Osasco, 31 de março. Quinta. 2022. 12h20.
E nesse instante? Que sinto, que penso, que postura ter frente à vida?
Sinto um cansaço imenso, talvez cansaço da vida, por não ter ilusões em relação à sociedade humana. Penso que nunca haverá paz e fraternidade humana, não é da nossa característica histórica. Perante a vida, não vejo outra alternativa ética além da postura de me esforçar para viver de forma satisfatória em relação a mim mesmo e às pessoas que de alguma forma se relacionam comigo ou dependem de mim.
Em relação à postura perante a vida do ponto de vista do cidadão que sou já que existo num determinado tempo e lugar, devo continuar tentando encontrar uma forma de contribuir para melhorar a sociedade humana. O período de minha existência no qual eu efetivamente contribuí para construir um mundo melhor para todos foi durante o tempo em que fui dirigente eleito da classe trabalhadora. Essa contribuição ao mundo acho que não vai se repetir, isso foi uma oportunidade que a vida me apresentou, não fui eu que corri atrás disso.
No entanto, minha ética me cobra o tempo inteiro que eu faça algo de útil para a coletividade. Não encontrei o que fazer ainda desde que deixei de atuar na militância sindical. Não é suficiente num mundo tão miserável apenas não fazer o mal a ninguém. Isso é uma espécie de canalhice pequeno burguesa. Zilhões de isentões vivem dessas manobras psicológicas e rezas etc. Viver assim nos últimos anos tem me matado. Mas sou um pusilânime, acho que sempre fui. Sempre fui movido a projetos nos quais caí de paraquedas. E ao me pegar neles, fui bom no que fiz.
Nesse instante, me sinto um inútil para a sociedade humana. Só sou útil às relações próximas. Isso é pouco demais para viver ocupando um espaço tão disputado entre os donos do mundo e os miseráveis do mundo.
William (12h56)
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Osasco, 24 de março. Quinta-feira. 2022. 1h35 da madrugada.
Nesse instante, imagens e eventos diversos circulam por meu cérebro na forma de energia elétrica, impulsos químicos vão e vêm através das sinapses de meus 86 bilhões de neurônios. Eu sou esse amontoado de neurônios, células, microrganismos diversos, átomos, poeira, bactérias, elementos químicos da natureza. Sou tudo e sou nada. Sou o Universo, o Universo está em mim; estou no Universo, integrado em um corpo vivo chamado William. Um ser vivo com zilhões de seres vivos dentro de mim. Só sobrevivo por causa da interação que realizo com os elementos da natureza e seres vivos fora de mim.
O Alckmin agora é socialista. O socialismo é antagônico ao capitalismo. O Alckmin agora defende o fim da propriedade privada... a propriedade coletiva dos meios de produção... o fim da exploração de um monte de humanos por alguns humanos. O Alckmin é socialista para ser candidato a vice na chapa com Lula, o metalúrgico nordestino do Partido dos Trabalhadores, maior liderança política desse país e símbolo de esperança. Se Alckmin não defende as bandeiras do socialismo, isso tudo não passa de mais uma mentira do mundo da política...
Ao vencer uma partida de xadrez jogando com uma máquina, tive a certeza de que aquilo para mim é uma perda de tempo. Jogar xadrez não é uma atividade que me acrescente algo. De verdade! Nada contra quem é apaixonado por xadrez. Pelo contrário, admiro os enxadristas. Mas aquilo não é para mim. Fiquei pensando na diferença entre mim e aquela coisa. Eu gastava um tempão para avaliar o resultado da mexida de cada pedra no tabuleiro. No segundo em que eu jogava, a máquina me devolvia a vez numa mexida rapidíssima. Ela não pensa. Eu olho pra frente, ela olha pra trás. Não existe "inteligência artificial" como nos explica o neurocientista Miguel Nicolelis. Ela é programada com zilhões de movimentos e contramovimentos. Mesmo se fosse um humano jogando do outro lado, aquele jogo não mudaria nada na minha vida, nem mudaria o mundo, na minha opinião.
Estive no velório de dona Marlene, uma vizinha nossa do condomínio. Ela faleceu entre o domingo e a terça-feira e só foi encontrada no final da tarde de ontem porque as pessoas próximas a ela a procuraram. Ela morava sozinha e tinha quase 70 anos. Muito triste. Fiquei muito pensativo com o falecimento dela. Nos cumprimentamos dias atrás. Era uma senhora muito gente boa, muito simpática. Soube do velório em cima da hora e a cerimônia duraria somente uma hora. Troquei de roupa e fui até lá prestar minha homenagem a dona Marlene. A vida é um instante. Somos muito sensíveis, muito sensíveis.
