sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Vidas secas (1938) – Graciliano Ramos


Desenho: Aldemir Martins

CLÁSSICO BRASILEIRO de 1938

MINHAS LEITURAS


INTRODUÇÃO

Este livro é uma das obras mais marcantes que já li. Neste ano, fiz minha quarta leitura. A primeira vez que o li foi no ano 2000. Eu já tinha mais de trinta anos de idade e as mazelas do Nordeste eram quase as mesmas das décadas e séculos anteriores. Nada, nem ninguém, dava jeito naquele mundo. Na verdade, nenhum político ou política havia tido um foco sério naquele mundo.

Os poucos compromissados com a causa do povo do Nordeste, como Celso Furtado, não lograram êxito devido aos vícios da política, tanto local quanto nacional.

Uma das coisas mais marcantes para mim, ao ler a obra hoje, é em relação àquele Brasil descrito por Graciliano Ramos quando comparado com o Brasil atual, após os dois mandatos do presidente Lula da Silva do Partido dos Trabalhadores. A diferença é fantástica!

Hoje, o Nordeste é pujança e a esperança é real e já é presente – é a região com o maior crescimento do PIB no País. A esperança é real e extrapola aquela que o povo simples brasileiro já carrega em seu DNA.

O livro serve de denúncia e de aviso. Vale a pena investir na política focada na solução dos problemas do povo de um país. Vale a pena. O Brasil provou isso no século XXI.

Qualquer região do mundo habitada pelos humanos tem possibilidades promissoras quando a política é focada na busca de soluções para melhorar a vida daquele povo e daquela comunidade. A inteligência humana, quando canalizada para o bem comum, é ilimitada.


VIDAS SECAS

A primeira coisa admirável é a linguagem ímpar de Graciliano. A obra é uma ficção em prosa, mas poderia ser construída em versos. O ritmo do autor é muito característico. Seco e direto, porém sensibilizador.

Vejam como poderíamos ler poesia em Vidas Secas. Coloco em verso o início da obra.


MUDANÇA

Na planície avermelhada

os juazeiros alargavam duas manchas verdes.
Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro,
estavam cansados e famintos.

Ordinariamente
andavam pouco,
mas como haviam repousado bastante
na areia do rio seco,
a viagem progredira bem três léguas.
Fazia hora que procuravam uma sombra.
A folhagem do juazeiro apareceu longe,
através dos galhos pelados da catinga rala.

Arrastaram-se para lá,
devagar,
sinhá Vitória com o filho mais novo
escanchado no quarto
e o baú de folha na cabeça.

Fabiano sombrio,
cambaio,
o aió a tiracolo,
a cuia pendurada numa correia
presa ao cinturão,
a espingarda de pederneira no ombro.

O menino mais velho
e a cachorra Baleia
iam atrás.


O PAPAGAIO: ESPELHO DA LINGUAGEM DA FAMÍLIA

“Despertara-a um grito áspero, vira de perto a realidade e o papagaio, que andava furioso, com os pés apalhetados, numa atitude ridícula. Resolvera de supetão aproveitá-lo como alimento e justificara-se declarando a si mesma que ele era mudo e inútil. Não podia deixar de ser mudo. Ordinariamente a família falava pouco. E depois daquele desastre viviam todos calados, raramente soltavam palavras curtas. O louro aboiava, tangendo um gado inexistente, e latia arremedando a cachorra.”

O papagaio acabou aprendendo a repetir o som de quem “falava” pela família: a cachorra Baleia.


ERAM COMO COISAS, MAS QUERIAM VIVER

“Aquilo era caça bem mesquinha, mas adiaria a morte do grupo. E Fabiano queria viver (...) Pensou na família, sentiu fome. Caminhando, movia-se como uma coisa, para bem dizer não se diferenciava muito da bolandeira de seu Tomás...”


FABIANO: HOMEM OU ANIMAL?

“- Fabiano, você é um homem, exclamou em voz alta.

Conteve-se, notou que os meninos estavam perto, com certeza iam admirar-se ouvindo-o falar só. E, pensando bem, ele não era homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. Vermelho, queimado, tinha os olhos azuis, a barba e os cabelos ruivos; mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra.”

“Chape-chape. As alpercatas batiam no chão rachado. O corpo do vaqueiro derreava-se, as pernas faziam dois arcos, os braços moviam-se desengonçados. Parecia um macaco.”


NA PRISÃO INJUSTA, LEMBROU-SE DA FAMÍLIA

“Lembrou-se da casa velha onde morava, da cozinha, da panela que chiava na trempe de pedras. Sinhá Vitória punha sal na comida. Abriu os alforjes novamente: a trouxa de sal não se tinha perdido. Bem. Sinhá Vitória provava o caldo na quenga de coco. E Fabiano se aperreava por causa dela, dos filhos e da cachorra Baleia, que era como uma pessoa da família, sabida como gente.”


Desenho de Aldemir Martins

TRAÇOS MARCANTES NA OBRA

Algumas características de Vidas Secas são bem conhecidas do público leitor.

