domingo, 31 de março de 2019

Marx: a forma geral do valor das mercadorias




Refeição Cultural

"As mercadorias só encarnam valor, na medida em que são expressão de uma mesma substância social, o trabalho humano." (Karl Marx, O Capital)


A) A FORMA SIMPLES, SINGULAR OU FORTUITA DO VALOR

x da mercadoria A = y da mercadoria B, ou

x da mercadoria A vale y da mercadoria B

20 metros de linho = 1 casaco, ou

20 metros de linho valem 1 casaco


B) FORMA TOTAL OU EXTENSIVA DO VALOR

z da mercadoria A = u da mercadoria B, ou = v da mercadoria C, ou = w da mercadoria D, ou = x da mercadoria E, ou = etc.

(20 metros de linho = 1 casaco, ou = 10 quilos de chá, ou = 40 quilos de café, ou = 1 quarta de trigo, ou = 2 onças de ouro, ou = 1/2 tonelada de ferro, ou = etc.)


A forma extensiva do valor relativo

"O valor de uma mercadoria, do linho, por exemplo, está agora expresso em inúmeros outros elementos do mundo das mercadorias. O corpo de qualquer outra mercadoria torna-se o espelho onde se reflete o valor do linho."

Marx nos explica que desse modo se revela a massa de trabalho humano homogêneo e que por isso não importa a forma corpórea assumida pelo trabalho, seja ela qual for, casaco, trigo, ferro, ouro etc.

E completa dizendo que "ao valor não importa a forma específica do valor de uso em que se manifesta".

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"Não é a troca que regula a magnitude do valor da mercadoria, mas, ao contrário, é a magnitude do valor da mercadoria que regula as relações de troca."
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A forma de equivalente particular

Cada mercadoria, casaco, chá, trigo, ferro etc, é considerada equivalente na expressão do valor do linho e, portanto, encarnação de valor, afirma Marx.

Além disso, as variadas espécies de trabalho contidas nas mercadorias são trabalho humano em geral.


Defeitos da forma total ou extensiva do valor

A cadeia de equivalência não terminaria nunca porque sempre vai haver uma nova mercadoria. Falta uma forma unitária de manifestação do trabalho humano. Marx cita outros defeitos dessa forma.


A forma geral do valor

1 casaco                       =   |
10 quilos de chá           =   |
40 quilos de café          =   |
1 quarta de trigo          =   |
2 onças de ouro            =   |   20 metros de linho
1/2 tonelada de ferro   =   |
x de mercadoria A         =   |
etc. mercadoria             =   |


Mudança do caráter da forma do valor na expressão acima:

Marx nos explica que diferente das formas anteriores, as mercadorias expressam, agora, seus valores (1) de maneira simples, isto é, numa única mercadoria e (2) de igual modo, isto é, na mesma mercadoria. É uma forma de valor simples, comum a todas as mercadorias, portanto, geral.

VALORES DE TROCA

"(...) o valor de cada mercadoria, igualado ao linho, se distingue não só do valor de uso dela mas de qualquer valor de uso, e justamente por isso se exprime de maneira comum a todas as mercadorias. Daí ser esta a forma que primeiro relaciona as mercadorias como valores, umas com as outras, fazendo-as revelarem-se, reciprocamente, valores de troca."

O filósofo nos mostra que "a realidade do valor das mercadorias só pode ser expressa pela totalidade de suas relações sociais, pois essa realidade nada mais é que a 'existência social' delas, tendo a forma do valor, portanto, de possuir validade social reconhecida".

EQUIVALÊNCIA GERAL

A forma geral do valor relativo do mundo das mercadorias imprime à mercadoria eleita equivalente, o linho, o caráter de equivalente geral. No exemplo que Marx nos dá fica bem claro isso.

10 quilos de chá = 20 metros de linho
40 quilos de café = 20 metros de linho
logo
10 quilos de chá = 40 quilos de café
1 quilo de café = 1/4 da substância do valor, o trabalho, contida em 1 quilo de chá

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"Considera-se sua forma corpórea (o linho) a encarnação visível, a imagem comum, social, de todo trabalho humano. O trabalho têxtil, o trabalho privado que produz linho, ostenta, simultaneamente, forma social, a forma de igualdade com todos os outros trabalhos. As inumeráveis equações em que consiste a forma geral de valor equiparam, sucessivamente, ao trabalho contido no linho qualquer trabalho encerrado em outra mercadoria e convertem, portanto, esse trabalho têxtil em forma geral de manifestação do trabalho humano sem mais qualificações."
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Para finalizar essa parte da explicação acima, vem o complemento da lição de Marx em suas palavras:

"Assim, o trabalho objetivado no valor da mercadoria é representado não só sob o aspecto negativo em que se põem de lado todas as formas concretas e propriedades úteis dos trabalhos reais; ressalta-se, agora, sua própria natureza positiva. Ele é, agora, a redução de todos os trabalhos reais a sua condição comum de trabalho humano, de dispêndio de força humana de trabalho."