William (2h14)
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Osasco, 12 de março. Sábado. 2022. 22h22.
Por vários instantes do dia e também de outros dias atrás, pensei numa coisa. Nessas décadas de existência, a parte mais... que palavra usaria para definir a coisa... a parte mais satisfatória de minha vida foi aquela na qual estive envolvido com as causas coletivas.
Nesse instante, próximo de completar 53 anos, sigo na mesma de quase a vida toda: não estou nem triste, nem feliz. Não sou nem triste, nem feliz. Décadas depois de ir vivendo e sobrevivendo, um ser humano pode ser que acabe olhando para trás e se pegue avaliando a vida que teve. Acho que ando nessa fase.
Tive basicamente 2/5 de minha vida vivida em função absoluta das causas coletivas, me anulei pessoalmente para priorizar as causas nas quais me peguei envolvido e na maior parte do tempo como responsável por elas. Então 3/5 de minha vida vivi mais ou menos por mim mesmo. A primeira década como criança. Me lembro de forma saudosa dessa primeira infância.
Por mim mesmo, quis dizer em função de camelar para os outros para receber uns trocados para viver; nesse sentido, vivi como os capitalistas nos consideram, como um cavalo, um burro de carga. Não vivi pra mim. Foi a fase de alimentar meu ódio a um monte de coisas. Aos ricos, por exemplo.
Por mim, porque foi foda atravessar a vida trabalhando nuns trabalhos de merda, sendo explorado, sendo egoísta e só pensando em mim como um bruto maltratado que vê no maltratar a forma de se vingar da vida de merda da classe oprimida pelos ricos.
Engraçado como a vida é uma jornada e não um destino, como diz um refrão de uma música do Aerosmith. O viver é o que importa e não o destino final, um suposto objetivo final. Tudo que talvez eu tenha imaginado ser, não fui. E acabei sendo algumas coisas que jamais imaginei ou quis ser. E passamos a vida assim.
Vivi amores. Vivi amizades. Vivi momentos incríveis. Vivi dores intensas, de morte. Neste momento em que escrevo, lembro instantes vividos a cada música que toca nos meus fones. Quase todos os momentos marcantes vivi entrando num vagão sem destino certo e vivendo aquela viagem enquanto o trem andou.
Chorei inumeráveis vezes de raiva, de impotência, de tristeza. Chorei algumas vezes por estar vivendo momentos de felicidade indescritível. Chorei com lágrimas. Chorei com olhos secos. Mas esses 3/5 de vida vivida por mim, talvez pra mim algumas vezes, não foram instantes do viver com efeitos positivos para a coletividade, sequer para as pessoas ao meu redor. Nossa... como fiz gente chorar! Isso me dói até hoje. Só encontrei consolo nas palavras do professor Antonio Candido, que ensinou que:
"O que somos é feito do que fomos, de modo que convém aceitar com serenidade o peso negativo das etapas vencidas" (CANDIDO, Formação da Literatura Brasileira)
Os 2/3 que vivi para as causas coletivas parecem completamente diferentes dos instantes particulares de meu viver. E essa vida "útil" que tive... não gosto dessa palavra "útil", mas foi a que me veio para descrever minha vida envolvida nas causas coletivas... essa vida das causas coletivas começou de forma involuntária da mesma forma de tudo que eu não planejei e rolou. Por acaso. Foi por acaso como os amores, as amizades, os momentos incríveis.
Enfim, instantes vividos. (ao fuçar nas papeladas de nossa história sindical e nos momentos registrados no blog sindical vi que fiz algo importante em minha vida. Bem mais importante do que as coisas que fiz no meu entorno particular)
William (23h27)
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Osasco, 9 de março. Quarta-feira. Noite quente de verão. 2022. 23h29.
Instantes. Impressões. A cada dia, a cada instante, fica mais difícil olhar mídias que trazem informações, verdadeiras ou falsas, sobre qualquer coisa. Não há boas notícias para a Terra, para a classe trabalhadora, para a natureza. As máquinas e meios de desinformação e mentiras dominaram a sociedade humana. Perdeu-se a referência em tudo. A sociedade humana não pode continuar assim; não vamos longe assim.
