sábado, 31 de dezembro de 2016

Diário e reflexões – 311216 (O último dia e o amanhã)


Apesar da organização da prova jogar contra os participantes,
completamos mais uma corrida de São Silvestre.

Esta é a última postagem do ano de 2016 neste Blog de cultura e reflexões, o Blog Refeitório Cultural. Foi um ano marcante em todos os sentidos e para quase todos nós, cidadãos do mundo. Pessoalmente, acho que foi um dos anos que mais trabalhei pelas causas que defendo e que mais escrevi em minha vida, somando os textos e matérias dos blogs de trabalho e cultura, foram 342 postagens em 2016.


92ª SÃO SILVESTRE

Neste último dia do ano, participei da 92ª Corrida de São Silvestre. Foi a minha 9ª participação na prova. Dela, tenho reflexões positivas e negativas. As positivas são relativas à superação pessoal de ter chegado a São Paulo praticamente sem condições físicas para correr os 15 km e ter me surpreendido com a resistência de meu corpo. Apesar de ter castigado minha saúde por causa do trabalho (e também pela tristeza de ver o que fizeram com nosso País), consegui correr a prova, completei sem dificuldades e estou bem. Esta mensagem de meu corpo é um alerta a mim mesmo para que eu me cuide mais porque sou forjado nas lutas e o próximo período será de lutas totais.

As reflexões negativas a partir de minha 9ª participação na Corrida de São Silvestre começam pela minha decisão de que esta foi a última vez que faço tamanho esforço para estar neste evento. Apesar de ter sido coroado com aquela emoção corporal, quando os arrepios inundam nosso corpo ao final da subida da Brigadeiro, o restante da prova e o clima que senti foi de despedida. Eu comparo a relação da organização da São Silvestre com os participantes ao Brasil que nos impuseram a partir deste nefasto ano de 2016.

O desrespeito com os participantes é flagrante, é nojento, é humilhante, da mesma forma que os golpistas liderados pelos empresários donos dos meios de comunicação totalitários tratam o povo brasileiro: feito idiotas, marionetes, gente sem memória e movida a porcarias televisivas e impressas (pão e circo), a telas de celulares e redes sociais. Aliás, ao observar o povo ao meu redor, tenho sentido uma sensação terrível pelo que vejo, ouço e observo. Não sairemos tão cedo do lamaçal em que nos colocaram chafurdando.

As filas para retirada dos kits no Ibirapuera são provas inequívocas da falta de organização da prova. Fiquei mais de 3 horas para pegar o kit na sexta-feira 30. A quantidade de gente que pode se inscrever, somada à quantidade de pessoas que a organização da prova permite participar sem inscrição, acaba dobrando os 30 mil inscritos, número que já não permitiria que os participantes “corressem” porque se vai pisando no calcanhar dos outros da saída caótica na Avenida Paulista à chegada. A Globo manda na prova para passar na programação e fodam-se as dezenas de milhares de participantes.



Multidão desce a ladeira ao lado do Pacaembu.
A surpresa viria lá no fim:
não havia água para os corredores.
Neste ano, não havia sequer água para milhares de pessoas. Foi pavoroso ver aquela massa de participantes pedindo água num calor de mais de 30º sem ter como se hidratar. A inscrição custou 160 reais e tem um monte de patrocinadores. Onde vão parar os 30 mil x 160 reais (quase 5 milhões de reais)? É uma questão de respeito humano!

Para finalizar a minha reflexão negativa sobre a São Silvestre, ver aquela massa de gente sendo humilhada e sacaneada pela organização da prova, tendo como maior preocupação parar de correr e atrapalhar o fluxo cada vez que viam uma porra de câmera e um cinegrafista, gritando que estavam na “Globo”, foi a gota para mim. Que massa humana imbecilizada é essa? A Globo liderou o golpe que destruiu o Brasil, os empregos, os direitos sociais dessa massa de trabalhadores que se acha “classe média” e que estará fodida no próximo período sem empregos e eles amam seu algoz. A minha razão não dá conta disso, é maior que qualquer emoção momentânea.


LEITURAS EM 2016

Para não me estender muito nesta última postagem do ano, não farei avaliação política. Ao reler parte de minhas postagens no Blog de cultura, vi a passagem do ano através da política.

Uma das dimensões da vida humana que me surpreendeu positivamente neste ano foi o resultado do esforço extra que fiz em tentar ler e alimentar meu conhecimento e minha capacidade de reflexão.

Por mais que eu tenha feito uma produção textual imensa (161 textos no Categoria Bancária e 181 textos no Refeitório Cultural); que tenha viajado dezenas de vezes aos Estados brasileiros a trabalho; e que tenha estudado e participado de dezenas de reuniões de trabalho; consegui ler e reler muitos livros neste ano.

Li 18 livros e outros 6 estão em andamento. Segui o ensinamento dos anos de estudo nas Letras, quando o tema era literatura e leituras clássicas. Nos diziam que devemos ter na estante de desejos literários uma mescla de clássicos a reler, clássicos a conhecer e textos novos a experimentar. Fiz exatamente isso neste ano de 2016. Reli:

- O velho e o mar, de E. Hemingway (5ª leitura);

- A metamorfose, de F. Kafka (3ª leitura);

- 1984, de G. Orwell

- Representações do intelectual, de Edward Said

- Libertinagem, de M. Bandeira

- O processo, de F. Kafka (releitura em andamento)

Além das releituras, li ótimos livros. Só do autor goiano, José J. Veiga, li:

- Os cavalinhos de Platiplanto; A hora dos ruminantes; A estranha máquina extraviada; O professor Burrim e as quatro calamidades; Sombras de reis barbudos; Os pecados da tribo; De jogos e festas.

Também li:

- Nove estórias, do americano J. D. Salinger;

- A viagem do elefante, do português J. Saramago;

- Um velho que lia romances de amor, do chileno Luís Sepúlveda;

- Não nascemos prontos, do filósofo brasileiro Mario Sergio Cortella;

- A tristeza pode esperar, do médico brasileiro J. J. Camargo;

- Dois irmãos, do brasileiro Milton Hatoum.

Sigo em leitura dos livros:

- Las venas abiertas de América Latina, do uruguaio E. Galeano;

- 50 contos de Machado de Assis, organizado por John Gledson;

- Ilusões perdidas, do francês H. Balzac;

- Era dos extremos, do historiador inglês Eric Hobsbawn;

- Memorial de Aires, romance de Machado de Assis.


E O AMANHÃ? DEVE SER DE LUTA!

É difícil desejar “Feliz Ano Novo” com o que está no cenário da classe trabalhadora brasileira e mundial. Estou com aquele pessimismo da razão que se diz por aí. No entanto, mais que desejar tudo de bom para as pessoas etc (e desejo sim), defendo para 2017 mais participação social de nossos pares da classe trabalhadora, tanto da ativa quanto os aposentados, com os quais lido na comunidade BB que represento. O ano para nós das autogestões será muito difícil, mas a Cassi tem perspectivas, se a população de participantes assistidos não cochilar e acompanhar conosco as lutas.

Defendo que os sindicatos e centrais, correntes políticas e partidos do campo da esquerda, tomem jeito e tenham juízo, deixem de vaidade e de personalismo, que construam uma luta unitária pelo que mais interessa à classe trabalhadora brasileira: manutenção dos direitos históricos. Não é possível que essas entidades dos trabalhadores continuem rachadas e disputando internamente estruturas de poder e vaidades várias. Unidade na luta e na pauta deve ser o foco.