- a não linguagem dos humanos;

- as características antropomórficas da cachorra Baleia, o ente da família mais “humano” e “inteligente”;

- as personagens humanas da família de retirantes são caracterizadas o tempo inteiro como animais. Os meninos não têm nome, não usam roupas. A família mais grunhe do que fala. Os meninos têm que aprender com Baleia várias coisas.

- o capítulo sobre Baleia nasceu como um conto e depois foi incluído no livro. O livro foi feito ao redor de Baleia. Não quero comentar sobre os acontecimentos finais em relação aos personagens. Prefiro que leiam a obra e descubram.

- os ciclos viciosos que se repetem desesperançosamente: a violência da “lei” contra os humildes; a sabida retirada e fuga da seca mais cedo ou mais tarde; a tendência das proles dos sertanejos serem rudes e não verem um destino melhor do que o de seus pais.


MINHA IMPRESSÃO DAS LEITURAS ATÉ 2002

Escrevi no livro o que havia sentido nas três leituras que eu fizera até a eleição para presidente do Brasil do metalúrgico Lula da Silva, filho de retirantes nordestinos como a família de Fabiano e Sinhá Vitória.

Que situação infeliz! Isto acontecia em 1938. Isto acontece em 2002. São tantos homens, mulheres e crianças que sofrem com a seca no Nordeste.

2002: são tantos homens, mulheres e crianças que sofrem fome nas favelas de nosso País. Casas de madeira e latão. Casas de papelão. Crianças cheirando cola e crack nas praças. Homens defecando nas ruas. Andem nas metrópoles e vejam isto. 1938/2002 – sertão nordestino... São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte...

E as produções mundiais a cada dia batem novos recordes. E a fome a cada dia bate novo recorde.

Sempre assim. E os fabianos não atinam que têm direitos. Os homens brancos ficam nervosos e ameaçam só de ouvir grunhidos “hum, hum” dos fabianos reclamando.

O coração está apertado e mofino!


Capa da primeira edição de Vidas Secas.

CONCLUSÃO

Minha reflexão após tudo isso está no início, em minha introdução:

Qualquer região do mundo habitada pelos humanos tem possibilidades promissoras quando a política é focada na busca de soluções para melhorar a vida daquele povo e daquela comunidade. A inteligência humana, quando canalizada para o bem comum, é ilimitada.

Não era sonho aquilo que sempre buscou nosso mestre e sábio Celso Furtado. Ele faleceu ainda no início das transformações por que passaria o Nordeste brasileiro neste século XXI sob a batuta do metalúrgico retirante Lula da Silva.

Falta muito ainda, tanto para o nordeste quanto para os milhões de fabianos e família. Mas há esperanças quando há foco na política de desenvolvimento com distribuição de renda e riquezas.

Sigamos buscando o fim das vidas secas. Vimos que é possível.


William Mendes


Bibliografia:

RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. 80ª edição. Editora Record. 2000.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

A Partida - 2008, Japão.



Foto de divulgação

A PARTIDA
Um filme dirigido por Yôjirô Takita.
Vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro de 2009.

A beleza deste filme japonês, na minha opinião, só se equipara à beleza do filme americano Uma história real. Leia aqui.
O filme nos traz uma lição de vida a cada caso de morte. Temos a relação entre pais e filhos. Temos a questão da aceitação ou não dos pais que têm os filhos diferentes. Temos muitas questões de preconceito.
O filme é uma bela lição de vida, apesar de ser um filme sobre a morte.

OS MOMENTOS PESAM
Rever o filme A Partida, neste momento, tocou-me profundamente. Vi algumas “partidas” nos últimos meses que me entristeceram muito.
Ver a dona Irene, que nos vendia pãezinhos na frente do condomínio, morrer de câncer em poucas semanas, foi algo triste e chocante.
Ver o meu vizinho e colega Rogério, bancário do Bradesco, morrer na véspera do Natal, de maneira tão boba, após uma cirurgia de estômago, e deixar dois filhinhos de menos de dois anos, é muito triste.
Ver uma família de amigos de infância sofrer pela morte prematura de uma filha de 22 anos, na mesma semana de Natal da morte do Rogério, é também tristeza pura.
Fiquei pensando na família do companheiro Edmundo, ex-presidente do Sindicato dos bancários de Alagoas, que morreu prematuramente neste semestre.
Alguns filmes são feitos para serem vistos várias vezes. A Partida é um deles.

COM A IDADE, TORNA-SE COMUM VER “PARTIDAS”
Tantas Partidas virão em minha vida, pois já estou na fase de ver pessoas próximas e da família, muitas delas mais velhas, partindo – ou morrendo -, haja vista que sou ateu e não acredito em nenhuma sequência, porta ou passagem para outra vida.
A Partida pra mim é só passagem para a volta à natureza.

Recomendo muito a toda pessoa que ainda não tenha visto este filme, que o faça, pois ele é de uma beleza incrível e trata a morte com um respeito absurdo!

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Vidas Secas em versos...

