Refeição Cultural - Agosto
Osasco, 31 de agosto de 2023. Quinta-feira.
Introdução
Criei neste ano aqui no blog uma categoria de postagem de final de mês para registrar alguma coisa que tenha me chamado a atenção naquele período. Quando olhar para trás relendo o blog, terei a memória registrada sobre minhas impressões do mundo no qual existo.
Vai terminando o mês de agosto. Pensando sobre o que me chamou a atenção, ou que fatos marcaram a minha vida ou a vida do mundo onde habito, ou ainda decisões que eventualmente tenha tomado, posso deixar registrado o seguinte:
1.
É no mês de agosto que os sabiás aqui da região onde moro começam a sinfonia de cantos nas madrugadas afora. É algo fantástico! Mesmo estando numa zona urbana, ouvimos durante semanas a cantoria dos sabiás. Some a esse espetáculo a beleza da floração dos ipês rosas, amarelos e brancos, que se juntam às patas-de-vaca para deixarem nosso ambiente humano mais bonito. Nossos agradecimentos aos sabiás, aos bem-te-vis e aos joões-de-barro de nossa região!
2.
Fiz a romaria entre Uberlândia e Água Suja neste mês de agosto. Deu tudo certo. Completei o percurso de quase 80 Km em 25 horas, e de forma admirável não tive nenhuma bolha nos pés, mesmo sem usar esparadrapos como faço há anos. Foi a 1ª vez que usei um aparelho que marca distâncias (um Huawei Band 8). Minha última romaria havia sido feita em 2019, antes da pandemia mundial de Covid. Cheguei a Uberlândia com muitas dúvidas na minha capacidade de ainda fazer a romaria. Tive medo de não conseguir. Meu corpo já não é o mesmo de antes. No entanto, o treinamento que fiz semanas antes da caminhada e a concentração no que estava fazendo durante o percurso foram fundamentais para que meu corpo ainda respondesse aos meus comandos. Mais uma vez, contei com a assistência de meu cunhado na estrada: ter alguém acompanhando o romeiro é um diferencial positivo na realização do projeto. A romaria foi um fato intenso em minha vida neste mês de agosto. Clique aqui para ler a postagem sobre essa experiência de peregrino.
3.
Aceitei neste agosto o fato de que algumas lideranças atuais da direção não me queriam mais na Articulação Sindical, tendência política da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Dediquei a maior parte de minha vida à militância política no movimento sindical bancário. Ao olhar para trás e ver as lutas realizadas e as etapas vencidas pela categoria, sei que deixei a minha contribuição em momentos importantes e decisivos de nossa história de luta de classes. Quanto mais estudo e busco conhecimento, mais claro fica para mim por que as coisas são como são e hoje tenho uma ideia melhor dos porquês de meu apagamento e cancelamento por parte de algumas lideranças da corrente política que ajudei a construir e fortalecer por cerca de três décadas - a CUT fez 40 anos e a Articulação quase isso, sou cutista há uns 35 anos. Fiz um texto de reflexões sobre essa decisão (ler aqui), aliás, as postagens sob a categoria "Memórias" é praticamente um livro publicado. É um momento de luto para mim, apesar de não significar nada para a corrente e a política atual. Nunca consegui colocar nada pessoal nas minhas prioridades, as prioridades do meu viver sempre foram as causas sociais e políticas que o movimento dos trabalhadores tinha na agenda. É um luto. Mesmo vivendo um duro processo de cancelamento por quase 5 anos, reconhecer o fim de meu pertencimento à Articulação é um desafio pessoal. Vou sobreviver a isso e vou me reinventar.
4.
O que sou no mundo neste momento, neste agosto? Não tem sido fácil viver sem função social definida. Se é frescura ou cacoete ser "útil" no mundo, não sei, mas o aculturamento enfiado em meu cérebro cobra que alguém seja algo. Apesar de nunca ter exercido profissão nas graduações que fiz - Ciências Contábeis e Letras - até pouco tempo eu era um "trabalhador", vendia meu corpo - as horas de meu dia - e minha força de trabalho para sobreviver, era bancário, era dirigente político, e isso alimentava minha psique formada através das décadas de existência num canto do mundo chamado Brasil... De repente, entre 2018 e 2019, me peguei sem resposta ao ser questionado sobre o que andava fazendo, quem eu era e coisas do tipo. "E aí, tá onde? Que anda fazendo? O que você faz? Qual sua ocupação?". O que sou no mundo neste momento? Nem "aposentado" sou, haja vista que pagarei a previdência pública até a morte pelo andar da carruagem. Avaliei que talvez seja razoável preencher essa resposta com algo parecido à função de "escritor". Eu escrevo. Estudo e escrevo a partir das reflexões que faço sobre o que leio e estudo. Eu escrevo. Em tese, quem escreve pode ser considerado um "escritor". Não tenho nenhum livro publicado. Mas poderia dizer que existem alguns livros nas quase duas décadas de textos publicados em meus blogs. São mais de 5 mil postagens e mais de 2 milhões de acessos. Talvez eu possa me identificar como um escritor...