A conclusão deste ponto é que a forma geral do valor, que torna os produtos do trabalho mera massa de trabalho humano sem diferenciações, mostra, através de sua própria estrutura, que é a expressão social do mundo das mercadorias. 


Desenvolvimento mútuo da forma relativa do valor e da forma de equivalente

Marx explica cada uma das formas acima e as limitações delas. A terceira forma, proporciona ao mundo das mercadorias forma relativa generalizada e social do valor, por estarem e enquanto estiverem excluídas todas as mercadorias, com exceção de uma única, da forma equivalente geral.


Transição da forma geral do valor para a forma dinheiro

Estando uma mercadoria na forma de equivalente geral (forma C acima, o linho) ela pode ser considerada como mercadoria-dinheiro.

"Então, mercadoria determinada, com cuja forma natural se identifica socialmente a forma equivalente, torna-se mercadoria-dinheiro, funciona como dinheiro. Desempenhar o papel de equivalente universal torna-se sua função social específica, seu monopólio social, no mundo das mercadorias."

Terminando essa parte C da forma geral do valor das mercadorias, Marx vai entrar na próxima parte D, na forma dinheiro de valor, que fica para a próxima postagem.

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COMENTÁRIO FINAL

Estou terminando a parte I que trata da "Mercadoria" para entrar em seguida da parte II que trata de "O processo de troca".

Aos poucos, estamos vencendo a primeira centena de páginas dos estudos de Marx sobre O Capital.

Volto a dizer que estou postando literalmente trechos da obra de Marx para não incorrer em interpretações equivocadas de seus ensinamentos. Não sou marxista, não sou estudioso de Marx, no momento sou leitor da obra O Capital.

Mergulhar em leituras e estudos tem sido uma forma de buscar manter a sanidade num mundo de trumps e bolsonaros. Não podemos deixar a perplexidade e a tristeza nos levar para o buraco. Temos que resistir, e estudar é uma forma de resistência.

Leitura é uma forma de resistência! Por isso passei horas deste domingo 31 de março com a atenção nos ensinamentos de Marx.

É isso.

William
Um leitor


Post Scriptum:

A postagem anterior está AQUI e dela se vai para as anteriores.


sábado, 30 de março de 2019

Leitura: El Popol-Vuh



Refeição Cultural

El Popol-Vuh - Livro dos conselhos ou Livro da comunidade

A leitura desta obra se dá no contexto de estudos da literatura hispano-americana, com o tema das invasões dos europeus a partir do século XV, sobretudo os espanhóis, e nos leva a uma reflexão amarga sobre a destruição dos povos originários que aqui nas Américas viviam. Eram culturas riquíssimas as dos maias, astecas, incas, dentre outros povos e culturas.

E o que mais nos choca é ver no século XXI a repetição das diversas formas de colonização, exploração e destruição de culturas e povos das Américas Central e do Sul, e também do Caribe, por parte dos norte-americanos sobretudo e também por parte dos europeus.

A leitura aqui na postagem é de estudos, é de aprendizagem. Vamos então reproduzir alguns pontos da obra, encontrada em meio virtual, para que a postagem dê um apanhado geral sobre El Popol-Vuh.

O texto está em espanhol.


Sobre a obra:

Traducción de la versión francesa del profesor Georges Raynaud, director de estudios sobre las religiones de la América Precolombina, en la Escuela de Altos Estudios de París, por los alumnos titulares de la misma MIGUEL ÁNGEL ASTURIAS y J. M. GONZÁLEZ DE MENDOZA

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Instituto Cultural Quetzalcoatl de Antropología Psicoanalítica, A.C.