Além de sonhar, eu desejo e defendo que o povo brasileiro lute para desfazer o golpe. O povo é vítima dos golpistas e do 1% que organizou o golpe e para quem o golpe tem trabalhado. É necessário fechar a Rede Globo e outros canais que sacaneiam os 99% de brasileiros. Também torço para que devolvam a Democracia ao povo e a presidenta eleita em 2014 ao seu cargo, caso contrário, é necessário que haja eleições diretas para todo o Congresso e a Presidência. E logo após, revisão dos abusos do Judiciário politizado.

Por fim, é imperioso que todos os crimes de lesa-pátria cometidos com o patrimônio público brasileiro sejam revistos. Tudo, principalmente o Pré-sal.

A luta segue, sempre!

William Mendes
Cidadão brasileiro.



Post Scriptum: enquanto eu escrevia este texto, chegou-me a notícia do falecimento neste dia 31/12/16 de um grande companheiro de lutas sociais e sindicais, e que fez parte da coordenação dos trabalhos na campanha eleitoral que participamos pela Cassi, o amigo Jorlando. Registro meu pesar aos familiares e amigos. Estou muito triste. Companheiro e amigo Jorlando, PRESENTE!

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Instantes... Gestão em Saúde não é igual a saúde pessoal





Saí da Sede da Caixa de Assistência dos Funcionários agora há pouco. Se eu contar a semana intensa de trabalho da Diretoria para encaminhar temas centrais para a nossa entidade no ano de 2017, seria difícil de acreditar...

Ainda temos questões a deliberar até amanhã, sexta-feira 30.

Estou no aeroporto para ir a São Paulo participar no sábado da São Silvestre.

Pensa um cara cansado. Estou esgotado. Mal parando em pé... Ser gestor de saúde na entidade de saúde dos trabalhadores que represento não tem feito bem pra saúde.

Tenho que avaliar com racionalidade o que vou fazer na Av. Paulista no sábado, 31 de dezembro. Talvez eu vá só apreciar a festa pela primeira vez por não estar em condições de participar da prova correndo os 15 km.

Ano difícil para todos nós...

É a vida. A gente faz o que tem que ser feito.

William

domingo, 25 de dezembro de 2016

Leitura: O peru de Natal - Mário de Andrade


Apresentação do blog


Neste Natal, li em voz alta o conto de Mário de Andrade, O peru de Natal. Ele faz parte dos Contos Novos, publicado em 1947, após sua morte em 1945.

O conto é muito bom. A construção das frases é muito rica. Os críticos literários afirmam que os textos reunidos neste livro de contos de Andrade são muito requintados.

Há um embate entre o mundo patriarcal tradicional e o desejo de libertação das gerações que queriam a modernidade também nos usos e costumes.

Boa leitura!

William Mendes



O PERU DE NATAL - MÁRIO DE ANDRADE

O nosso primeiro Natal de família, depois da morte de meu pai acontecida cinco meses antes, foi de consequências decisivas para a felicidade familiar. Nós sempre fôramos familiarmente felizes, nesse sentido muito abstrato da felicidade: gente honesta, sem crimes, lar sem brigas internas nem graves dificuldades econômicas. Mas, devido principalmente à natureza cinzenta de meu pai, ser desprovido de qualquer lirismo, de uma exemplaridade incapaz, acolchoado no medíocre, sempre nos faltara aquele aproveitamento da vida, aquele gosto pelas felicidades materiais, um vinho bom, uma estação de águas, aquisição de geladeira, coisas assim. Meu pai fora de um bom errado, quase dramático, o puro-sangue dos desmancha-prazeres.

Morreu meu pai, sentimos muito, etc. Quando chegamos nas proximidades do Natal, eu já estava que não podia mais pra afastar aquela memória obstruente do morto, que parecia ter sistematizado pra sempre a obrigação de uma lembrança dolorosa em cada almoço, em cada gesto mínimo da família. Uma vez que eu sugerira à mamãe a ideia dela ir ver uma fita no cinema, o que resultou foram lágrimas. Onde se viu ir ao cinema, de luto pesado! A dor já estava sendo cultivada pelas aparências, e eu, que sempre gostara apenas regularmente de meu pai, mais por instinto de filho que por espontaneidade de amor, me via a ponto de aborrecer o bom do morto.

Foi decerto por isto que me nasceu, esta sim, espontaneamente, a ideia de fazer uma das minhas chamadas "loucuras". Essa fora aliás, e desde muito cedo, a minha esplêndida conquista contra o ambiente familiar. Desde cedinho, desde os tempos de ginásio, em que arranjava regularmente uma reprovação todos os anos; desde o beijo às escondidas, numa prima, aos dez anos, descoberto por Tia Velha, uma detestável de tia; e principalmente desde as lições que dei ou recebi, não sei, de uma criada de parentes: eu consegui no reformatório do lar e na vasta parentagem, a fama conciliatória de "louco". "É doido, coitado!" falavam. Meus pais falavam com certa tristeza condescendente, o resto da parentagem buscando exemplo para os filhos e provavelmente com aquele prazer dos que se convencem de alguma superioridade. Não tinham doidos entre os filhos. Pois foi o que me salvou, essa fama. Fiz tudo o que a vida me apresentou e o meu ser exigia para se realizar com integridade. E me deixaram fazer tudo, porque eu era doido, coitado. Resultou disso uma existência sem complexos, de que não posso me queixar um nada.

Era costume sempre, na família, a ceia de Natal. Ceia reles, já se imagina: ceia tipo meu pai, castanhas, figos, passas, depois da Missa do Galo. Empanturrados de amêndoas e nozes (quanto discutimos os três manos por causa dos quebra-nozes...), empanturrados de castanhas e monotonias, a gente se abraçava e ia pra cama. Foi lembrando isso que arrebentei com uma das minhas "loucuras":

— Bom, no Natal, quero comer peru.

Houve um desses espantos que ninguém não imagina. Logo minha tia solteirona e santa, que morava conosco, advertiu que não podíamos convidar ninguém por causa do luto.

— Mas quem falou de convidar ninguém! essa mania... Quando é que a gente já comeu peru em nossa vida! Peru aqui em casa é prato de festa, vem toda essa parentada do diabo...

— Meu filho, não fale assim...

— Pois falo, pronto!

E descarreguei minha gelada indiferença pela nossa parentagem infinita, diz-que vinda de bandeirantes, que bem me importa! Era mesmo o momento pra desenvolver minha teoria de doido, coitado, não perdi a ocasião. Me deu de sopetão uma ternura imensa por mamãe e titia, minhas duas mães, três com minha irmã, as três mães que sempre me divinizaram a vida. Era sempre aquilo: vinha aniversário de alguém e só então faziam peru naquela casa. Peru era prato de festa: uma imundície de parentes já preparados pela tradição, invadiam a casa por causa do peru, das empadinhas e dos doces. Minhas três mães, três dias antes já não sabiam da vida senão trabalhar, trabalhar no preparo de doces e frios finíssimos de bem feitos, a parentagem devorava tudo e ainda levava embrulhinhos pros que não tinham podido vir. As minhas três mães mal podiam de exaustas. Do peru, só no enterro dos ossos, no dia seguinte, é que mamãe com titia ainda provavam num naco de perna, vago, escuro, perdido no arroz alvo. E isso mesmo era mamãe quem servia, catava tudo pro velho e pros filhos. Na verdade ninguém sabia de fato o que era peru em nossa casa, peru resto de festa.