Em que momento nos perdemos? Não há resposta para uma pergunta mal formulada como essa. Mesmo assim, olhando friamente, não me parece que o amanhã nos trará coisas boas. E fico pensando nos jovens, nas crianças, nas pessoas que têm a vida pela frente.
É grande o sentimento de impotência que acaba por se impor em muita gente, inclusive em nós que fomos linha de frente ao organizar as massas da classe trabalhadora contra os donos do mundo, os humanos que pertencem ao grupo que alguns de nós chamam de o pessoal do 1%.
No início do ano passado, 2021, morreram mais brasileiros que as médias de anos anteriores, de Covid-19 e de outras mortes, mortes severinas. Consequências do colapso no sistema de saúde e da estratégia do regime genocida de deixar os brasileiros morrerem. As mortes são em sua imensa maioria de gente pobre, preta, mestiça, "frágil" ou adoentada, das classes "inferiores". Morrer gente da casa-grande, do tal 1% e seus capitães do mato modernos, uns 4 a 5% da elite (do atraso), é uma raridade, raridade!
Neste momento, os governos estaduais se somam ao desejo do regime genocida e decidem por liberar o uso de máscaras e flexibilizar restrições criadas por causa da transmissão do vírus da pandemia. Notem que seguem morrendo centenas de pessoas por dia. Centenas! O professor e cientista Miguel Nicolelis informa que as mortes em geral no Brasil nos meses de janeiro e fevereiro de 2022 já são iguais às desses meses em 2021, período que antecedeu o pior momento de 2021 (março e abril)... Ou seja, o que justifica a canetada dizendo que a pandemia acabou?
Fora esse apoio ao vírus Sars-Cov-2, temos a guerra na Ucrânia, guerra entre os Estados Unidos e a Rússia. É o jogo no Tabuleiro de War em disputa pelas potências nucleares e econômicas, e pessoa física é nada nesse jogo. Nada! Só importam as pessoas jurídicas.
E no Brasil temos o presidente genocida crescendo nas pesquisas eleitorais. O meu lado da classe, a parte militante, acha que Lula pode ser presidente no ano que vem. Eu não acredito que isso vá acontecer. Infelizmente! Nada vai mudar sem guerra. Que pena! E se tiver guerra, nós dos 99% ou 95% vamos nos foder. Nem armados estamos. Que foda!
Chega!
William (00h00, mais um dia começa... pra mim é fácil, se for comparar aos meus pares da classe trabalhadora, não tenho falta de nada, sou um privilegiado. Essa é a verdade!)
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Osasco, 7 de março. Segunda-feira. Calor da porra! 2022. 11h54.
Instantes quentes. Estava pensando no quanto aumentou o risco de morte das pessoas nos últimos anos. Mortes severinas, mortes matadas e mortes morridas. Mortes evitáveis.
Pessoalmente, não tenho problema em morrer. No instante seguinte da morte não terei mais sensação alguma, não serei nada, não existirei em lugar algum inventado pela mente humana. Tenho clareza disso, fui ganhando a noção clara da realidade existencial com a vivência. Querer que se lembrem da gente, por exemplo, tem relação com a vaidade, uma abstração humana.
Porém, a morte tem um efeito social porque não somos sozinhos no mundo, mesmo aquelas pessoas que estão sozinhas não são tão sós que sua morte não vá causar efeitos sociais. Até nosso corpo está aqui no mundo e o mundo vai ter que lidar com nosso corpo morto. Nossa morte altera de forma permanente a condição das pessoas que estão em nosso meio. Altera.
Quando penso na realidade da morte, tenho umas preocupações, uns lamentos. Se eu deixar de existir, algumas pessoas sentirão minha ausência porque temos relações marcadas por sentimentos humanos ancestrais como amor, carinho, amizade. Essas dores que as pessoas sentirão, essa ausência, essa saudade, nos comove, nos dá uma sensação de lamento.
Todo ser humano precisa de outros seres humanos, somos seres sociais, e temos relação de dependência com outras pessoas. Se eu deixar de existir, talvez algumas pessoas tenham dificuldades para encontrar uma forma de manutenção da condição de existência que a vida nos permitiu até aqui. Isso preocupa muito a qualquer um de nós humanos. Nos causa dor em vida a preocupação com a continuidade da vida das pessoas de nossas relações.
Por causa dessas preocupações com as pessoas de nossas relações é que nos preocupamos com a realidade que aumentou tanto as possibilidades de nossas mortes.