5.
Tive um agosto de poucas leituras. Este foi o primeiro mês do ano no qual não li um livro por inteiro. Estou lendo alguns livros, dentre os quais cito Os miseráveis - Victor Hugo, Os mortos vivos - Peter Straub, Cuba insurgente - Maria Leite, Vaga Música - Cecília Meireles, mas as leituras seguem em ritmo lento. Sendo assim, li até o momento 23 livros no ano. As leituras que fiz até agora me fizeram refletir muito sobre a vida e o mundo. Isso é bom. Calculo que diminuirei o ritmo de leitura de livros nos próximos meses. Decidi lançar novos desafios ao meu cérebro, já que tenho andado preocupado com a alta incidência de problemas mentais na população mundial. As doenças degenerativas do cérebro têm aumentado assustadoramente. O que posso fazer para postergar alguma doença ou falência de meu cérebro eu tento fazer. Atividade física aeróbica, atenção no que como com frequência, e estímulos ao cérebro. Vou fazer um experimento comigo mesmo: vou adicionar uma carga diária de estudos de línguas e linguagem para estimular meu cérebro, ver se recupero e melhoro minha memória, e ver se realizo um sonho juvenil de saber algumas línguas. Aliás, gostaria de saber a gramática de nossa língua, pois nunca soube. Escrevo desde jovem com qualidade razoável por causa daquilo que chamamos de gramática internalizada da língua, por ser leitor e escritor praticante. Em resumo, vou ler menos livros e estudar linguagem e línguas.
6.
O mês de agosto na política pode ter sido bom ou pode ter sido ruim, depende do ponto de vista do observador. Decidi já faz algumas semanas usar menos tempo de meu tempo ocioso com o acompanhamento da política nacional. Eu não sou mais dirigente político e não consegui entender isso nos últimos cinco anos. O que falo ou penso ou escrevo sobre política não tem relevância alguma, sou um nada nessa área da política e não quis entender isso. O mundo atual vive uma esquizofrenia total. Um sujeito ou uma sujeita qualquer abre um perfil em alguma rede social, faz alguma coisa que dê relevância a ele ou ela, passa a ter milhões de seguidores e vira influenciador(a), e sem saber tecnicamente nada de porra nenhuma passa a ser a pessoa que faz milhões de pessoas pensarem como ele ou ela. Enquanto isso, um cientista ou profissional com uma vida de dedicação e estudos a determinada área de saber não consegue ser visto nem por centenas de pessoas, não influencia ninguém e ainda pode ser cancelado se contrariar um mané desses com milhões de seguidores. Uma esquizofrenia total. Postar opinião sobre as merdas de decisões do novo ministro do STF indicado por Lula? Falar da eterna impunidade dos caras que destruíram o país e o povo? Comentar sobre uma pauta política bombando na semana? Que diferença faria um comentário meu sobre isso? Se eu tiver o cuidado necessário, me informo rapidamente sobre as coisas e foco meu tempo ocioso em estudar algo que definir como relevante a mim. Tenho que ter a sabedoria de me colocar no meu lugar no mundo neste momento da vida e da história.
7.
E assim, fecho o registro do mês de agosto. Neste último item coloco um desafio que seria bobo anos atrás, mas que agora é um desafio grande para mim. Me inscrevi na 98ª Corrida de São Silvestre. Depois de 10 participações, não corro a prova faz alguns anos. Neste momento, não tenho condições de correr 15 Km, não tenho condicionamento físico para isso. Tenho 4 meses para me preparar. Minha condição de saúde atual para correr um percurso desses é ruim. Ontem mesmo, fiz um trote de 5K e sempre fico com dores no dia seguinte, principalmente nas minhas estruturas musculares e esqueléticas. Vamos ver o que programo para esses meses. Enquanto estiver treinando e me preparando, estarei ajudando meu coração e meu sistema respiratório e circulatório. Meu cérebro também agradece por isso.
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O que é a vida?
A vida é oportunidade. Estar vivo é estar no mundo e estar no mundo é uma chance de poder aprender algo novo e criar e estar sob o imponderável a cada momento, a cada manhã que acordamos. Então, felizes ou tristes, com muitas ou poucas dificuldades, penso que temos que viver, e penso que temos que viver não de qualquer jeito, temos que viver com ética, com caráter, com solidariedade, com humanismo e com consciência social de que não somos nada sozinhos, somos seres sociais e precisamos das pessoas que estão no mundo como nós estamos. Somos natureza! Somos parte da natureza, não estamos acima dela em escala hierárquica. Nossa potência de fazer esbarra na impotência de não poder intervir em tudo. É isso que penso neste momento do meu viver.
William
Post scriptum: minha reflexão sobre julho pode ser lida aqui.