Não, não se convidava ninguém, era um peru pra nós, cinco pessoas. E havia de ser com duas farofas, a gorda com os miúdos, e a seca, douradinha, com bastante manteiga. Queria o papo recheado só com a farofa gorda, em que havíamos de ajuntar ameixa preta, nozes e um cálice de xerez, como aprendera na casa da Rose, muito minha companheira. Está claro que omiti onde aprendera a receita, mas todos desconfiaram. E ficaram logo naquele ar de incenso assoprado, se não seria tentação do Dianho aproveitar receita tão gostosa. E cerveja bem gelada, eu garantia quase gritando. É certo que com meus "gostos", já bastante afinados fora do lar, pensei primeiro num vinho bom, completamente francês. Mas a ternura por mamãe venceu o doido, mamãe adorava cerveja.

Quando acabei meus projetos, notei bem, todos estavam felicíssimos, num desejo danado de fazer aquela loucura em que eu estourara. Bem que sabiam, era loucura sim, mas todos se faziam imaginar que eu sozinho é que estava desejando muito aquilo e havia jeito fácil de empurrarem pra cima de mim a... culpa de seus desejos enormes. Sorriam se entreolhando, tímidos como pombas desgarradas, até que minha irmã resolveu o consentimento geral:

— É louco mesmo!...

Comprou-se o peru, fez-se o peru, etc. E depois de uma Missa do Galo bem mal rezada, se deu o nosso mais maravilhoso Natal. Fora engraçado: assim que me lembrara de que finalmente ia fazer mamãe comer peru, não fizera outra coisa aqueles dias que pensar nela, sentir ternura por ela, amar minha velhinha adorada. E meus manos também, estavam no mesmo ritmo violento de amor, todos dominados pela felicidade nova que o peru vinha imprimindo na família. De modo que, ainda disfarçando as coisas, deixei muito sossegado que mamãe cortasse todo o peito do peru. Um momento aliás, ela parou, feito fatias um dos lados do peito da ave, não resistindo àquelas leis de economia que sempre a tinham entorpecido numa quase pobreza sem razão.

— Não senhora, corte inteiro! Só eu como tudo isso!

Era mentira. O amor familiar estava por tal forma incandescente em mim, que até era capaz de comer pouco, só-pra que os outros quatro comessem demais. E o diapasão dos outros era o mesmo. Aquele peru comido a sós, redescobria em cada um o que a quotidianidade abafara por completo, amor, paixão de mãe, paixão de filhos. Deus me perdoe mas estou pensando em Jesus... Naquela casa de burgueses bem modestos, estava se realizando um milagre digno do Natal de um Deus. O peito do peru ficou inteiramente reduzido a fatias amplas.

— Eu que sirvo!

"É louco, mesmo" pois por que havia de servir, se sempre mamãe servira naquela casa! Entre risos, os grandes pratos cheios foram passados pra mim e principiei uma distribuição heróica, enquanto mandava meu mano servir a cerveja. Tomei conta logo de um pedaço admirável da "casca", cheio de gordura e pus no prato. E depois vastas fatias brancas. A voz severizada de mamãe cortou o espaço angustiado com que todos aspiravam pela sua parte no peru:

— Se lembre de seus manos, Juca!

Quando que ela havia de imaginar, a pobre! que aquele era o prato dela, da Mãe, da minha amiga maltratada, que sabia da Rose, que sabia meus crimes, a que eu só lembrava de comunicar o que fazia sofrer! O prato ficou sublime.

— Mamãe, este é o da senhora! Não! não passe não!

Foi quando ela não pode mais com tanta comoção e principiou chorando. Minha tia também, logo percebendo que o novo prato sublime seria o dela, entrou no refrão das lágrimas. E minha irmã, que jamais viu lágrima sem abrir a torneirinha também, se esparramou no choro. Então principiei dizendo muitos desaforos pra não chorar também, tinha dezenove anos...Diabo de família besta que via peru e chorava! coisas assim. Todos se esforçavam por sorrir, mas agora é que a alegria se tornara impossível. É que o pranto evocara por associação a imagem indesejável de meu pai morto. Meu pai, com sua figura cinzenta, vinha pra sempre estragar nosso Natal, fiquei danado.

Bom, principiou-se a comer em silêncio, lutuosos, e o peru estava perfeito. A carne mansa, de um tecido muito tênue boiava fagueira entre os sabores das farofas e do presunto, de vez em quando ferida, inquietada e redesejada, pela intervenção mais violenta da ameixa preta e o estorvo petulante dos pedacinhos de noz. Mas papai sentado ali, gigantesco, incompleto, uma censura, uma chaga, uma incapacidade. E o peru, estava tão gostoso, mamãe por fim sabendo que peru era manjar mesmo digno do Jesusinho nascido.

Principiou uma luta baixa entre o peru e o vulto de papai. Imaginei que gabar o peru era fortalecê-lo na luta, e, está claro, eu tomara decididamente o partido do peru. Mas os defuntos têm meios visguentos, muito hipócritas de vencer: nem bem gabei o peru que a imagem de papai cresceu vitoriosa, insuportavelmente obstruidora.

— Só falta seu pai...

Eu nem comia, nem podia mais gostar daquele peru perfeito, tanto que me interessava aquela luta entre os dois mortos. Cheguei a odiar papai. E nem sei que inspiração genial, de repente me tornou hipócrita e político. Naquele instante que hoje me parece decisivo da nossa família, tomei aparentemente o partido de meu pai. Fingi, triste:

— É mesmo... Mas papai, que queria tanto bem a gente, que morreu de tanto trabalhar pra nós, papai lá no céu há de estar contente... (hesitei, mas resolvi não mencionar mais o peru) contente de ver nós todos reunidos em família.

E todos principiaram muito calmos, falando de papai. A imagem dele foi diminuindo, diminuindo e virou uma estrelinha brilhante do céu. Agora todos comiam o peru com sensualidade, porque papai fora muito bom, sempre se sacrificara tanto por nós, fora um santo que "vocês, meus filhos, nunca poderão pagar o que devem a seu pai", um santo. Papai virara santo, uma contemplação agradável, uma inestorvável estrelinha do céu. Não prejudicava mais ninguém, puro objeto de contemplação suave. O único morto ali era o peru, dominador, completamente vitorioso.

Minha mãe, minha tia, nós, todos alagados de felicidade. Ia escrever «felicidade gustativa», mas não era só isso não. Era uma felicidade maiúscula, um amor de todos, um esquecimento de outros parentescos distraidores do grande amor familiar. E foi, sei que foi aquele primeiro peru comido no recesso da família, o início de um amor novo, reacomodado, mais completo, mais rico e inventivo, mais complacente e cuidadoso de si. Nasceu de então uma felicidade familiar pra nós que, não sou exclusivista, alguns a terão assim grande, porém mais intensa que a nossa me é impossível conceber.

Mamãe comeu tanto peru que um momento imaginei, aquilo podia lhe fazer mal. Mas logo pensei: ah, que faça! mesmo que ela morra, mas pelo menos que uma vez na vida coma peru de verdade!