Se ficar vivo mais um tempão, décadas por exemplo, eu arranjaria o que fazer tranquilamente. Ler e escrever seria uma possibilidade. Morrendo por esses tempos, altero vidas queridas.
Não acho que sou eu que estou com mania de pensar nessa realidade humana, a morte. É a realidade material do mundo capitalista em crise que nos faz pensar nas possibilidades da morte nos pegar e alterar drasticamente a vida e a realidade de diversas pessoas das relações dos mortos.
Pensem nos riscos de morte dos ucranianos neste momento de guerra em seu território entre os Estados Unidos e a Rússia. Pensem nas outras regiões em guerra neste momento, as guerras na África que a mídia comercial não fala porque não interessa.
Pensem na guerra no Brasil após o golpe de 2016. 100.000.000 de pessoas aqui não sabem se vão comer hoje ou amanhã. As pessoas estão morrendo de fome, de doenças evitáveis. E o 1% da casa-grande daqui e de outros países não liga a mínima pra isso.
Vocês já pararam pra refletir o quanto estamos sendo envenenados após os brasileiros e as agências americanas terem colocado o crime organizado nas instituições de poder do Brasil após 2016? Estamos envenenados de todas as formas. Só os venenos que passaram a compor tudo o que comemos... o agro é veneno! Eu sei que ao comer uma fruta, um legume, os cereais, as bebidas prontas, estou sendo envenenado... mas essas mortes por veneno não são classificadas como mortes matadas. São mortes morridas, mortes severinas (morreu de câncer, coitado...).
A maior parte de nós morre e morrerá de morte evitável. Morte severina!
Chega por hoje.
William (12h35)
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Osasco, 1º de março. Terça-feira. Feriado de Carnaval. 2022. 17h16
O instante é de muito calor. Mais de 30º. Ontem, encontrei alguns amigos dos tempos de movimento sindical. Refletimos sobre diversos temas como usávamos fazer antes. Quando fui me despedir de um dos amigos, ele me fez aquela tradicional pergunta a respeito do que a pessoa anda fazendo. Os temas da conversa foram tão variados que não havíamos falado sobre isso no bate-papo. Lendo e escrevendo em meus blogs, foi o que disse. Falei também que estava escrevendo uma espécie de "memórias" sobre os tempos de militância no movimento sindical bancário. O amigo me perguntou por que estava escrevendo sobre aquilo. Meio sem entender o motivo da pergunta, respondi que escrevia memórias porque aquilo fez parte da minha vida. "Aquilo" seria algo como a participação na luta do movimento sindical brasileiro. Fiquei pensando o porquê da pergunta. Avalio que a pergunta poderia ser uma espécie de preocupação do amigo por ele ter consideração por mim. Ele sabe de vários perrengues que passei durante os mandatos de representação eletiva. Vivemos juntos alguns momentos difíceis, de rachas no movimento e esgarçamento no tecido sindical bancário.
Tem um episódio da antiga série Arquivo X que me marcou bastante na época que o vi. O episódio (7º da 9ª temporada: Amnesia) começou com um dos agentes da série, Dogget, meio dopado dentro de um galpão numa cidade desconhecida, no México, se não me engano. Ele não tinha a menor ideia de como foi parar lá. Na trama do episódio, uma espécie de curandeiro ou feiticeiro apagou as memórias do agente. Quando Dogget se vê cara a cara com o curandeiro exigindo que ele devolvesse sua memória, o curandeiro é perverso com o agente e começa a lhe devolver justamente as lembranças amargas da morte de seu filho, um garoto ainda. O episódio é muito forte, mexe com o telespectador. A trama se desenvolve e, no final, Dogget diz ao curandeiro que ele não tinha direito de lhe tirar a memória... porque por mais dura e triste que fosse a lembrança da morte e perda de seu filho, era a memória dele e ninguém tinha o direito de lhe tirar aquilo, era a vida dele... Forte isso!