Ilustração de Vidas Secas - Aldemir Martins

VIDAS SECAS
RELEITURAS
Vidas secas em versos


MUDANÇA
Na planície avermelhada
os juazeiros alargavam duas manchas verdes.
Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro,
estavam cansados e famintos.
Ordinariamente
andavam pouco,
mas como haviam repousado bastante
na areia do rio seco,
a viagem progredira bem três léguas.
Fazia hora que procuravam uma sombra.
A folhagem do juazeiro apareceu longe,
através dos galhos pelados da catinga rala.

Arrastaram-se para lá,
devagar,
sinhá Vitória com o filho mais novo
escanchado no quarto
e o baú de folha na cabeça.

Fabiano sombrio,
cambaio,
o aió a tiracolo,
a cuia pendurada numa correia
presa ao cinturão,
a espingarda de pederneira no ombro.

O menino mais velho
e a cachorra Baleia
iam atrás.

COMENTÁRIO:
Mais uma vez, faço aqui uma licença poética e disponho um trecho de Vidas Secas em outro formato - em versos livres.
O ritmo de leitura é exatamente o mesmo em que leio, respeitando os sinais gráficos de Graciliano e a minha respiração.
É isso.

Bibliografia:
RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. 80ª edição. Editora Record. 2000.

sábado, 24 de dezembro de 2011

FERNÃO CAPELO GAIVOTA - Richard Bach


Gaivota - imagem Wikipedia

FERNÃO CAPELO GAIVOTA – Richard Bach
CLÁSSICO AMERICANO de 1970
“Uma gaivota é uma ilimitada ideia de liberdade, uma imagem da Grande Gaivota, e todo o corpo de vocês, da ponta de uma asa à ponta da outra, não é mais do que o próprio pensamento de vocês.”
Pois é, estou em Uberlândia, na casa de meus pais para o Natal.
Da última vez que estive aqui, havia ganhado de meu primo um monte de livros que li quando era adolescente. Como não foi possível levá-los de uma vez, levei alguns primeiro – dentre eles, o livro que li recentemente de Sartre, A Náusea. Vou levar mais alguns para Osasco desta vez, quando for embora amanhã à noite.
Hoje pela manhã reli o livro de Richard Bach, Fernão Capelo Gaivota. Li de uma sentada só.
Após minha passagem pela Faculdade de Letras da Usp e também após minhas próprias reflexões, cheguei à conclusão de que não é uma atitude adequada à busca do saber, ficar demarcando qual livro ou texto se deve ler e qual não se deve.
Cada pessoa tem o seu Tempo e o seu momento. Assim como hoje, provavelmente, eu não leia mais Paulo Coelho ou coisas do gênero, muitas pessoas estão em momentos diferentes e suas histórias de leituras caminharão para a direita, para a esquerda, para cima e para baixo.

A SENSAÇÃO DA RELEITURA
A história é toda metafórica. Gostei de reler.
Todos nós somos potencialidades e podemos criar e extrapolar as barreiras que nos determinam culturalmente. Recomendo a leitura do texto de Rubem Alves – O Nome -, que já publiquei aqui neste blog.
Ao invés de contar um pouco mais de detalhes sobre a história de Fernão Capelo Gaivota, ou de Jonathan Livingston Seagull - no título original -, recomendo a leitura do livro.
Eu o considero um clássico da literatura mundial. E, sem dúvida, não se perde nada na breve leitura. Pelo contrário, me levou a pensar sobre a questão das nossas potencialidades.

A VOLTA AO LAR PARA LUTAR POR MUDANÇAS

Gaivotas - imagem Wikipedia

Como sindicalista, um momento no livro me chamou bastante a atenção:
Após um bom tempo fora, pois Fernão e outras gaivotas foram banidas de seu clã por serem diferentes, eles decidem voltar e ocupar o mesmo espaço do bando na praia.
Fernão e seu grupo de gaivotas passam a fazer acrobacias e altas técnicas de voo na frente de todos e, apesar da comunidade ser proibida de falar e olhar para eles, aos poucos as jovens gaivotas não resistem e começam a olhar de rabo-de-olho e a chegarem mais perto e a pedirem para o grupo de Fernão lhes ensinarem aquelas maravilhas.
É um momento muito legal de tática para envolver as massas... ou seja, querer partilhar o que se sabe e partilhar com os seus pares.
Depois também, Fernão deixa claro aos seus discípulos e aos demais que ele não é um deus, nem um ser especial e à frente de seu tempo. Ele é o que todos podem ser: ter um sonho e ser dedicado para realizá-lo.

Bibliografia:
BACH, Richard. Fernão Capelo Gaivota. Edição de Círculo do Livro. Tradução de Antônio R. Rosa e Madalena Rosález.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

O caso da borboleta no metrô

Já faz alguns meses que escrevi um texto onde refletia sobre a tristeza e o peso na consciência que senti certa vez que vi um filhote de passarinho na rua, próximo ao meu local de trabalho, em um dia frio e chuvoso, e, apesar de ficar com dó, não fiz nada além de pegá-lo e tirá-lo de uma porta de cafeteria e colocá-lo embaixo de um banco de praça.
Naquele dia eu não fiz a diferença para aquele filhote de passarinho, pois naquela condição ele teria pouca oportunidade de sobrevivência, sem alimento e um cantinho para se desenvolver melhor.
Nesta segunda-feira, tive a oportunidade de me redimir daquela vez em que tive uma atitude pusilânime e sem decisão firme do que fazer para alterar ou criar nova condição a um ser que precisa de ajuda.