A tamanha falta de egoísmo me transportara o nosso infinito amor... Depois vieram umas uvas leves e uns doces, que lá na minha terra levam o nome de "bem-casados". Mas nem mesmo este nome perigoso se associou à lembrança de meu pai, que o peru já convertera em dignidade, em coisa certa, em culto puro de contemplação.

Levantamos. Eram quase duas horas, todos alegres, bambeados por duas garrafas de cerveja. Todos iam deitar, dormir ou mexer na cama, pouco importa, porque é bom uma insônia feliz. O diabo é que a Rose, católica antes de ser Rose, prometera me esperar com uma champanha. Pra poder sair, menti, falei que ia a uma festa de amigo, beijei mamãe e pisquei pra ela, modo de contar onde é que ia e fazê-la sofrer seu bocado. As outras duas mulheres beijei sem piscar. E agora, Rose!...

Fim.



quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Diário e reflexões - 211216





Já estamos às vésperas de uma das datas mais importantes para o mundo ocidental, o Natal.

Enquanto as pessoas que pertencem à comunidade em que vivemos como cidadão e ser social se preparam para a confraternização dessa data, nós tivemos nesses primeiros 3 dias de trabalho da semana pela Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil um nível de estresse que pode levar um corpo humano a algo grave e sério.

Nossos prezados associados da Cassi, com os quais passei a conviver e respeitar de forma crescente desde o dia que iniciei o mandato como Diretor de Saúde e Rede de Atendimento, não conseguiriam imaginar com facilidade o que são os bastidores diários de um representante eleito numa instituição de gestão compartilhada.

A experiência política com a qual cheguei à gestão da área de saúde da maior autogestão do País me ajudou muito a trabalhar a paciência e a manter o foco no que é prioritário sob o nosso ponto de vista, e sou um dirigente dos trabalhadores que põe toda a capacidade naquilo que assume como causa ou tarefa a desempenhar. 

(...) vou mudar de assunto, só de começar a abordar o tema das dificuldades que enfrentamos internamente no trabalho, já me chateei horrores. Pode ser que eu tenha necessidade de escrever ainda antes do Natal no Blog de trabalho sobre questões que interfiram em nossos projetos e compromissos com os associados e com a Cassi para o ano de 2017. Na política, a gente sempre tenta uma solução negociada até o último minuto. Minha manhã da quinta-feira 22 será assim.

Cheguei a casa no início da noite e saí desesperado para caminhar 60 minutos para ver se conseguia cuidar um pouco do corpo que me carrega. Foi impossível tirar toda a chateação da cabeça por uma hora.

Para desempenhar a tarefa revolucionária pela qual estou lutando na área da saúde, acabei permitindo que o trabalho e a intensidade da dedicação me consumisse fisicamente.

Estou inscrito para mais uma corrida de São Silvestre. Comprei passagens de ida e volta para São Paulo, gastei dinheiro com a inscrição. Tenho um encontro marcado anualmente com esta prova deliciosa de 15 km para fechar o ano civil e percebi que não sei o que fazer, porque não estou preparado para correr. Nunca me senti tão maus fisicamente por causa do que vivo atualmente.

É pensar o que fazer até a semana que vem... em relação a este objetivo pessoal, estou completamente sem rumo...

William

sábado, 17 de dezembro de 2016

Memorial de Aires - o 13 de maio de 1888





Refeição Cultural

"13 de maio

Enfim, lei. Nunca fui, nem o cargo me conscita ser propagandista da abolição, mas confesso que senti grande prazer quando soube da votação final do Senado e da sanção da Regente. Estava na Rua do Ouvidor, onde a agitação era grande e a alegria geral.

Um conhecido meu, homem de imprensa, achando-me ali ofereceu-me lugar no seu carro, que estava na Rua Nova, e ia enfileirar no cortejo organizado para rodear o paço da cidade, e fazer ovação à Regente. Estive quase, quase a aceitar, tal era o meu atordoamento, mas os meus hábitos quietos, os costumes diplomáticos, a própria índole e a idade me retiveram melhor que as rédeas do cocheiro aos cavalos do carro, e recusei. Recusei com pena. Deixei-os ir, a ele e aos outros, que se ajuntaram e partiram da Rua Primeiro de Março. Disseram-me depois que os manifestantes erguiam-se nos carros, que iam abertos, e faziam grandes aclamações, em frente ao paço, onde estavam também todos os ministros. Se eu lá fosse, provavelmente faria o mesmo e ainda agora não me teria entendido... Não, não faria nada; meteria a cara entre os joelhos.

Ainda bem que acabamos com isto. Era tempo. Embora queimemos todas as leis, decretos e avisos, não poderemos acabar com os atos particulares, escrituras e inventários, nem apagar a instituição da história, ou até da poesia. A poesia falará dela, particularmente naqueles versos de Heine, em que o nosso nome está perpétuo. Neles conta o capitão do navio negreiro haver deixado trezentos negros no Rio de Janeiro, onde 'a Casa Gonçalves Pereira' lhe pagou cem ducados por peça. Não importa que o poeta corrompa o nome do comprador e lhe chame Gonçalves Perreiro; foi a rima ou a sua má pronúncia que o levou a isso. Também não temos ducados, mas aí foi o vendedor que trocou na sua língua o dinheiro do comprador" (Conselheiro Aires, Machado de Assis)


REFLEXÕES

Com a leitura do Memorial de Aires (1908), eu ia dizendo na postagem que havia completado a leitura dos nove romances de Machado de Assis, até que numa rápida pesquisa, descobri que há um romance que eu não conhecia e não tenho o volume - Casa Velha -, produzido em folhetim entre 1885/86 e só publicado em 1943, pela estudiosa Lúcia Miguel Pereira. 

A riqueza que encontrei neste gênero da produção machadiana é fenomenal. Estou lendo o Memorial porque estou em humilde produção e revisão semelhante de meus escritos de tantos anos. Abordei isso dias atrás (ler AQUI).

O personagem Conselheiro Aires cita o dia da Abolição da Escravatura como quem viveu o dia e anotou em seu diário suas impressões. Tem uma outra anotação dele, que vou transcrever abaixo, que é importante para os leitores e cidadãos do século 21 refletirem sobre a condição real dos milhões de seres humanos que, de uma hora para outra, saíram da condição de cativeiro, de senzala, para se virarem por conta e risco.

Eu, cidadão de 47 anos de idade, estava vendo e vivenciando mais oportunidades e melhorias de vida no início do século 21, aqui em meu País e na América Latina, para os povos tanto de origem da própria terra invadida quanto os trazidos na condição de escravos, até que os novos modelos de golpes patrocinados e ou organizados nos escritórios dos imperialistas da atualidade passassem a vigorar e destruir rapidamente os avanços conquistados em quase duas décadas de lutas progressistas latino-americanas.

A luta deve seguir. O tempo de nossas vidas não é nada se comparado ao tempo da história de nossas lutas enquanto classe social explorada.

Vamos com mais um trecho do diário de memórias do Conselheiro Aires... Por favor, não esqueçam que o personagem é personagem e, normalmente, Machado foca o locus de sua época: uma sociedade onde impera o homem branco, católico, proprietário, patrimonialista, machista etc etc.


"10 de agosto de 1888

Meu velho Aires, trapalhão da minha alma, como é que tu comemoraste no dia 3 o ministério Ferraz, que é de 10? Hoje é que ele faria anos, meu velho Aires. Vês que é bom ir apontando o que se passa; sem isso não te lembraria nada ou trocarias tudo.

