cubana é um dos alicerces do amor-próprio que aquele povo tem. Cubanía e Cubanidad... Os revolucionários liderados por Fidel Castro nos anos cinquenta tinham noção disso, eram martianos...
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Romaria em terras mineiras
Em agosto, depois de alguns anos sem caminhar entre Uberlândia e Água Suja, voltei para a estrada. Antes de caminhar os quase 80 Km, fiz várias caminhadas preparatórias pela região onde nasci e vivo até hoje, Zona Oeste da Grande São Paulo.
Antes de partir como peregrino e romeiro, tive meus momentos com a família.
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Casório nas Minas Gerais
Em outubro, a família teve nova oportunidade de visitar meus pais e familiares em Uberlândia, para fazer parte de um momento importante de nossa sobrinha Stefani, em seu casamento. Desejamos muitas felicidades ao casal.
As viagens a casa de meus pais é sempre um momento de Carpe Diem, porque a vida é o presente.
Para todos nós, a vida é uma oportunidade e o tempo presente é o que importa. Tenho refletido sobre o tempo passado, que de fato pode ser como o futuro, do ponto de vista pessoal. Eu não tenho o tempo que passou, nem sei se tenho o tempo que não veio ainda... não tenho!
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Jaboticabal (SP) - No final de outubro, visitamos a cidade que abrigou nosso filho por alguns anos no interior paulista. Lá fizemos amigos e até hoje temos um carinho especial por Jaboticabal e pelas pessoas queridas da cidade.
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Praia dos Carneiros (PE) - Em novembro, fizemos um passeio muito especial. Fomos passar alguns dias na Praia dos Carneiros numa pousada bem tranquila e com poucos chalés. E também fomos fora de temporada, o que contribui para que os ambientes internos e a praia estejam com pouca gente, permitindo um contato mais introspectivo com as belezas naturais do local. Foi muito bom!
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Seriemas no Parque do Sabiá. Deslumbramento! |
Natal em Uberlândia (MG) - A tradicional reunião em família para a ceia de Natal foi nas Minas Gerais. Se, por um lado, os conflitos familiares enchem os nossos corações de amarguras e incertezas quanto ao futuro, por outro, este Natal foi um momento inesquecível em minha vida por causa do meu reencontro com a energia interna de meu corpo.
Cheguei a Uberlândia tendo desistido de tentar correr a São Silvestre porque meu corpo me dava sinais de que não conseguiria percorrer os 15 Km da prova. E não é que fui três vezes ao Parque do Sabiá e realizei uma façanha incrível, trotei longas distâncias e voltei decidido a correr a prova na virada do ano. Deu tudo certo e aquele meu momento com o Sabiá me emociona demais só de recordar aqueles dias. A natureza do local me inunda e a gente se descobre ali. Obrigado Parque do Sabiá!
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LEITURAS
Durante o ano de 2023 tive a oportunidade de ler e completar a leitura de 32 livros dos mais diversos gêneros literários e discursivos. O homem que termina o ano é uma pessoa diferente daquela que iniciou a jornada da vida em janeiro.
O esforço para ser uma pessoa melhor continua e sei que através dos livros podemos evoluir, diminuindo aquela incompletude que Paulo Freire nos explica no livro Pedagogia da autonomia.
Livros finalizados
1. A estranha vontade de um morto (2022) - Sandro Sedrez (ver aqui)
2. Torto arado (2018) - Itamar Vieira Junior (ver aqui)
3. rio pequeno (2022) - floresta (ver aqui)
4. Diário de um bandeirante ligeiramente atrasado e totalmente desarmado (2006) - Roberto Buzzo (ver aqui)
5. Manifesto do Partido Comunista (1848) - Marx e Angels (ver aqui)
6. Os sentidos do lulismo - Reforma gradual e pacto conservador (2012) - André Singer (ver aqui)
7. O homem que amava os cachorros (2009) - Leonardo Padura (ver aqui)
8. A Ilha (1976 e 2001) - Fernando Morais (ver aqui)
9. A vida não é útil (2020) - Ailton Krenak (ver aqui)
10. O trono no morro (1987) - José J. Veiga (ver aqui)
11. O governo no futuro (1970) - Noam Chomsky (ver aqui)
12. A impureza da minha mão esquerda (2020) - Henry Bugalho (ver aqui)
13. A Quinta-Coluna (1938) - Ernest Hemingway (ver aqui)
14. A comédia dos erros (1591) - William Shakespeare (ver aqui)
15. A bíblia em crônicas livres (2023) - Roberto Buzzo (ver aqui)
16. Evocación (2007) - Aleida March (ver aqui)
17. Lawfare: uma introdução (2019) - Cristiano Zanin, Valeska Zanin Martis & Rafael Valim (ver aqui)