A BORBOLETA NA ESTAÇÃO ERRADA
Borboleta Tigre - foto: Luciana Bueno
Eu estava no trem do metrô, vindo da rodoviária do Tietê. Quando a porta se abriu na estação Armênia, que fica acima do solo, entrou uma bela borboleta dentro do vagão em que me encontrava.
O vagão não estava muito cheio não. Eu até estava sentado. A borboleta entrou e, antes que ela percebesse onde havia se metido, a porta se fechou.
Voou meio desorientada por alguns segundos. Passou próximo de uma senhora que estava sentada em frente a mim. A senhora quase a derrubou com uma mãozada – por sorte ela errou o alvo.
A borboleta foi para o rumo da janela ao meu lado. Ela não teria a menor chance de sobrevivência dentro daquele vagão, ou dentro do túnel, ou ainda dentro de outra estação sob a terra.
Desta vez fui mais determinado em atender meus instintos de amor à natureza e em segundos decidi ajudar aquela borboleta.

RESGATE DA BORBOLETA
Com a mão em concha, consegui pegá-la no vidro, certificando-me de não machucá-la ou danificar suas asas.
O povo dentro do vagão ficou me olhando meio esquisito. Acho que era porque aquilo era meio esquisito mesmo.
Aguardei passar algumas estações pensando em como ajudar aquela borboleta. A única solução para fazer um salvamento bem feito seria levá-la cuidadosamente até o mundo lá fora e soltá-la para seguir sua vida.

SALTANDO NA ESTAÇÃO CERTA
Decidi descer na estação São Bento e levá-la comigo até a rua.
Na hora de sair do vagão, ainda precisei pedir ajuda para por a alça de minha mochila no ombro. Pedi para aquela senhora que quase acertou a borboleta com uma mãozada. A mão dela serviu para ajudar-me a salvar aquela borboleta ao invés de dar-lhe uma bordoada fatal.
Com todo o cuidado, sai do vagão com as mãos em concha andando pelas escadas e corredores da estação São Bento, no contra-fluxo da multidão em fim de tarde, com todos me olhando meio esquisito com aquelas mãos em concha. Havia uma vida nelas.
Assim que saí da estação, achei uma área com plantas e abri as mãos. A borboleta tigre (pelo que pude pesquisar) estava intacta e sem nenhum dano aparente. Ela gastou alguns segundos em minha mão aberta e então levantou vôo e foi-se para a vida, flanando.
Desta vez, eu fiz a diferença!


CLIQUE e leia o texto: Hoje, eu não fiz a diferença

sábado, 17 de dezembro de 2011

Vidas Secas em versos...

Ilustração de Vidas Secas - Aldemir Martins

VIDAS SECAS – GRACILIANO RAMOS
Releituras
Vidas secas em versos

FUGA
A vida na fazenda se tornara difícil.
Sinhá Vitória se benzia tremendo,
manejava o rosário,
mexia os beiços rezando rezas desesperadas.

Encolhido no banco do copiar,
Fabiano espiava a catinga amarela,
onde as folhas secas se pulverizavam,
trituradas pelos redemoinhos,
e os garranchos se torciam,
negros,
torrados.

No céu azul as últimas arribações tinham
        [desaparecido.
Pouco a pouco os bichos se finavam,
devorados pelo carrapato.

E Fabiano resistia,
pedindo a Deus um milagre.

COMENTÁRIO:

Vejam o que é um ritmo estabelecido em uma linguagem. Este é o início do último capítulo do livro Vidas Secas de Graciliano Ramos, de 1938.

A poesia é, sobretudo, ritmo. Ela não precisa, necessariamente, estar ordenada em estruturas poéticas tradicionais ou rígidas.

É por isso que autores como Graciliano Ramos, Machado de Assis e Guimarães Rosa são revolucionários da literatura brasileira e universal. São autores que demarcam o tempo com seus estilos e abrangência na poética literária.

Bibliografia:
RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. 80ª edição. Editora Record. 2000.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

O PEQUENO PRÍNCIPE - The little prince

Uma das capas do livro

THE LITTLE PRINCE – Antoine de Saint-Exupery
CLÁSSICO FRANCÊS de 1943

Eu li este livro – O pequeno príncipe – quando era adolescente. Até hoje a frase que mais marcou a leitura na minha cabeça foi: “você é responsável por aquilo que cativa”.
É uma frase dura. É uma frase que escraviza (ou liberta).
Peguei um volume em inglês para dar uma olhada.