Fidélia chega da Paraíba do Sul no dia 15 ou 16. Parece que os libertos vão ficar tristes; sabendo que ela transfere a fazenda pediram-lhe que não, que a não vendesse, ou que os trouxesse a todos consigo. Eis aí o que é ser formosa e ter o dom de cativar. Desse outro cativeiro não há cartas nem leis que libertem, são vínculos perpétuos e divinos. Tinha graça vê-la chegar à Corte com os libertos atrás de si, e para que, e como sustentá-los? Custou-lhe muito fazer entender aos pobres sujeitos que eles precisam trabalhar, e aqui não teria onde os empregar logo. Prometeu-lhes sim, não os esquecer, e, caso não torne à roça, recomendá-los ao novo dono da propriedade."


Quem diria! E a sociedade humana voltando em seu pêndulo do tempo à mesma condição anterior para os 99% dos seres que habitam o Planeta Terra, enquanto o 1% segue brincando de Tabuleiro de War conosco e com a vida neste único lugar habitável no Universo.

William

Diário e reflexões - 171216



Vendo o amanhecer de mais um dia...
Entre São Luís do Maranhão e Brasília.

Manhã de sábado. Estou em Brasília, capital da colônia brazil (ex país autônomo Brasil).

Viajei durante a madrugada, vindo de nossa última agenda do ano de trabalho de base (o País). Estivemos na quinta e sexta-feira em São Luís do Maranhão cumprindo compromissos da Diretoria de Saúde e Rede de Atendimento da Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, onde exerço mandato eleito pelos associados.

Ao chegar cansado, tomei um banho, olhei a verde paisagem da janela, vi o voo de duas curicacas, dei uma leve percorrida na rede social onde tenho um perfil e acho que vou dormir um pouco.


A natureza deve ser vista por nossos olhos cansados...

Meu ano de trabalho não acabou. Mas vencemos etapas que sem dúvida foram superadas através do trabalho dedicado. A luta para a qual dedico meu tempo, minha saúde e minha vida não vai acabar dia nenhum. Mas fechei ontem um percurso de 10 Conferências de Saúde da Cassi, fechei uma agenda de visita a trabalho a 26 Estados, além do Distrito Federal.

Considerando apenas o blog de prestação de contas do mandato, o Categoria Bancária, fiz mais de 150 postagens neste duro ano de 2016. Fizemos 12 boletins da Diretoria de Saúde para dar informações qualificadas às mais de 200 entidades sindicais e associativas do funcionalismo do BB, além de tentar dar subsídios técnicos e políticos para centenas de Conselheiros de Usuários da Cassi.

Acho que exagerei na exigência a mim mesmo para fazer o que eu entendo que tem que ser feito pela Cassi, pelos associados e pelos funcionários da entidade de saúde. Eu aprendi desde jovem, quando vivia naquele mundo duro que parece estar voltando agora, após o Golpe de Estado, aprendi que a gente vive hoje com o que sobrou das lutas de ontem. Eu estou só o pó, pelas jornadas que exigi de mim mesmo.

No entanto, quando penso nas jornadas de visitas que realizamos nos Estados, na comunidade BB e Cassi, quando penso no trabalho na base social da Cassi que realizamos ontem, sinto que conseguimos contribuir com algo de bom para as pessoas que estiveram conosco nas jornadas, nós compartilhamos conhecimento de classe.

Neste momento, faço uma mescla do sentimento de esgotamento físico e mental que estou com o sentimento de leveza e dever cumprido ao estar fazendo o melhor que podemos para a coletividade que representamos.

É isso, bom sábado a tod@s os meus pares da classe trabalhadora.

William

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

O 13 de dezembro (1968 e 2016)


Apresentação do Blog:


Segue abaixo um bom artigo do professor Flávio Aguiar, da USP. Ele escreve direto da Alemanha, onde reside atualmente.

Eu estou me matando de trabalhar pela causa da Cassi, para não me deixar morrer de tristeza ao ver toda a destruição por que passa nosso País e os direitos do povo brasileiro, com o estado de degeneração avançada que tomou conta da sociedade após o golpe de Estado e após a consubstanciação do ódio contra o PT e a esquerda em geral a partir de estratégias nazistas de comunicação lideradas pelo P.I.G (Partido da Imprensa Golpista - Globo, Folha, Estadão, Editora Abril e asseclas).

Como a ideologia é central na história da humanidade! Como é verdadeira a frase que afirma que "a ideologia dominante é a ideologia da classe dominante". Os meios de manipulação de massa dos donos dos poderes conseguiram derrubar uma presidenta sem crime, colocando o povo na rua, e agora os chefes dos golpistas estão discutindo em seus jantares de milhares de reais o que fazer com a hacienda Brazil nos próximos meses e anos. 

Antes de derrubarem a presidenta eleita com 54,5 milhões de votos, o capital privado e os meios de manipulação de massa foram responsáveis por termos no Congresso Nacional o ajuntamento de parlamentares mais corrupto, fascista, de direita e picareta da história da República do Brasil.

Neste 13 de dezembro está marcada a votação final da PEC DA MORTE, da DESTRUIÇÃO DO SUS, da EDUCAÇÃO PÚBLICA e dos DIREITOS SOCIAIS dos brasileiros, do povo. Está na fila a REFORMA DA PREVIDÊNCIA que destinará os recursos públicos de aposentadoria para uma pequena elite, segmentos privilegiados do status quo dominante.

Na minha visão, não adianta lutar por "DIRETAS, JÁ!" a não ser que seja para eleger todos os deputados e senadores e a Presidência da República, sem dinheiro privado de financiamento. Só dinheiro público para o processo eleitoral. Não quero que nosso País se torne aquele lixo de referência do que não presta (os Estados Unidos).

Se não for "DIRETAS, JÁ!" para todo o Congresso Nacional, o correto é devolver à Presidência da República a Presidenta Dilma Rousseff, ELEITA por 54,5 milhões de votos em 2014.

É necessário que o povo tome para si as instituições do Estado de volta, os 3 poderes.

Mas onde estão os MILHÕES de trabalhadores e o povo que a partir de hoje não terão mais a assistência do Estado para o seu papel constitucional na Saúde, na Educação, na Previdência, na Assistência Social? Vamos morrer de velhos sendo explorados como foi com nossos pares nos séculos 19 e 20 nos países do "primeiro mundo" onde depois das duas guerras mundiais viriam os direitos sociais e o Estado de Bem-Estar Social.

CADÊ O POVO PARA TIRAR ESSA CORJA DE BANDIDOS E CANALHAS INFILTRADOS NOS 3 PODERES DO BRASIL? QUANDO VAMOS TOMAR OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO PÚBLICOS PARA O POVO, TIRANDO ELES DAS MÃOS DOS TIRANOS MANIPULADORES, COM CONCESSÕES REGADAS A ACORDOS ESPÚRIOS DE MANUTENÇÃO DO STATUS QUO (DE GOVERNANTES DITADORES OU DA ELITE EXPLORADORA)?

Sofro... e trabalho focado em minha missão atual...

William


Reprodução de matéria de Flávio Aguiar da Carta Maior.

Os bruxos de 1968 e os aprendizes de feiticeiros de 2016


Flávio Aguiar, Carta Maior - 12/12/16


Assim como o golpe de 64, com seus coveiros de então, além dos outros até 1985, os atuais golpistas e seus golpes irão terminar no lixo da história


O governo de Michel Temer, nascido com o golpe de estado que destituiu a presidenta legítima e legal Dilma Rousseff, tem algo em comum com o governo Costa e Silva, que proclamou o Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro de 1968.