BREVE NOTICIA

El Popol-Vuh, que puede traducirse Popol, comunidad, consejo, y Vuh, libro, Libro del Consejo o Libro de la Comunidad, fue pintado. Lo dice el texto: “Este libro es el primer libro pintado antaño”. ¿El primer libro? ¿Querrá significarse con esto el más importante, algo así como la Biblia? “Pero su faz está oculta”, sigue el texto. ¿Oculta, por qué? ¿Fue destruido? ¿Fue quemado? ¿Se consumió en la ciudad de Utatlán, entregada a las llamas, reducida a cenizas por el Conquistador? “Su faz está oculta al que ve”, añade el texto, lo que mueve a pensar que no está oculta para el que, sin ver, conserva dicha faz en la memoria y la transmite oralmente. 


Originalmente, el Popol-Vuh fue pintura, memoria, palabra, y en esta forma de tradición oral se conserva hasta mediados del siglo XVI, época en que vuelve a ser escrito, por un indígena, antiguo sacerdote quizá, en lengua quiché, con caracteres latinos. Este manuscrito, que constituye el verdadero original del Popol-Vuh, llega a manos de Fr. Francisco Ximénez, cura párroco de Santo Tomás Chuilá, población guatemalteca llamada actualmente Chichicastenango, a principios del siglo XVIII. Por eso se conoce el Popol-Vuh con el nombre de “Manuscrito de Chichicastenango”.


Descubrirlo el Padre Ximénez, varón versadísimo en lenguas indígenas, y entregarse a su estudio y traducción del quiché al castellano, todo es uno. Pero el perilustre dominico no se contenta con traducir el Popol-Vuh. Para dar testimonio incuestionable de la autenticidad del texto y curarse en salud ante las autoridades religiosas, tal similitud hay entre el Génesis indígena y algunos pasajes de la Biblia, hace algo que la posteridad jamás le pagará bastante: al par de su versión castellana, en columna paralela, copia del texto quiché, es decir, que no sólo nos lega su traducción, sino la transcripción del texto indígena.


El Padre Ximénez realiza dos versiones. Una primera literal, que no le satisface, y una segunda, más cuidada, que incluye en el primer tomo de la “Crónica de la Provincia de Chiapa y Guatemala”, obra monumental que del archivo de los dominicos pasa en 1854 —con otros documentos del Padre Ximénez—, a la Biblioteca de la Universidad de San Carlos Borromeo. A partir de ese momento el libro sagrado de los quichés va a ser traducido a otras lenguas. El Dr. Carl Scherzer copia el texto en la Biblioteca de la Universidad de Carolina, y traducido al alemán lo publica en Viena, en 1857, bajo el título de “Las historias del origen de los indios de esta Provincia de Guatemala”. El abate Carlos Esteban Brasseur de Bourbourg llega a Guatemala, desde Francia, atraído por la luz de ese manuscrito prodigioso, se afinca en el país, estudia y profundiza la lengua quiché y traduce el Popol-Vuh al francés, versión que publica en París, en 1891, con el título de “Popol-Vuh, le livre sacre et les mythes de l”antiquité américaine”.


Varias otras traducciones se han hecho desde entonces, y se han publicado algo más de treinta y dos volúmenes, en todas las lenguas, interés que crece de día en día por tratarse de uno de los documentos milenarios de la humanidad.


De estas traducciones, citaremos las últimas. La del licenciado J. Antonio Villacorta y el profesor Flavio Rodas, publicada en Guatemala, en 1927, con el texto quiché fonetizado; la del licenciado Adrián Recinos, el cual encontró en la Biblioteca de Ewberry, de Chicago, el primer texto del Padre Ximénez, la traducción más literal, pero no la mejor, dado que el mismo autor la mejoró enormemente, y fue su segunda versión, ya más dueño del idioma quiché, la que incluyó en su famosa historia. De ésta, el profesor Georges Raynaud, después de más de cuarenta años de estudio, toda una vida, realizó su versión francesa ajustada al texto con rigor científico, sin restarle por ello su primigenia hermosura, su vuelo poético, su frescor vegetal, su hondura misteriosa. Dos de sus alumnos en la Escuela de Altos Estudios de París, el mexicano J. M. González de Mendoza y el guatemalteco Miguel Ángel Asturias, vierten al español, bajo la dirección del propio profesor Raynaud, la traducción del Popol-Vuh, hasta ahora considerada como la mejor, y la publican en París, en 1927, con el título de “Los Dioses, los Héroes y los Hombres de Guatemala Antigua”, de la que después se han hecho varias ediciones, siendo merecedora de citarse, en primer lugar, la de la Biblioteca del Estudiante Universitario [“El Libro del Consejo”], en las publicaciones de la Universidad Nacional Autónoma de México.