LEITURA (tradução e interpretação livre)
A primeira frase interessante é sobre os adultos:
“They always need to have things explained” (eles sempre precisam de explicação pra tudo)
Outra frase muito boa:
“Grown-ups never understand anything by themselves, and it is tiresome for children to be always and forever explaining things to them”
(os adultos nunca entendem as coisas por conta própria, e é uma chatice para as crianças ficar sempre explicando as coisas pra eles)
O piloto de avião - que poderia ter sido um pintor se não o tivessem desencorajado após seus Desenhos nº 1 e nº 2 aos seis anos - sempre tenta achar um adulto que compreenda o que realmente quer dizer o seu Desenho nº 1. Não tem jeito, todos sempre afirmam ser sua Boa Constrictor um chapéu.
Desenho nº 1 e Desenho nº 2

OS ADULTOS SÃO ASSIM... (só ligam pra aparência)
“On making his discovery, the astronomer had presented it to the International Astronomical Congress, in a great demonstration. But he was in Turkish costume, and so nobody would believe what he said.
Grown-ups are like that…”
(ninguém no congresso de astronomia deu bola para a apresentação do astrônomo turco em trajes típicos quando ele anunciou a descoberta de um novo planeta – Asteróide B-612 -... os adultos são assim...)

SOBRE O CUIDADO EM LER A OBRA
“For I do not want any one to read my book carelessly. I have suffered too much grief in setting down these memories. Six years have already passed since my friend went away from me, with his sheep”
(o piloto não quer que se leia sua obra sem atenção, pois foi com muita dificuldade que ele colocou no papel essas memórias desde que o pequeno príncipe foi embora com seu carneirinho há seis anos)
No capítulo 5 há uma passagem metafórica interessante. A história fala de sementes boas e ruins que dormem na escuridão da terra. Quando elas decidem sair ao sol, é preciso saber diferenciar as boas plantas das plantas ruins. Deixar as boas e arrancar as ruins pela raiz. Esta é a sabedoria difícil e necessária.
No planeta do pequeno príncipe, o baobá é uma tragédia. Se deixá-lo crescer e dominar o solo, ele toma conta do pequeno planeta.

Fazendo a toalete do planeta
FAZER DIARIAMENTE A PRÓPRIA TOALETE E A DO PLANETA
“It is a question of discipline,” the little Prince said to me later on. “When you’ve finished your own toilet in the morning, then it is time to attend to the toilet of your planet, just so, with the greatest care”

UM DIA APARECEU UMA FLOR DIFERENTE…
Uma flor diferente e vaidosa apareceu na vida do pequeno príncipe. Ela lhe deixou muito confuso sobre como proceder com ela. Após um bom tempo dedicado a ela, regando, protegendo ela, ela se mostra pouco atenciosa com ele.
Ele decide ir embora de seu planeta...

VIAGEM POR VÁRIOS PLANETAS
Nosso pequeno príncipe passa por vários planetas após sair do seu.  Eram os asteróides 325, 326, 327, 328, 329 e 330. Depois vai para o planeta Terra.
REI = No primeiro, ele encontra um rei com um trono e uma capa que ocupa todo o planeta. Assim que ele vê o pequeno príncipe, já afirma: “Ah! Here is a subject” (...)
“He did not know how the world is simplified for kings. To them, all men are subjects”
(para os reis, todo mundo é súdito)
CONVENCIDO = No segundo, ele encontra um orgulhoso que logo lhe diz: “Ah! Ah! I am about to receive a visit from an admirer!”
(Vejam só! Estou recebendo a visita de um admirador)
BEBERRÃO = no terceiro, ele encontra um beberrão que bebe muito pra esquecer da vergonha que sente por beber muito.
HOMEM DE NEGÓCIOS = no quarto planeta, ele encontra um homem que resolveu dizer que é dono de todas as estrelas porque ele pensou nisso primeiro.
“Then they belong to me, because I was the first person to think of it”
ACENDEDOR DE LAMPIÕES = no quinto, o pequeno príncipe ao menos viu uma razão ou utilidade naquilo, pois acender lampiões quando escurece e apagá-los quando amanhece tem algum sentido.
GEÓGRAFO = no sexto, o garoto encontrou um senhor geógrafo muito técnico e intelectual. Só tinha um problema: ele não sabia nada de seu próprio planeta, pois para conhecê-lo era necessário que houvesse um aventureiro para depois contar ao geógrafo, um sábio, o que havia descoberto na prática e nas experiências de campo.
o sétimo planeta visitado foi o planeta Terra, que é completamente diferente dos outros pela imensidão e complexidade.

Mais uma ilustração clássica
PEQUENO PRÍNCIPE E A COBRA NO DESERTO
“You are a funny animal”, he said at last. “You are no thicker than a finger…”
“But I am more powerful than the finger of a king,” said the snake”
(apesar de ser mais fina que um dedo, a cobra se diz mais poderosa que o dedo de um rei)

PEQUENO PRÍNCIPE E OS MILHARES DE FLORES
E então, após andar por longo tempo no deserto, o pequeno príncipe encontra um jardim com milhares de flores iguais a sua e tem uma decepção enorme, pois descobriu serem pouco importantes suas três montanhas pequenas e sua flor que achava que fosse a única no universo.