A foto daquele fatídico momento, em que se soterrou o Brasil debaixo de seus seis “Considerandos” e doze artigos mostra um bando de homens de ternos de cor preta, no máximo cinzenta, e fardas militares. Só homens. E de luto, o país inteiro.

Já a famigerada foto da posse do governo Temer igualmente soterra o Brasil na ilegalidade, e se mostra igualmente povoada por homens, só homens, de ternos de cor preta. E de luto também, o país inteiro.

Em ambos os casos, as mesmas gravatas rutilantes.


Há 48 anos o Ato 5 suspendia as garantias constitucionais, colocava o governo acima de Constituição vigente que, datando de 1967, fora outorgada pelo governo oriundo do golpe militar e votada por um Congresso Nacional cuja autonomia fora extirpada pela cassação dos deputados e senadores mais contundentes em oposição ao regime. Muitos analistas veem o Ato 5 como um ”golpe dentro do golpe”. Outros mais à direita o veem como uma “traição” aos ideais da “Revolução de 31 de março 1964”. E ainda há aqueles que, como eu, o veem como um desdobramento algo natural do golpe de 1º de abril de 64, considerando que sempre se sabe onde um golpe de estado começa, mas nunca se sabe onde ele vai parar - a não ser mais tarde, na lata de lixo da História, como aconteceu com o regime de 64. Este soterrou a democracia por 21 anos.

O golpe de estado deste ano de 2016 chega agora a um de seus ápices, que é também um desdobramento de si mesmo. Este é a votação, prevista para a mesma data fatídica e que não deixa de ser “comemorativa” de 13 de dezembro, da PEC 55, que soterra a já soterrada democracia, e rompe o pacto constitucional de 1988, o responsável pela redemocratização do país depois daqueles 21 anos de ditadura e mais três de discussão e votação da nova Carta Magna.

Naquele dezembro de 1968 os coveiros da nação eram duas dezenas de homens imbuídos de seu senso de dever para com o “combate à subversão e às ideologias contrárias às tradições de nosso povo”. Agora neste dezembro de 2016 teremos, como coveiros da nação, depois do doloroso, espalhafatoso e ridículo processo começado por um deputado hoje acuado e acusado de tudo quanto é tipo de corrupção, a partir do pedido formulado por uma trinca de pseudo-juristas que não encontraram crime mas cheios de convicção, algumas centenas de protagonistas e figurantes. 

Além de deputados, senadores, levados ao ridículo na cena internacional, perfilam-se neste autêntico vaudeville orgiástico e espasmódico de desmandos jurídicos de toda espécie, centenas de parlamentares, dezenas e dezenas, talvez centenas de juízes, promotores, policiais federais, além de milhares de alucinados desfilando camisetas de uma entidade com dirigentes acusados internacionalmente de corrupção como se fosse a paladina da luta anti-corrupção. 

Bom, os coveiros de 68 e de 64 também invocavam a luta contra a corrupção entre os seus motivos, enquanto corrompiam a saúde democrática da nação. Agora, desta vez, temos, entre os paladinos que depuseram uma presidenta honesta, além do corifeu do processo do impeachment, centenas de parlamentares - mais os membros do atual governo, inclusive o atual presidente - acusados igualmente de toda a sorte de corrupção.

Diz o principal teórico da jurisprudência nazista na Alemanha, Carl Schmitt, que o mundo jurídico deriva da teologia. E que, portanto, o líder da instauração de um “Estado de Exceção” (“Ausnahmezustand”, palavra de triste memória, em alemão) deve comportar-se como Deus, que criou o mundo e ao mesmo tempo as leis que o regem.

Aqueles coveiros de 64 e de 68, passando pela outorga da Constituição de 1967, que incorporava a seu texto os Atos Institucionais anteriores visando dar um verniz legal à ruptura da ordem legal e à repressão subsequente, assim se comportaram: como deuses que criavam um “novo” mundo e suas leis - muitas delas não expressas à luz do dia, uma vez que vividas nas sinistras masmorras da tortura, assassinatos e “desaparecimentos”, além da repressão aberta e da tortura. Eram os bruxos daquela noite de trevas que se abatera e voltava a se abater sobre o país, congelando-o ao longo de 21 anos.

Agora vemos um amontoado - dezenas, centenas, talvez milhares - de “pequenos deuses”, aprendizes de feitiçaria barata, todos querendo legislar furiosamente, criando pequenos mundos e pequenas leis em causa própria (um deles defendendo bravamente a ilegalidade que queria legalizar de um apartamento que comprou…). Mas que se aprestam igualmente a congelar o país durante vinte anos, pelo menos, negando-lhe os direitos constitucionais à saúde, educação e bem-estar, além da tranquilidade do ponto de vista legal.

É verdade que são golpes diferentes no estilo: no tradicional, militar, os tanques vão à frente, liderando a tropa de ocupação das ratazanas que vem atrás, mas de certo modo, disciplinando-a e impondo um certo decoro destinado a manter as aparências. No golpe parlamentar não há aquela vanguarda explícita: a rataria sobe ao convés e logo se instala uma disputa feroz pelos despojos da arca em disputa, com todos se mordendo e se agadanhando na disputa do botim.

De tudo isto, uma coisa é certa: logo virá, já estando em gestação, uma série de “golpes dentro do golpe”, desdobramento inevitável do passo inicial de ruptura da ordem democrática.

Outra coisa também é certa: assim como o golpe de 64, com seus coveiros de então, de 67 e de 68, além dos outros até 1985, os atuais golpistas e seus golpes irão terminar no lixo da história.


Fonte: Carta Maior

domingo, 11 de dezembro de 2016

Diário e reflexões - 111216



Por do Sol em Fortaleza, na quinta-feira 8.
Anoitecer em Fortaleza, na quinta-feira 8.
Noite de luar em Fortaleza, na quinta-feira 8.

Hoje é domingo, dia ensolarado em Fortaleza, onde me encontro após agenda de trabalho na quinta, sexta e sábado junto aos bancários e comunidade Cassi.

Estou em um hotel em frente ao mar e não atravessei sequer a rua nestes três dias passados. No sábado, quando acabou minha agenda de trabalho, só quis dormir. Tem sido assim minha vida de trabalho. Chego em belos pontos turísticos de cidades brasileiras, trabalho e vou embora.

Vou correr ou caminhar hoje na praia (vai depender de meu corpo exaurido), mas quando reflito sobre a tradicional Corrida de São Silvestre, para a qual estou inscrito e se realizará daqui a vinte dias, vejo o que fiz com a minha saúde no último período de trabalho em minha vida.

Para cumprir uma missão radicalmente difícil em meu mandato de gestão na Cassi, em nome dos associados e entidades do funcionalismo que me apoiaram, não medi esforços para fazer as coisas do jeito que entendo que elas devem ser feitas. Mas abusei demais de minha saúde e condição de vida. É um fato que sinto bastante agora em meu corpo.

Eu acabei assumindo uma missão num dos períodos mais complexos e difíceis de nosso País, da vida política e social, e também do setor de saúde onde está inserida a entidade de autogestão que administramos. Por sinal, a própria Caixa de Assistência que encontrei ao chegar para gerir passa por um de seus maiores desafios em encontrar o equilíbrio e a sustentabilidade no plano de saúde dos funcionários, sem perda de direitos.