18. A megera domada (1594) - William Shakespeare (ver aqui)
19. La historia me absolverá (1953) - Fidel Castro Ruz (ver aqui)
20. Novos poemas (1948) - Carlos Drummond de Andrade (ver aqui)
21. Quatro anos das sombras (2022) - org. Cleusa Slaviero (ver aqui)
22. Nuestra América (1891) - José Martí (ver aqui)
23. A verdade vencerá: Lula (2018) - Ivana Jinkings (ver aqui)
24. Operários sem patrão: gestão cooperativa e dilemas da democracia (2001) - Lorena Holzmann (ver aqui)
25. Cuba insurgente: identidade e educação (2023) - Maria Leite (ver aqui)
26. Educação como prática da liberdade (1965) - Paulo Freire (ver aqui)
27. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado (1978) - Abdias Nascimento (ver aqui)
28. Banzeiro Òkóto: uma viagem à Amazônia centro do mundo (2021) - Eliane Brum (ver aqui)
29. Os sertões (1902) - Euclides da Cunha (ver aqui)
30. Os mortos vivos (1979) - Peter Straub (ver aqui)
31. Greve e negociação coletiva: dimensões complementares da luta sindical (2022) - Carlindo Rodrigues Oliveira (ver aqui)
32. O Brasil voltou (2023) - org. Cleusa Slaviero (ver aqui)
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LEITURAS CAPITAIS
Dos livros que li, alguns me deram compreensão de muitas coisas de nossa vida em sociedade.
Não estou desvalorizando alguns dos livros que li, mas o fato é que algumas leituras e formas de arte e filmes são para entretenimento, para curtição. Outros são para nos causar impactos marcantes, modificadores do ser e do comportamento humano e social.
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LULISMO - O livro de André Singer sobre o conceito de "lulismo" foi um livro impactante para mim. Reforçou algum conhecimento que tinha e me ajudou a compreender por que as coisas são como são no Brasil. A tese de Singer mereceria uma leitura coletiva nos sindicatos, partidos de esquerda e nos movimentos sociais organizados.
Modéstia à parte, as postagens que fiz sobre a leitura do livro de Singer dão uma boa ideia do que o intelectual nos explica sobre o fenômeno. O ideal é sempre ler a obra, mas se os leitores fizerem a leitura de minhas postagens terão uma noção do que Singer defende (ver aqui).
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SOCIALISMO EM CUBA, NA URSS E O "NOVO SINDICALISMO" NO BRASIL - Outro livro impactante para mim e que ao reler a postagem sobre a leitura (ver aqui) me deixou impressionado foi o livro do escritor cubano Leonardo Padura. De novo, modéstia à parte, a postagem tenta contribuir para o debate político, é um ponto de vista honesto de quem viveu duas décadas dentro do movimento sindical. Deem uma conferida nela, comentem à vontade.
Que leitura densa! Que leitura que me fez pensar toda a minha vida sindical e de representação de classe! Enquanto lia nos primeiros meses do ano e do 3º governo Lula, ia revivendo meu dia a dia na principal corrente política da CUT, a Articulação Sindical. Livrão!
CHE GUEVARA E ALEIDA MARCH - O livro Evocación da guerrilheira e companheira de Che Guevara, Aleida March (ver aqui), foi uma das leituras que mais me impactaram no ano de 2023. Foi uma descoberta! Nunca imaginei conhecer tantas informações pessoais da figura humana Ernesto Guevara como conheci através das memórias de sua esposa. Olha, na postagem comento que o livro me marcou como a leitura do livro de Miguel Nicolelis sobre o cérebro humano, um livro que me fez ver a vida de forma mais compreensível.
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AMBIENTALISMO, EMERGÊNCIA CLIMÁTICA E A VIDA - Duas leituras que me trouxeram muita reflexão e desejo de mudança da maneira como o mundo está organizado e da própria vida foram as leituras de Ailton Krenak e de Eliane Brum.
São leituras imprescindíveis às pessoas de boa vontade e desejosas de um mundo melhor para todas as espécies viventes no planeta Terra.
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ENTENDI QUE SOU ESCRITOR
Edições de livros e produções textuais em andamento:
- Um livro de memórias sindicais
- Um livro sobre o balanço do mandato eletivo na gestão da Cassi (2014-2018)
BLOGS
As publicações nos blogs começam a fazer sentido para mim em 2023 como faziam à época em que era um representante da classe trabalhadora.
A temática das reflexões nos textos produzidos e a quantidade de pessoas que tem acessado os textos me fazem ter cada dia mais responsabilidade com o que escrevo.
O blog Refeitório Cultural recebeu 168 mil acessos em 2023 - média de 14 mil acessos por mês. Avalio que é muita gente que visitou o blog! Me sinto honrado com isso.