William (17h44)
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Osasco, 26 de fevereiro. Sábado de Carnaval sem Carnaval. 2022. 13h57
Acordei depois das onze horas da manhã. Havia ido dormir depois das quatro horas da manhã. Estava sonhando com algo estranho, que incomodava. Eu não me lembro bem de sonhos. Na verdade, pelo conteúdo incômodo, é como se fosse um bad dream, um pesadelo. Alguns capas (pessoas de poder) da corrente política na qual militei a vida toda insinuavam que eu estava afastado da base (que horror!). Passei a vida toda de representação eletiva muito atento a nunca descuidar do trabalho de base, mesmo quando me enfiaram em funções de burocracia e de estrutura de poder. Fui dando um jeito de responder pelas obrigações burocráticas e fui fazendo base durante os 16 anos de mandatos. Essa atitude ideológica e de concepção e prática sindical teve um preço alto, inclusive em minha saúde. Mas faria do mesmo jeito hoje. Só sei fazer política com a intensidade militante que a política da esquerda exige. A política é uma coisa complicada de se lidar quando estamos dentro dela e de se entender quando estamos fora dela. É muito compreensível os motivos pelos quais o povo cai fácil nas construções de ódio à política.
Enfim, tinha outros instantes para registrar nesta tarde de sábado, mas deixa pra lá. Uma coisa que está martelando em minha cabeça desde ontem quando a ouvi através de um youtuber (Henry Bugalho), dita por causa da questão Rússia, Ucrânia, Otan e EUA, o evento com bombas e fuga de civis de suas casas, é a questão sobre o que uma pessoa levaria de casa se tivesse que sair às pressas e deixar tudo pra trás por causa de eventos políticos como esses. Além dos documentos o que mais levar à mão? O restante que ficar será toda a sua vida material pregressa. Aí fico pensando em minhas pilhas de coisas, coisas, coisas. Nas mudanças que comecei anos atrás e que não consegui terminar até agora... puta que pariu! Como a gente não se toca nessa vida!
William (14h19)
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Osasco, 21 de fevereiro. Segunda. 2022. 22h19
Às voltas com meus processos internos, com as coisas de meu mundo doméstico, fico me perguntando por que a gente guarda tanta coisa, por que a gente tira tanta foto de tudo quanto é coisa e lugar e ocasião; por que a gente faz o que faz, eis a questão! Vaidade? Pra matar saudades? Pra registrar algo bom ou ruim ou curioso? Por não confiar na memória própria? Vai saber...
A problemática ao guardar grande volume físico ou virtual de coisas é que com o passar do tempo o espaço acaba - físico e virtual. Outra coisa: o que fazer com tudo aquilo? Ao começar a fuçar nas coisas guardadas, no espaço físico e no virtual, a gente pode realmente experimentar sentimentos de vaidade, saudades, tristeza ou alegria ou curiosidade ao rever aquelas coisas. Histórias da vida privada, da vida pública, eventos que marcaram a vida e vidas diversas.
Uma das coisas que fico pensando é a respeito da utilidade daqueles guardados. Tanto para mim quanto para outrem. Milhares de fotos de viagens a passeio... outro tanto de fotos que marcaram um mandato eletivo feito muito próximo às bases sociais que representava, uma concepção e prática sindical de raiz, "radical!", se quiser ser preciso e marcar posição política e ideológica sobre o que preservei num mandato.
Ao fuçar nas acumulações da vida sindical e profissional, a determinação de colocar a maior parte daquilo tudo num saco e mandar pra lixeira é uma determinação episódica, pusilânime, ela vem quando começo a olhar os conteúdos e desaparece depois que passei os olhos pelo que tem ali. Que difícil! Pode ser vaidade. Mas às vezes penso que pode ser amor... sim, amor. Aquilo remete à luta de classes, remete a instantes que fizeram parte do tecido histórico do que somos.
Uma pilha de Revista dos Bancários, outro tanto de Revista do Brasil, revistas Fórum, revistas Superinteressante, revistas Carta Capital...
Dezenas de quilos e pilhas de fotocópias de textos dos mais diversos autores de referência de um curso de Letras da Universidade de São Paulo... cada texto mais maravilhoso que o outro.
Matérias jornalísticas que relembram grandes lutas, grandes eventos, democracia na veia nas brigas intestinas nos congressos e encontros e assembleias que decidiam a vida de dezenas de milhares ou centenas de milhares de pessoas de uma categoria ou do mundo do trabalho.
Difícil! (22h51)
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Osasco, 19 de fevereiro. Sábado. 2022. 13h11
O instante. Picotei mais uma agenda antiga. São tantas ainda... e com muitos registros de história pessoal e coletiva. Ontem fiz uma postagem de Memórias (ver aqui) aproveitando o fato de ter recordado momentos registrados em 2009. Vamos ver se consigo avançar em alguma obrigação doméstica procrastinada há tempos. Desanimado pra isso neste sábado quente...