Y es la versión del Profesor Georges Raynaud, la de mayor autoridad científica, la que ahora publicamos, en la traducción al español de González de Mendoza y Miguel Ángel Asturias, seguros de que por igual ha de interesar al investigador, al sociólogo, al poeta, al escritor, al artista y al curioso lector que ame los mitos antiguos, y en este caso, el de cómo los dioses formaron el mundo americano y cómo fue creado el hombre de maíz.


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1. Do que vai tratar o livro

"Aquí comenzaremos la antigua historia llamada Quiché. Aquí escribiremos, comenzaremos el antiguo relato del principio, del origen, de todo lo que hicieron en la ciudad Quiché los hombres de las tribus Quiché."


2. O início, a origem

"He aquí el relato de cómo todo estaba en suspenso, todo tranquilo, todo inmóvil, todo apacible, todo silencioso, todo vacío, en el cielo, en la tierra. He aquí la primera historia, la primera descripción."

"Primero nacieron la tierra, los montes, las llanuras; se pusieron en camino las aguas; los arroyos caminaron entre los montes; así tuvo lugar la puesta en marcha de las aguas cuando aparecieron las grandes montañas. Así fue el nacimiento de la tierra cuando nació por [orden] de los Espíritus del Cielo, de los Espíritus de la Tierra, pues así se llaman los que primero fecundaron, estando el cielo en suspenso, estando la tierra en suspenso en el agua; así fue fecundada cuando ellos la fecundaron: entonces su conclusión, su composición, fueron meditadas por ellos."


3. A criação dos animais, que não veneravam aos deuses

"Estando pues todos terminados, venados, pájaros, les fue dicho a los venados, a los pájaros, por los Constructores, los Formadores, los Procreadores, los Engendradores: “Hablad, gritad; podéis gorjear, gritar. Que cada uno haga oír su lenguaje según su clan, según su manera”.

Mas:

"'En adelante decid nuestros nombres, alabadnos, a nosotros vuestras madres, a nosotros vuestros padres. En adelante llamad a Maestro Gigante [Relámpago], Huella del Relámpago, Esplendor del relámpago, Espíritus del Cielo, Espíritus de la Tierra, Constructores. Formadores, Procreadores. Engendradores. Habladnos, invocadnos, adoradnos', se les dijo. Pero no pudieron hablar como hombres: solamente cacarearon, solamente mugieron, solamente graznaron; no se manifestó [ninguna] forma de lenguaje, hablando cada uno diferentemente. Cuando los Constructores, los Formadores, oyeron sus palabras impotentes, se dijeron unos a otros: 'No han podido decir nuestros nombres, de nosotros los Constructores, los Formadores'. 'No está bien...

(...)

"Nuestra adoración es imperfecta si vosotros no nos invocáis."


4. A criação imperfeita de homens de terra, de barro, que não veneravam os deuses

"De fierra hicieron la carne. Vieron que aquello no estaba bien, sino que se caía, se amontonaba, se ablandaba, se mojaba, se cambiaba en tierra, se fundía; la cabeza no se movía; el rostro [quedábase vuelto] a un solo lado; la vista estaba velada; no podían mirar detrás de ellos; al principio hablaron, pero sin sensatez. En seguida, aquello se licuó, no se sostuvo en pie. Entonces los Constructores, los Formadores, dijeron otra vez: 'Mientras más se trabaja, menos puede él andar y engendrar'. 'Que se celebre, pues, consejo sobre eso', dijeron. Al instante deshicieron, destruyeron una vez más, su construcción, su formación, y después dijeron: '¿Cómo haremos para que nos nazcan adoradores, invocadores?'..."


5. A criação de homens de madeira, que também não veneraram os deuses

"'Que así sean, así, vuestros maniquíes, los [muñecos] construidos de madera, hablando, charlando en la superficie de la tierra'. —'Que así sea', se respondió a sus palabras. Al instante fueron hechos los maniquíes, los [muñecos] construidos de madera; los hombres se produjeron, los hombres hablaron; existió la humanidad en la superficie de la tierra. Vivieron, engendraron, hicieron hijas, hicieron hijos, aquellos maniquíes, aquellos [muñecos] construidos de madera. No tenían ni ingenio ni sabiduría, ningún recuerdo de sus Constructores, de sus Formadores; andaban, caminaban sin objeto. No se acordaban de los Espíritus del Cielo; por eso decayeron."