Considerando que o blog não é um ambiente da moda atual, na qual a comunicação se dá por imagem e vídeo, 168 mil é uma quantidade respeitável de acessos para um ambiente de textos sobre cultura em geral e política.
De vez em quando recebo algum retorno de leitores e leitoras dizendo que meus textos são bons e que contribuem para as reflexões deles. Isso é gratificante e dá sentido ao esforço que faço ao escrever.
Para fazer este balanço do ano de 2023, reli os textos sobre as leituras que fiz e os textos de fechamento de mês e percebi que minhas reflexões vêm amadurecendo bastante quando comparo com os textos que releio do período inicial do blog.
Talvez por isso, e por ter pessoas lendo o que escrevo no ano e os textos da história de publicações do blog, eu comece a trabalhar meu psicológico para aceitar a ideia de que eu seja um escritor, de difícil definição do estilo, mas um escritor, ou alguém que escreve com regularidade.
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COISAS DOS HUMANOS, ANIMAIS DEMASIADAMENTE HUMANOS
Meio Ambiente
O ano de 2023 seguiu sendo de destruição do planeta Terra, da vida humana e da sociabilidade humana. Uma percepção da realidade que aprendi ao ler Eliane Brum e seu duríssimo livro Banzeiro Òkòtó: uma viagem à Amazônia centro do mundo (2021) me pareceu muito clara: o futuro será pior que o presente. Eu nunca tinha pensado nisso! Estamos destruindo rapidamente as condições de vida no planeta.
O pior é que é verdade essa questão da destruição do planeta, penso eu, mesmo não tendo leitura determinista de futuro, como nos alerta o educador Paulo Freire ao dizer que temos que problematizar o futuro e mudar as situações ruins porque elas não são "naturais", são consequências de nossas escolhas e nosso comportamento humano. A realidade pode mudar porque somos nós que fazemos a realidade. Mas no momento, e observando as tendências, a perspectiva é de um futuro pior que o presente.
Guerras
Ucrânia e Israel, guerras por procuração dos EUA - No início de 2023, convivíamos com algumas guerras no mundo. A que se desenvolvia em solos ucraniano e russo era a que chamava a atenção da pauta das mídias hegemônicas porque se tratava de uma guerra por hegemonia global, envolvendo o império decadente dos Estados Unidos.
Terminamos o ano com dois meses de bombardeios genocidas na Faixa de Gaza, na Palestina. Seguimos na mesma. A guerra de um país só - o governo do Estado de Israel -, de um lado, contra civis palestinos, de outro. É mais uma guerra por hegemonia global e com os EUA por trás dela. Humanos, demasiadamente humanos somos nós...
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ALGUNS OBJETIVOS E PROJETOS (TALVEZ DESEJOS)
Ao finalizar o ano de 2023 e olhar para trás e ver o que aconteceu na vida pessoal e no mundo ao redor, sinto que imaginar o amanhã é algo mais difícil que antes, o amanhã que não nos pertence, como bem nos explica o filósofo Ailton Krenak.
Fico pensando a respeito de projetos de vida ou objetivos a perseguir e acho tudo tão estranho... quero dizer, tão instável, frágil, talvez ilusório. Não queria ter passado a vida deixando a vida me levar, e acabei passando a vida tendo a vida me levado pelos caminhos que trilhei.
Quando era um adulto jovem, tinha os objetivos básicos, à época, de ter uma casa própria, queria ter uma moto, acho que queria ter uma profissão e uma remuneração estável, queria ser erudito (algo do tipo) e queria namorar (talvez ser amado). Quase todo mundo da minha classe social tinha esses objetivos na vida.
Me lembro de não querer trabalhar em coisas humilhantes e extenuantes, pois era essa a minha realidade na infância e adolescência sendo explorado pelos outros. Talvez por isso odiasse trabalhar e odiasse rico.
E hoje? O que uma pessoa como eu poderia esboçar mentalmente como objetivos e projetos para os próximos meses, talvez anos à frente? O que está sob meu domínio ou controle mínimo no viver cotidiano? O quê?
Percebi que não temos controle de nada, não temos. Deveria então, sabendo disso, deixar a vida me levar, com mais leveza e vivendo o momento da melhor forma possível como se não houvesse o amanhã... pois é, deveria. Mas não consigo.
Minha natureza não facilita meu viver à toa, "gozar" essa fase da vida. Me sinto culpado por ter conseguido sair daquela condição dos trabalhos humilhantes e extenuantes. Vejo o povo de onde vim se fodendo em trabalhos humilhantes e extenuantes, explorados como escravos, e me sinto mal por isso.