Enfim, vamos aproveitar o domingo em Fortaleza para descansar um pouco, porque as semanas que ainda faltam para acabar o ano de trabalho serão intensas, por incrível que pareça. Quero cumprir até o fim do ano o que planejei para 2016 no mandato e para a nossa área de gestão na Cassi.

William

domingo, 4 de dezembro de 2016

Diário e reflexões - 041216



Lendo minha maior referência, o escritor do Cosme Velho...

Refeição Cultural - Memorial

Domingo. Meu corpo não quer sair para correr. Estou quebrado, corpo pedrado. Se eu insistir na tentativa do exercício físico sem ouvir meu corpo, posso lesionar e não correr a São Silvestre daqui a algumas semanas. Que dilema!

Acho que estou me matando de trabalhar pela causa para a qual me destacaram no ano de 2014: me colocar à disposição do processo eleitoral da Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, ser eleito e dedicar toda a minha experiência e energia para a causa da saúde, da autogestão em saúde e para a defesa dos direitos dos associados da Cassi. Estou fazendo isso, mas a um custo pessoal e familiar altíssimo.

Finalizei mais uma semana de trabalho com jornadas de dedicação que me absorvem os turnos da manhã, tarde e noite. E mais, tem sido assim desde o início do processo eleitoral e após a posse para o mandato. Decidi conjugar a luta interna da gestão com a manutenção do trabalho nas bases sociais da Cassi: o País.

Como atuei em diversas áreas durante nossos mandatos em nome dos trabalhadores, pois estivemos envolvidos com organização do movimento, gestão de estruturas, coordenação de negociações, comunicação, formação e história, decidimos fazer um mandato na Cassi aproveitando esses conhecimentos que adquirimos ao longo de nossa história de representação.

Percebemos em nosso mandato na Cassi um enorme desconhecimento de todos sobre o que é esta entidade de saúde de autogestão, como ela deve funcionar para oferecer Atenção Integral à Saúde com base em atenção primária, e o que é necessário para que ela funcione bem no cumprimento de sua missão. O desconhecimento é geral, abrange todos os segmentos de associados e de suas entidades representativas, bem como o próprio patrocinador patrão e seus representantes institucionais.

Ao fazer a análise desse cenário de desconhecimento da entidade por parte de seu público alvo, decidimos incluir no nosso planejamento estratégico do mandato o trabalho focado de levar informações qualificadas sobre a Cassi às representações dos associados e do patrocinador Banco do Brasil. Juro que estamos seguindo fielmente esse objetivo desde 2014.

Estou revisitando nosso percurso nesse período de 2014, 2015 e 2016. Como tenho mania e gosto por história, hábito que levei para o movimento sindical desde 2002, quando fui eleito diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região, acabei me dedicando à Cassi com o mesmo gosto pela história da instituição.

Eu me lembrei semanas atrás, quando comecei a reler as anotações e percurso no mandato de representação na Cassi, dos dois últimos livros de Machado de Assis, lançados já na última fase de sua vida: um lançado em 1904 (Esaú e Jacó) e outro lançado no ano de seu falecimento, 1908, Memorial de Aires.

Eu já estava revendo mês a mês a minha atuação no mandato da Cassi quando decidi pegar para ler o último romance de Machado, que por sinal eu não havia lido ainda. Até o momento, está muito interessante a leitura do Memorial de Aires. O legal é que é muito semelhante ao formato de meus diários e reflexões, que faço há anos. A menor parte de minhas reflexões é a que escrevo nos blogs. 

Enfim, eu acho importante que haja registros da história de lutas da classe trabalhadora, de suas instituições, de suas derrotas e vitórias. O Brasil está passando por uma de suas piores fases políticas em décadas, num movimento pendular clássico, logo após um outro momento de maior ascensão da classe trabalhadora com os governos do Partido dos Trabalhadores.

Chega, porque o texto já superou a capacidade de paciência dos humanos em tempos de pouca análise e reflexão.

William

sábado, 3 de dezembro de 2016

Brasil, uma província do império americano?!


Apresentação do blog:


Olá leitores amig@s, recomendo a leitura deste excelente artigo do diplomata brasileiro Samuel Guimarães a respeito do processo de desfazimento do país que vínhamos construindo a partir de 2003. É uma aula de história, política, economia e explicação sobre disputas de hegemonia no Planeta. As lideranças da classe trabalhadora precisam compreender o que está se passando para deixarem as disputas internas e vaidades de lado e construírem unidade de classe para salvar o Brasil e os brasileiros.

Se gostarem, compartilhem com seus pares.

Abraços, William


(artigo de 02/12/16 da RBA, com fotomontagem do Vi o Mundo)




A contrarreforma de Temer e das classes hegemônicas

Conspiração dos conservadores busca dominar o poder político, e as eleições de 2018 agora são um de seus objetivos para consolidar o país como “província” agroindustrial do império norte-americano


1. De 1500 a 2003, as classes hegemônicas brasileiras, estreitamente vinculadas às classes hegemônicas das metrópoles coloniais, hoje às classes hegemônicas dos Estados Unidos, organizaram a economia, a sociedade, o sistema político e o Estado brasileiros de acordo com seus interesses e em seu benefício.


2. A extrema concentração de riqueza e de renda, a situação de pobreza de grande parte da população, as condições de saúde, alimentação, saneamento, educação, transporte, segurança e cultura da enorme maioria demonstram cabalmente que a organização da sociedade feita pelas classes hegemônicas não beneficiou e não beneficia a esmagadora maioria do povo brasileiro.


3. Em 2003, com a vitória, de forma democrática e legítima, do Partido dos Trabalhadores e de seu candidato, Luiz Inácio Lula da Silva, torneiro mecânico e líder sindical, essas classes hegemônicas perderam parte, apenas parte, do controle que exerciam sobre a sociedade, a economia e o Estado brasileiros.


4. O Presidente Lula desenvolveu programas sociais de grande alcance e impacto; criou melhores condições de competitividade para as empresas de capital nacional; ampliou o sistema educacional em termos de número de estudantes e de condições de acesso; ampliou o sistema de saúde por meio do SUS, da Farmácia Popular e outros programas; expandiu as exportações; fortaleceu a agroindústria e a agricultura familiar; manteve sob controle a inflação; ampliou o crédito de forma notável; fortaleceu os programas estratégicos das Forças Armadas; reduziu a vulnerabilidade do país ampliando as reservas monetárias; fez uma política externa altiva e ativa, expandindo as relações políticas e econômicas com todos os Estados, desenvolvidos e subdesenvolvidos, e promoveu a integração sul-americana.


5. O Presidente Lula terminou seu segundo mandato em 2010, com 87% de aprovação popular e elegeu sua sucessora, Dilma Rousseff.


6. Desde então se iniciou uma conspiração das classes hegemônicas com o objetivo de recuperar totalmente, em 2014 ou em 2018, o Poder político e econômico.