6. Insatisfeitos, os deuses se livram dos humanos com uma inundação

"En seguida [llegó] el fin, la pérdida, la destrucción, la muerte de aquellos maniquíes, [muñecos] construidos de madera.

Entonces fue hinchada la inundación por los Espíritus del Cielo, una gran inundación fue hecha: llegó por encima de las cabezas de aquellos maniquíes, [muñecos] construidos de madera (...) Y su muerte fue esto: fueron sumergidos; vino la inundación, vino del cielo una abundante resina."

No capítulo de destruição dos homens de madeira, há uma descrição forte da vingança dos animais que estavam sob o jugo dos homens, inclusive suas vasilhas se regozijaram sobre a destruição deles. Dizem os antigos que os macacos são os antigos descendentes daqueles homens de madeira.

Havia também um tal Principal Guacamayo (e seus filhos); ele foi derrotado junto aos homens de madeira na inundação. O orgulho era o principal defeito de Principal Guacamayo.


7. Depois nos é contado como Sabio Pez-Tierra, filho de Principal Guacamayo, derrota com estratégia a quatrocentos jovens

"Estando todos ebrios, los cuatrocientos jóvenes no tenían ya Sabiduría; entonces su casa fue derribada sobre sus cabezas por Sabio Pez-Tierra, y acabaron por ser todos destruidos. Ni uno ni dos de aquellos cuatrocientos jóvenes se salvaron; fueron matados por Sabio Pez-Tierra, hijo de Principal Guacamayo. Así murieron los cuatrocientos jóvenes. Se dice también que entraron en la constelación llamada a causa de ellos el Montón, pero esto no es quizás más que una fábula. Aquí contaremos también la derrota de Sabio Pez-Tierra por los dos engendrados Maestro Mago, Brujito."


8. Os capítulos seguintes tratam de histórias de nascimento e morte de personagens da mitologia do povo maia quiché.

A versão que estou estudando tem 91 páginas. A leitura passou a ser cansativa a partir de aqui. São várias aventuras descrevendo personagens que significam origens de alguma coisa, ou que explicam algo.

Estou na primeira terça parte da obra. Vou seguir a leitura depois.

William
Um leitor

quinta-feira, 28 de março de 2019

O Vergalho - Brás Cubas (Prudêncio é o povo brasileiro)



Ilustração de Marilia Bruno, de uma bela edição
do livro de Machado, feita pela Panda Books, em 2018. 
Recomendo a aquisição e leitura.

Refeição Cultural

"O Vergalho

Tais eram as reflexões que eu vinha fazendo, por aquele Valongo fora, logo depois de ver e ajustar a casa. Interrompeu-mas um ajuntamento; era um preto que vergalhava (chicoteava) outro na praça. O outro não se atrevia a fugir; gemia somente estas únicas palavras: - 'Não, perdão, meu senhor; meu senhor, perdão!' Mas o primeiro não fazia caso, e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada nova.


- Toma, diabo! dizia ele; toma mais perdão, bêbado!

- Meu senhor! gemia o outro.

- Cala a boca, besta! replicava o vergalho.

Parei, olhei... justos céus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudêncio, - o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me a benção; perguntei-lhe se aquele preto era escravo dele.

- É, sim nhonhô.

- Fez-te alguma coisa?

- É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.

- Está bom, perdoa-lhe, disse eu.

- Pois não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra para casa, bêbado!

Saí do grupo, que me olhava espantado e cochichava as suas conjeturas. Segui caminho, a desfiar uma infinidade de reflexões, que sinto haver inteiramente perdido; aliás, seria matéria para um bom capítulo, e talvez alegre. Eu gosto dos capítulos alegres; é o meu fraco. Exteriormente, era torvo o episódio do Valongo; mas só exteriormente. Logo que meti mais dentro a faca do raciocínio achei-lhe um miolo gaiato, fino e até profundo. Era um modo que o Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas, - transmitindo-as a outro. Eu, em criança, montava-o, punha-lhe um freio na boca, e desancava-o sem compaixão; ele gemia e sofria. Agora, porém, que era livre, dispunha de si mesmo, dos braços, das pernas, podia trabalhar, folgar, dormir, desagrilhoado da antiga condição, agora é que ele se desbancava: comprou um escravo, e ia-lhe pagando, com alto juro, as quantias que de mim recebera. Vejam as sutilezas do maroto!"