PEQUENO PRÍNCIPE E A RAPOSA
As explicações da raposa para o pequeno príncipe são muito legais. Ela explica a ele qual o sentido de cativar algo, de criar uma relação, laços, que faça com que a coisa ou pessoa que se cativa se torne única no mundo, mesmo sendo comum.
“Come and play with me,” proposed the little Prince. “I am so unhappy.”
“I cannot play with you,” the fox said. “I am not tamed.”
(…) “What does that mean – ‘tame’?”
(…) “It is an act too often neglected,” said the fox. “It means to establish ties.”
Existem milhares de flores ou pessoas, mas se você cria laços com uma flor ou uma pessoa, você e essa pessoa ou flor precisarão um do outro. A partir de então, ambos serão únicos um para o outro no mundo.

NÃO SE COMPRA AMIGOS EM SHOPPINGS
“One only understands the things that one tames,” said the fox. “Men have no more time to understand anything. They buy things all ready made at the shops. But there is no shop anywhere where one can buy friendship, and so men have no friends anymore. If you want a friend, tame me…”
(devemos entender aquilo que cativamos e a que nos dedicamos. Os homens não têm mais tempo pra nada. Tudo se compra pronto. Mas não se pode comprar amizade por aí, e com isso, os homens não têm mais amigos. E então, você não quer me cativar?)
Interessante, heim! Os homens já não tinham mais tempo nos anos 40...

COMO CATIVAR UM AMIGO...
Muito interessante a explicação da raposa ao pequeno príncipe da maneira com que se deve começar uma amizade ou relação. Sente-se um pouco afastado e não fale nada, apenas olhe meio de soslaio. As palavras podem ser a origem do desentendimento.
“words are the source of misunderstandings”

OS OLHOS ESTÃO CEGOS. DEVE-SE OLHAR COM O CORAÇÃO
Esta é outra conclusão a que chegam o pequeno príncipe e o piloto, no deserto, após uma grande sede e busca por água.
“But the eyes are blind. One must look with the heart…”

Aprende-se bastante com esse garotinho aí.

COMENTÁRIO FINAL
Releitura muito prazerosa. Depois de ler o livro na adolescência, descobri na idade adulta – i’m a grown-up – que é sempre bom conciliar ou intercalar a leitura de novas obras ou obras literárias ainda desconhecidas com a releitura dos grandes clássicos.
É isso!
Bibliografia:
SAINT-EXUPERY, Antoine de. The little prince. USA.

domingo, 4 de dezembro de 2011

OTELO, O MOURO DE VEZENA

Tragédias, de Shakespeare
OTELO, O MOURO DE VENEZA - William Shakespeare
“O ciúme de Otelo”
Acordei neste domingo com a intenção de começar a enumerar os clássicos que já li. É por causa da minha lista de coisas a realizar, lista feita faz uns quinze anos.
Naquela época, listei que tinha o objetivo de ler cem clássicos da literatura mundial. Nunca parei para contar quantos já li.
Mas na verdade, o que pretendo fazer é escrever algo a respeito de cada obra. Pode ser uma impressão que tenha ficado na época da leitura, um aprendizado ou lição de vida. Também vale reler e ver qual a nova impressão captada por este novo velho leitor.
Então, acabei de reler “Otelo” de Shakespeare.

HISTÓRIA DE MINHA LEITURA – O ciúme de Otelo
Terminei a primeira leitura de Otelo em 8/2/05. O porquê daquela leitura é para mim inesquecível, pois foi um ato de leitura daqueles que considero ideal: o descobrimento das intertextualidades.
Eu estava lendo “Irmãos Karamázov” de Dostoiévisk quando cheguei a um momento da leitura que citou o “ciúme de Otelo”. Eu fiquei na hora indignado de minha ignorância por não ter lido a obra referida e não saber a intensidade do tal “ciúme de Otelo”.
Na hora, fechei o livro de Dostoiévisk e fui até minha estante pegar e ler a tragédia citada de Shakespeare. Li de uma sentada só e voltei aos Irmãos Karamázov sabendo exatamente - que diabos! - queria dizer “ciúme de Otelo”.

A RELEITURA
Lida a obra quase sete anos depois, digo que ela continua chocante e assustadora. Não é à toa que a peça segue sendo interpretada há quase cinco séculos. De certa forma, a obra também faz intertextualidade com “Medeia” de Eurípides. Pela temática da ira incontrolável gerada pelo ciúme e pela traição.
A tragédia se dá em cinco atos e conta a história do mouro Otelo e de sua bela esposa Desdêmona. A história se passa em Veneza e Chipre.
Pude perceber nela muito dos problemas sociais que enfrentamos na atualidade: preconceitos vários como raça, gênero, condição social.
A questão mais chocante e atemporal é a lembrança de como as pessoas podem ser manipuláveis por outras pessoas a ponto de cometerem barbaridades. Aliás, o ser humano tem a capacidade de orquestrar grandes trapaças e sacanagens para alcançar seus objetivos não se importando em prejudicar a tantos quanto forem necessários.