Teve um instante ontem que merecia um registro, mas não tive saco pra fazê-lo. Uma participante de um plano de saúde da Cassi me pediu um auxílio para tentar resolver uma dificuldade de atendimento naquele momento. Ela está grávida, tinha um exame de rotina a ser feito em um local conveniado à Cassi, o exame estava com hora marcada, ela teve que fazer jejum de várias horas. Simplesmente após horas de espera, ela ainda não tinha conseguido realizar o exame e o prestador dizia que havia algum problema de liberação do convênio médico dela. Eu sugeri que ela ligasse no 0800 ou na telemedicina, canais comuns de atendimento de convênio médico. Uma hora depois, eu perguntei se ela havia conseguido ser atendida e ela me disse que sim. Como acontece em 99% das situações semelhantes, não era culpa da Cassi, o prestador é que estava com problemas internos e várias pessoas estavam aguardando horas para serem atendidas naquela manhã. Gestantes em jejum ficaram sofrendo para serem atendidas por um consultório médico e os capitalistas donos manipulavam as vítimas culpando os convênios delas.
O que me tira do sério é que sempre que explico isso para alguém do universo que frequento e convivo, até pessoas próximas, a primeira coisa que as pessoas dizem é que já ouviram médica tal ou médico tal dizerem que a Cassi paga mal, que a Cassi isso, que a Cassi aquilo... que saco isso! Os capitalistas mentem e as vítimas ficam do lado deles!
Mesmo eu dizendo que não é verdade, que a Cassi não paga mal os convênios (capitalistas prestadores) e que os capitalistas chamados de médicos e profissionais de saúde fazem um monte de procedimentos desnecessários, inclusive cirurgias de alto risco e caras sem necessidade, as vítimas (pacientes) seguem defendendo os capitalistas-médicos e não o nosso plano de saúde que não visa lucro, não é ou não deveria ser "empresa" como pensa a administração atual, mas enfim, mesmo as pessoas próximas a mim e conhecidas e da comunidade Banco do Brasil preferem acreditar sempre no capitalista que vende procedimentos de saúde, mesmo os desnecessários.
Viva o capitalismo! Parabéns aos capitalistas! O mundo é de vocês! Os detentores do saber de algumas profissões, em geral reservadas à casa-grande e seus herdeiros, se aproveitam do saber da medicina, engenharia, do meio jurídico etc para fazerem de trouxas a grande massa dos 99%. E la nave va...
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Osasco, 16 de fevereiro. Quarta-feira. 2022. 23h43.
O instante público mostrado pela grande imprensa e pelas mídias sociais é a tragédia em Petrópolis. Forte chuva causou uma centena de mortes e desaparecidos. Dezenas de casas vieram abaixo com os deslizamentos. Milhares de pessoas tiveram suas vidas atingidas pela tragédia. Antes de Petrópolis (RJ), as chuvas castigaram nas últimas semanas as pessoas na Bahia, em Minas Gerais e São Paulo. Vidas perdidas por causa do capitalismo e dos capitalistas. As causas das mortes e da miséria daquela gente não foram naturais. O que as tornam naturais é a ideologia do capitalismo.
A grande imprensa não pautou a morte do garoto de nove anos assassinado por capangas por ser filho de um líder rural. O garoto foi executado a tiros enquanto se escondia embaixo da cama. As causas da morte foram o capitalismo e os capitalistas.
A pandemia de Covid-19 voltou a matar mil pessoas por dia no Brasil do bolsonarismo. Mas por falta de opção contra Lula, a imprensa grande manipula a pauta e direciona o povo brasileiro para outras pautas, outras causas e consequências. Bolsonaro e bolsonários e as mortes por Covid-19 no Brasil são causas e consequências do capitalismo e dos capitalistas.
A imprensa empresarial faz o povo de imbecil porque pode fazer isso. Não há ninguém nem força ou grupo político que impeça essa ditadura da imprensa da casa-grande e há técnicas para manipular o povo e o povo ainda ficar de amores com os manipuladores. Nossos conhecidos adoram os manipuladores e manipuladoras que apresentam a pauta que manipula. Difícil...
As pessoas estão nas ruas, sem moradia. Estão famintas. Tem muita comida por aí. Tem muita moradia desabitada para especular. Moradia e alimento no capitalismo não são moradia e alimento, são mercadorias. É o capitalismo e os capitalistas. E a ideologia deles nos meios de comunicação.
Que difícil!