7. Desta conspiração participaram políticos envolvidos em denúncias de corrupção; os partidos de oposição, inconformados com a derrota em 2014; políticos conservadores; o próprio vice-presidente Michel Temer; os meios de comunicação, em especial o sistema Globo, com suas dezenas de estações de televisão, de rádios, jornais e revistas; o Poder Judiciário, desde o Juiz Sergio Moro, disposto a praticar atos ilegais de toda ordem, aos Ministros do Supremo que, podendo e devendo, não o disciplinaram; os interesses estrangeiros que viram, nas dificuldades econômicas e políticas, a oportunidade de reverter políticas de defesa das empresas nacionais para promover a redução do Estado e a abertura aos bens e capitais estrangeiros, inclusive para explorar seu maior patrimônio natural que é o petróleo do pré-sal; do mercado financeiro, isto é, dos grandes investidores, milionários e rentistas, temerosos de uma política de redução de taxas de juros; das associações de empresários como Fiesp, Febraban, CNI, CNA; dos defensores de políticas de austeridade que visam ao equilíbrio fiscal pela redução do Estado, dos programas sociais, dos investimentos do Estado, dos direitos trabalhistas e previdenciários e, finalmente, de economistas e jornalistas, intérpretes, porta-vozes e beneficiários desses interesses.


8. A partir de 2010, e em especial a partir de 2014, a estratégia das classes hegemônicas para recuperar o poder se desenvolveu em várias etapas:

• fazer o governo adotar o programa econômico e social do “mercado”, isto é, da minoria multimilionária e de seus associados externos;

• ocupar os cargos de direção da administração pública (Ministérios, Secretarias Executivas, agências reguladoras) com representantes do “mercado”;

• enfraquecer política e economicamente o governo;

• enfraquecer o PT e os partidos progressistas com vistas às eleições de 2018;

• aprovar leis de interesse do “mercado”;

• e, se nada disso ocorrer, fazer o governo “sangrar” e aí, então, se necessário e possível, exigir e promover o impeachment da presidente.


9. Entre a classe política, 367 deputados e 61 senadores, muitos deles acusados de corrupção, representantes dos setores mais conservadores, dos indivíduos (e empresas) mais ricos em uma das sociedades mais desiguais do mundo e dos interesses estrangeiros mais vorazes, anularam o resultado de eleições em que 54 milhões de brasileiros escolheram a presidente Dilma Rousseff e, assim, interromperam a execução de um projeto de desenvolvimento social, econômico e político do Brasil que se iniciara em 2003.


10. Derrubado o governo Dilma, de forma jurídico-processual e com a conivência do Judiciário, se inicia a grande reforma econômica e política de Temer, em realidade uma contrarreforma, com inspiração e amplo apoio das classes hegemônicas e de seus aliados no Poder Judiciário, no Legislativo, no Ministério Público e na Polícia Federal.


11. A contrarreforma econômica conservadora de Temer, como representante e executivo das classes hegemônicas brasileiras, em estreita sintonia com as classes hegemônicas dos países desenvolvidos, em especial dos Estados Unidos, significa a adoção definitiva das políticas preconizadas pelo Consenso de Washington:

• abrir a economia do ponto de vista comercial e financeiro, unilateralmente e sem contrapartida;

• privatizar (desnacionalizar) as empresas estatais;

• desregulamentar (ou regulamentar de forma favorável ao capital) as atividades econômicas;

• manter uma política tributária favorável (regressiva) ao capital nacional e estrangeiro;

• desestimular o desenvolvimento industrial e desarticular as empresas nacionais de maior porte, estatais ou privadas, a começar pela Petrobras;

• reduzir o Estado ao mínimo e aniquilar sua capacidade de regulamentar a atividade econômica e de proteger os trabalhadores e os excluídos;

• “flexibilizar”, “modernizar”, o mercado de trabalho em favor do capital;

• consagrar essas políticas na legislação, de preferência constitucional.


12. Os principais instrumentos para a execução dessas políticas são:

• PEC 241, que se tornou PEC 55 no Senado e congela, durante vinte anos, de forma absolutamente antissocial, antidemocrática e inconstitucional, as despesas primárias do Estado e libera totalmente as despesas financeiras, isto é, o pagamento dos juros e da amortização da dívida pública;

• a reforma da Previdência e sua privatização;

• a revisão da legislação trabalhista em benefício do capital, isto é, das empresas;

• a desvinculação geral de despesas do Estado em relação ao salário mínimo;

• a utilização do BNDES para financiar as privatizações e a restrição de crédito para a empresa brasileira.


13. Este programa econômico, de extraordinária amplitude e profundidade, vem sendo executado:

• sem mandato popular;

• com a conivência do Judiciário;

• com a conivência da maioria do Legislativo, em parte devido à sua convicção conservadora, em parte corrupto e em parte “aliciado” pelo governo Temer.


14. Este programa conservador e ultraneoliberal, que dá continuidade ao programa iniciado pelos governos Fernando Collor e depois Fernando Henrique, que fracassaram, será consagrado, eventualmente, por acordos de livre comércio com as Grandes Potências industrializadas, a começar com a União Europeia, a que se seguirão acordos com os Estados Unidos e o Japão, e também com a China.


15. Com a execução dos programas da contrarreforma de Temer e com sua consolidação internacional por meio de eventuais acordos de “livre comércio”, o Brasil se consagraria definitivamente como o “celeiro do mundo” e uma “província” agroindustrial do império norte-americano e das filiais de megaempresas multinacionais instaladas no Brasil para exploração de seu mercado interno e do mercado regional.


16. Resta às classes hegemônicas um obstáculo importante a vencer para garantir que este conjunto de políticas econômicas e sociais não venha a ser derrotado e derrubado pela vontade popular.


17. Este obstáculo seria a possibilidade de eventual vitória nas eleições presidenciais de 2018 de um candidato progressista, nacionalista e independente.


18. Assim, pretendem Temer, seus mestres e seus acólitos:

• acelerar a aprovação de seus projetos econômicos e sociais no Legislativo;

• desmoralizar e fragmentar os partidos de esquerda;

• demonizar e desmoralizar os líderes de esquerda;

• despolitizar a população;

• criminalizar os movimentos sociais;

• conter a insatisfação popular por meio de métodos de violenta repressão policial e eventualmente adotar o voto facultativo, o parlamentarismo e o voto distrital.


19. Existe apenas um candidato viável das forças progressistas a Presidente da República, que é Luiz Inácio Lula da Silva.


20. Esta é a razão do ataque quotidiano e incessante dos órgãos da grande mídia a Lula, com a orquestração cuidadosa dos vazamentos de delações não comprovadas, e das ações espetaculosas da polícia, permitidas e promovidas pelo juiz Sergio Moro e pelos procuradores do Ministério Público de Curitiba, com a conivência do STF em conjunto e de cada um de seus ministros.


Samuel Guimarães: A contrarreforma de Temer visa tornar o Brasil uma “província” agroindustrial do império norte-americano e das multinacionais


21. Somente a união das forças progressistas, nacionalistas e de esquerda da sociedade brasileira; dos líderes sindicais e dos movimentos sociais; dos estudantes e suas organizações; dos intelectuais, dos cientistas, dos professores, dos médicos; dos militares nacionalistas e progressistas; dos artistas e dos empresários nacionais, em defesa do Presidente Lula, da democracia e de um programa de desenvolvimento econômico, social e político do Brasil poderá fazer com que a sociedade brasileira, a principal interessada e vítima desta conspiração das classes hegemônicas, de seus associados estrangeiros e de seus representantes, seja ouvida e que este processo seja barrado no Congresso Nacional e no Judiciário.


Samuel Pinheiro Guimarães é diplomata brasileiro e mestre em Economia pela Universidade de Boston