A TRAMA
“IAGO – E quem se atreverá a dizer que meu papel é o de vilão quando esse conselho dou de graça e de coração, um conselho bastante plausível, e, na verdade, o caminho para reconquistar o Mouro? Pois é muito fácil para a graciosa, obsequiosa Desdêmona empenhar-se em qualquer pedido honesto. Ela é de constituição que frutifica como os elementos da natureza. E assim, para ela obter algo do Mouro, mesmo que fosse ele renunciar ao próprio batismo, às garantias e símbolos de seus pecados redimidos, tem ele sua alma tão agrilhoada ao amor dela que ela pode fazer, desfazer, inventar o que lhe aprouver, mesmo brincando de deus os apetites dela com as enfraquecidas faculdades dele. Como, então, posso eu ser vilão ao aconselhar Cássio nesse caminho paralelo, o mais curto para o seu próprio bem? Divindades do inferno! Quando o desejo dos demônios é vestir os mais negros pecados, eles insinuam-se primeiro com vestimentas angelicais, como eu faço agora. Enquanto esse honesto otário importuna Desdêmona com seus pedidos para que ela conserte seu destino, e, enquanto ela, por ele, implora clemência ao Mouro, eu estarei vertendo esta pestilência nos ouvidos de nosso general: que ela o quer de novo nas boas graças de seu superior para apaziguar a luxúria de seu corpo. E, quanto mais ela se esforçar por ajudá-lo, ela estará perdendo crédito junto ao esposo. Assim, transformarei eu a virtude dela em piche, e, da própria bondade de Desdêmona, tecerei a malha que os enredará a todos”

O CIÚME
“IAGO – Acautele-se, meu senhor, contra o ciúme. É ele o monstro de olhos verdes que zomba da carne com que se alimenta. Vive feliz o corno que, certo de seu destino, não ama a quem o ofende. Mas, ah, que minutos desgraçados passa aquele que adora, porém duvida, suspeita, porém ama com intensidade!”

“EMÍLIA – Reze aos céus para que sejam assuntos de Estado, como a senhora pensa, e não pura fantasia, não um ciúme inventado que lhe diga respeito.
DESDÊMONA – Nesse dia, ai de mim, que nunca lhe dei motivos para ciúme!
EMÍLIA – Mas almas ciumentas não funcionam assim. Elas nunca são ciumentas porque há uma causa, mas sim porque são ciumentas. Este é um monstro gerado em si mesmo e de si mesmo nascido.
DESDÊMONA – Que os céus mantenham esse monstro longe dos pensamentos de Otelo!”

Bibliografia:
SHAKESPEARE, William. Tragédias. Editora Nova Cultural, 2003.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Refeição Cultural - Antes de partir


Foto divulgação

ANTES DE PARTIR – Bucket list

Este é um belo filme com Jack Nicholson e Morgan Freeman. O filme tem direção de Rod Reiner e estreou em 2007.
Ao tecer comentários sobre filmes em meu blog, gosto de escrever algo que realmente tenha me tocado ou alguma reflexão que o filme tenha me levado a pensar.
O ano de 1996 foi um dos anos mais duros de minha vida. Foi um ano de transições, rompimentos e de desistências. Estive completamente sem motivo de seguir adiante naquela época.
Uma das coisas que fiz para mirar em algo a cada dia quando acordava foi uma lista com algumas coisas que desejaria conseguir ou fazer naquela época, com aquela visão de mundo daquele cara.
Logo se vê que o ato humano de fazer listas de coisas a realizar é muito antigo. Acredito que o que varia são as motivações das listas e não o conteúdo das listas em si, que, via de regra, deve até ser muito parecido.
Não descreverei toda a minha lista de motivações para viver a partir daquele ano. Mas o filme me fez procurá-la novamente, pois fazia tempo que não a visitava.

CASA PRÓPRIA
Lá na lista estão ticadas coisas importantes e difíceis de conseguir para a classe trabalhadora pobre e humilde. Adquiri meu pequeno apartamento de cooperativa e não pago mais aluguel. Consegui ajudar meus pais a terminarem a casinha deles lá em Uberlândia. Nesses últimos quinze anos, muitas pessoas de origem simples conseguiram isso, algo que deveria ser fácil em sociedades justas.
Também está ticado o sonho de fazer uma faculdade pública. Passei na Fuvest e fiz Letras na USP. Eu vinha de uma decepção enorme por largar por falta de condições financeiras um curso de Educação Física em uma faculdade privada, curso que adorava e no qual me destacava nas aulas.

SÃO SILVESTRE
Eu não me lembrava de ter listado que tinha o sonho de correr a famosa corrida de São Silvestre. Realizei esse sonho em 2007 e corri nos anos seguintes. Ou seja, realizei com folga esse objetivo.
Hoje, meu desejo é bem mais difícil, pois sonho em correr e completar uma maratona. Com a vida que levo é completamente inviável treinar e me preparar para uma prova de 42 km.