Estou lendo os livros de Paulo Freire e ele fala o tempo todo sobre mudança, sobre não aceitarmos o determinismo que tentam nos vender.
Freire nos ensina que um dos papéis centrais da educação e das pessoas que lidam com a profissão de educar é perceber o mundo e mudar o mundo porque somos seres incompletos e passíveis de educação.
A tomada de posição para mudar a realidade desfavorável das classes subjugadas e excluídas da cidadania é central na pedagogia freireana. Acho que fiz isso na fase que lutava por mim mesmo e na fase que representava pessoas de minha classe. Isso me deu um sentido no viver, mesmo olhando agora para trás, mesmo que não percebesse isso durante.
Hoje, me sinto deslocado no mundo, após todos os papéis relevantes que desempenhei como ser social, constituinte de ambientes humanos. Não sinto pertencimento em nada. Não me sinto parte de nada. Isso tem dificultado muito meu existir. E nos ambientes onde existo, não tenho influência alguma, não tenho capacidade de mudar realidades de forma dialogada.
Termino um ano calendário e entro outro ano calendário na mesma. Sem sentimento de pertencimento a algo.
Se em termos políticos tenho militado num diretório do partido no qual admiro o trabalho do presidente, o companheiro Daniel do DZ Butantã -, a realidade me lembra o tempo todo que sequer é o diretório onde me localizo pela legislação partidária. Não posso votar nas pessoas que conheço, sequer no PED, pois moro em Osasco, que dirá na vereadora Luna Zarattini e no Guilherme Boulos no ano de 2024. Não pertenço a lugar nenhum. Não tenho militância na cidade onde resido.
Imagine se for falar do movimento político que ajudei a construir por mais de duas décadas, o movimento sindical bancário. O Sindicato fez 100 anos, eu vivo o sindicato há 35 anos - sou sindicalizado desde 1988 e ainda pago mensalidade -, e sequer para um videozinho fui convidado. A Cassi fez 80 anos nestes dias e fui um dos diretores eleitos que mais defendeu a associação e os direitos dos associados, sem falsa modéstia; idem para o apagamento. A Contraf-CUT completou 18 anos, fui o responsável por apresentar a marca da nova entidade no lugar da famosa CNB e fui secretário de formação; idem ao apagamento. Alguém ou "alguéns" mandou apagar a minha foto da história dessas entidades, como ouvimos dizer na história das esquerdas no mundo.
Enfim, quais poderiam ser meus objetivos e projetos de futuro para 2024 e quiçá algum tempo mais? Ou desejos, torcida?
- Ser professor e dar aula em algum projeto voluntário em 2025, me preparar em 2024?
- Voltar a Cuba e seguir estudando experiências de sociedades não capitalistas?
- Viajar à Itália e já falar italiano quando for?
- Vai que eu descubra em mim uma forma de ainda correr uma maratona...
- Ler alguns livros, uns clássicos como, por exemplo, Os miseráveis (comecei já), Guerra e Paz, e mais alguns autores que nunca li.
De verdade, de verdade, eu tenho algumas torcidas, desejos, coisas que não dependem de mim.
Desejo que as pessoas de meus afetos tenham saúde e sobrevivam ao ano de 2024. Gostaria de ver as pessoas que amo se encontrarem, se realizarem, serem um pouco felizes. Serem humanistas e tolerantes umas com as outras.
Desejo ter saúde, não perder minha visão e não piorar minha condição de desgaste nos quadris. Gostaria de correr com regularidade. Minha vista e minhas pernas são importantes para mim. Torcer para não ter infarto, AVC e câncer.
Desejo seguir estudando e o que posso fazer neste momento para a coletividade é escrever o que aprendo e o que penso, escrever com honestidade, e tentar passar adiante o que sei de forma gratuita, porque hoje sobrevivo do meu benefício do fundo de pensão para o qual contribuí por quase três décadas.
Acho que só isso. As outras possibilidades de projetos e objetivos são referências de norte (utopia para andar adiante) não muito realizáveis, a minha vida foi sempre vivida pelos acontecimentos do dia.
Se eu conseguisse, eu esqueceria todo esse passado que sequer existe e esqueceria também tudo o que me oprime a alma e viveria a tal vida gozando o dia a dia, ligando um foda-se para os outros e para o mundo... mas isso não é da minha natureza. Gostaria de mudar isso e esquecer essa merda que me dilacera.
Mas vamos seguir o norte racional que imaginei (o lugar nenhum a se alcançar), seguir lendo e escrevendo, indo em mobilizações de rua que chamam a cidadania etc.
Ajudando quando der e não atrapalhando os outros. Mas falando o que penso, é meu dever e minha obrigação falar baseado no que conheço e penso.
William Mendes
Mais um na multidão