(Capítulo LXVIII, O vergalho, em Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, 1881)


Amig@s leitores, o personagem Prudêncio, negro, ex-moleque, agora adulto, escravo alforriado, e açoitador de outro negro, escravo dele, é, na minha opinião, uma alegoria perfeita do povo brasileiro pobre, "remediado", de direita e conservador; é o povo manipulado por conceitos inventados para situá-lo como "classe média", e que no fundo não passa de pobre que não reconhece que é pobre.

Peguei na estante para ler um pouco de Machado de Assis para poder respirar. Ver toda a destruição do Brasil e da brasilidade, ver o desfazimento de uma nação nos faz faltar o ar. Aos que têm um pouco de consciência política, que sinceramente, não é muita gente.

Prudêncio é o povo brasileiro de hoje, é a ampla maioria dos 57.797.847 eleitores do governo atual; não são prudêncios todos os eleitores votantes desta coisa que viramos porque os da casa-grande votaram com consciência de classe.

Prudêncio são meus colegas bancários, são os metalúrgicos, os professores, os funcionários públicos, os PJ (pessoa jurídica) que trabalham como terceirizados e se acham empreendedores, classe média. Prudêncio é o empregado que era assediado e que ganhou uma funçãozinha qualquer e passa a assediar seus colegas.

Esses prudêncios votam na direita, votam nos banqueiros, nos brancos da elite, nos nhonhôs, e querem distância das organizações e lideranças que representam a sua classe, a de pobre e de trabalhador, é gente que vive de vender força de trabalho, mas não se enxerga como tal.

Povo miserável, país miserável!

William

sexta-feira, 22 de março de 2019

Marx: a forma relativa do valor da mercadoria e a forma equivalente




Refeição Cultural

"É curioso o que sucede com essas conceituações reflexas. Um homem, por exemplo, é rei porque outros com ele se comportam como súditos. Esses outros acreditam que são súditos, porque ele é rei." (Marx, em "O Capital")


Comprei semanas atrás o primeiro volume do livro O Capital - Crítica da Economia Política, de Karl Marx. Penso que teria sido mais proveitoso estudar esta obra clássica do pensamento humano em outra época, enquanto era um representante do meio social em que vivia. Agora, a leitura é mais por curiosidade.

Nesta obra, nos é informado no sumário que vamos ler sobre o "processo de produção do capital". A primeira parte do volume 1 nos apresenta o tema "Mercadoria e Dinheiro". Estou lendo sobre a mercadoria. 

Para mim, a leitura está sendo trabalhosa, talvez por dificuldade intelectual de minha parte. Além disso, leio várias coisas ao mesmo tempo, de maneira que estudo numa sentada algumas páginas de Marx e volto ao livro dias depois. 

No entanto, é inevitável perguntar a mim mesmo neste momento de minha existência: ler ou não ler Marx? Para não desanimar, fico com a lembrança de um texto que estudei no passado sobre ler ou não ler os clássicos e a resposta do autor para a questão era: é melhor ler do que não ler os clássicos.

Foi baseado nesse estímulo acima, que passei algumas horas com Marx neste dia.


A FORMA DO VALOR OU O VALOR DE TROCA

"As mercadorias vêm ao mundo sob a forma de valores de uso, de objetos materiais, como ferro, linho, trigo etc. É a sua forma natural, prosaica. Todavia, só são mercadorias por sua duplicidade, por serem ao mesmo tempo objetos úteis e veículos de valor. Por isso, patenteiam-se como mercadorias, assumem a feição de mercadoria, apenas na medida em que possuam dupla forma, aquela forma natural e a de valor."

E Marx nos recorda que as mercadorias só encarnam valor na medida em que são expressões de uma mesma substância social, o trabalho humano. Ele nos fala sobre um certo valor escondido: "Partimos do valor de troca ou da relação de troca das mercadorias, para chegar ao valor aí escondido".

Os estudos dessa temática vão elucidar a gênese da forma dinheiro do valor.