SALTAR DE PARAQUEDAS
Eu me lembro de ter ficado muito impressionado nos anos noventa quando vi na TV um homem saltar de um avião e sair surfando no ar. Eu nunca havia saído do chão. Eu desejei muito voar e fazer um salto de paraquedas.
No dia 19 de fevereiro do ano 2000, abria-se a porta daquele pequeno avião a uns 4.500 pés e o instrutor me chamava a dependurar-me na asa, seguir as instruções de verificação e soltar as mãos para o vazio...
Após abrir o paraquedas foi um dos gritos de emoção mais libertadores que já dei. Estava vivo e estava voando sozinho junto aos pássaros no céu de Piracicaba. Naquele dia me senti o super-homem.
Depois desse primeiro salto sozinho, fiz mais treze saltos e cheguei a ficar nove minutos em descida lenta no céu, curtindo o barulho do vento nos velames, o silêncio do céu. Foi algo maravilhoso que já fiz.

COISAS A FAZER
Uma das coisas por fazer e que necessita de fôlego e tempo está relacionada com meu amor pela leitura e literatura.
Para ticar o item de ler no mínimo cem clássicos da literatura mundial, tenho muita estrada a percorrer. Não fiz uma lista dos clássicos que já li, mas sei que estou longe.
Também sei da questão da dificuldade de se classificar o que seria ou não um clássico da literatura mundial.
Mas alguns clássicos são indiscutíveis. Já percorri obras fantásticas e que me marcaram profundamente como Don Quijote de la Mancha, de Cervantes; Ulisses, de Joyce; A Montanha Mágica, de Mann; O Processo e A Metamorfose, de Kafka; Pedro Páramo, de Rulfo; Vidas Secas, de Graciliano; O Velho e o Mar, de Hemingway; Irmãos Karamázov, de Dostoiévisk; Hamlet, de Shakespeare; Cem Anos de Solidão, de Garcia Marquez; Dom Casmurro e Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado; Macunaíma, de Andrade; Alguma Poesia, de Drummond... e falta muita coisa que já está em minha estante e só falta sentar e Ler...

O FILME
Voltando ao filme "Antes de partir": gostei do filme. Gostei das atuações de Nicholson e Freeman.
O personagem Carter é encantador. Cole é o inverso. O casamento entre ambos é fruto daquilo que penso a respeito das possibilidades humanas: para o ser humano tudo é possível.
Um ser humano pode mudar a vida de outra pessoa. Nós podemos ser fantásticos. Podemos marcar a vida das pessoas. É ISTO O QUE SOMOS, POSSIBILIDADES!
Assistam ao filme!

(após esta reflexão, saí e fui correr 5 km)

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Refeição Cultural - Sobre Liberdade (em silêncio)


São Silvestre 2009.

(atualizado em 4/12/11)

Hoje pela manhã tive raro momento de solidão.

Silêncio pacificador. Até o filtro externo de meu aquário estava sem barulho.

Ficar sozinho às vezes faz bem...

Voltei do planejamento de nosso Sindicato ontem e fui ver meu pai que estava em São Paulo desde o dia anterior. Eu me compadeço muito com a dor daquele homem. Eu juro que sei do que ele está sofrendo.

Na despedida na rodoviária, fiquei olhando para aquele ônibus e ele lá dentro até que o veículo saísse para levá-lo de volta a Uberlândia.

"Uberlândia" - meu pai usa esta palavra e este lugar para tentar achar uma justificativa para a sua infelicidade. Talvez ele tenha razão no que diz respeito à impotência que temos como humanos assim que adquirimos relações com pessoas e coisas. Somos escravos. É um pouco da ideia contida no livro "O pequeno príncipe" - você é responsável por aquilo que cativa!

Fico pensando na questão da "liberdade" em Sartre. O que mais me incomodou quando li "A idade da razão" foi a questão dos personagens dizerem e agirem no intuito de buscarem ser livres, mas faziam coisas contrárias às suas próprias vontades o tempo todo para "provarem" que eram livres (?). Que escravidão do cacete!

Recentemente li "A náusea" e senti a mesma ideia de falsa liberdade na trama de "o-que-fazer-com-a-vida?-já-que-estamos-vivos".

Pai e mãe queridos
Penso em meu pai e penso em mim. O que seguir fazendo com minha vida? Existência escrava que vai fazendo o que chamam de "politicamente correto" e vai sobrevivendo sem buscar realizar os desejos pensados.

Por que não pego para ler a obra toda de um grande escritor e sigo nela até finalizar a leitura lentamente?

Por que não estabeleço como prioridade uma rotina de esporte de maneira a realizar meu desejo de correr e completar uma maratona?

Por que não busco mais momentos de silêncio e isolamento para ter um pouco de paz para poder pensar, escrever e refletir?

Alguma dessas coisas humanas que escrevi acima são impossíveis? São caras? São utópicas? Se não são, por que não as faço?

Não faço pelo emaranhado em que estou metido socialmente enquanto pessoa William no dia de hoje.

E sabemos que a existência da gente pode durar muito, como pode se encerrar no instante seguinte desta escrita (digitada) aqui.

Talvez a liberdade humana não tenha relação possível com as relações humanas e materiais que estabelecemos em nossa própria existência. Mas sem essas mesmas relações não seríamos nada também (?!).

O humano não é um ser livre!

(após esta reflexão, saí e fui correr...)