Todo o trecho que li faz as explanações baseado na fórmula abaixo:


A FORMA SIMPLES, SINGULAR OU FORTUITA DO VALOR

x da mercadoria A = y da mercadoria B, ou

x da mercadoria A vale y da mercadoria B

20 metros de linho = 1 casaco, ou

20 metros de linho valem 1 casaco


OS DOIS POLOS DA EXPRESSÃO DO VALOR: A FORMA RELATIVA DO VALOR E A FORMA DE EQUIVALENTE

"O valor da primeira mercadoria apresenta-se como valor relativo; ela se encontra sob a forma relativa do valor. A segunda mercadoria tem a função de equivalente ou se acha sob a forma de equivalente."

O valor do linho só pode ser expresso relativamente, em outra mercadoria.

Mais adiante o autor nos explica como identificar em que forma a mercadoria se encontra:

"Para saber se uma mercadoria se encontra sob a forma relativa do valor ou sob a forma oposta, a de equivalente, basta reparar a posição que ocasionalmente ocupa na expressão do valor, se é a mercadoria cujo valor é expresso ou se é mercadoria através da qual se expressa o valor."


A FORMA RELATIVA DO VALOR

O filósofo nos lembra que para comparar quantitativamente duas coisas diferentes é preciso convertê-las antes em uma mesma coisa: somente como expressões de uma mesma substância são grandezas homogêneas, por isso, comensuráveis.

"(...) é necessário admitir, simultaneamente, que linho e casacos, como grandezas de valor, são expressões de uma mesma coisa, ou coisas da mesma natureza. Linho = casaco é o fundamento da equação."

E segue:

"Nessa relação, o casaco representa a forma de existência do valor, é a figura do valor, pois somente nessa qualidade é idêntico ao linho..."


TRABALHO HUMANO CRISTALIZADO

"Ao dizermos que, como valores, as mercadorias são trabalho humano cristalizado, nossa análise as reduz a uma abstração, a valor, mas não lhes dá forma para esse valor, distinta de sua forma física."

No valor das mercadorias está contida a força humana de trabalho, tanto do tecelão do linho quanto do alfaiate dos casacos, neste sob a forma concreta e naquele sob a forma abstrata de trabalho humano (na equação 20 metros de linho = 1 casaco).

Duas citações deixam isso evidente para nós:

- "Só a expressão da equivalência de mercadorias distintas põe à mostra a condição específica do trabalho criador de valor, porque ela realmente reduz à substância comum, a trabalho humano, simplesmente, os trabalhos diferentes incorporados em mercadorias diferentes."

- "A força humana de trabalho em ação ou o trabalho humano cria valor, mas não é valor. Vem a ser valor, torna-se valor, quando se se cristaliza na forma de um objeto. Para expressar o valor do linho como massa de trabalho humano, temos de expressá-la como algo que tem existência material diversa da do próprio linho e, ao mesmo tempo, é comum a ele e a todas as outras mercadorias."

Marx nos diz que o valor da mercadoria linho está expresso pelo corpo da mercadoria casaco, o valor de uma mercadoria pelo valor de uso da outra.

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"Por meio da relação de valor, a forma natural da mercadoria B torna-se a forma do valor da mercadoria A, ou o corpo da mercadoria B transforma-se no espelho do valor da mercadoria A. Ao relacionar-se com a mercadoria B como figura do valor, materialização de trabalho humano, a mercadoria A faz do valor de uso B o material de sua própria expressão de valor. O valor da mercadoria A, ao ser expresso pelo valor de uso da mercadoria B, assume a forma relativa."
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Antes de entrar no ponto da forma equivalente, as páginas seguintes discorreram sobre a questão dos efeitos da produtividade na confecção das mercadorias.


A FORMA EQUIVALENTE

"Já vimos que a mercadoria A (o linho) ao exprimir seu valor por meio do valor de uso de mercadoria diferente, a mercadoria B (o casaco), imprime a esta última forma de valor peculiar, a forma de equivalente. O linho revela sua condição de valor, ao igualar-se ao casaco, sem que este adote uma forma de valor diferente de sua forma corpórea. Na realidade, o linho expressa sua própria condição de valor por ser o casaco por ele diretamente permutável. Assim, a mercadoria assume a forma de equivalente, por ser diretamente permutável por outra."

Na forma de equivalente, o valor de uso se torna a forma de manifestação do seu contrário, ou seja, do valor.

Marx explica que não podendo a mercadoria transformar seu próprio corpo em expressão de seu próprio valor, tem ela de relacionar-se com outra mercadoria, considerada equivalente, ou seja, fazer da figura física de outra mercadoria sua própria forma de valor.

E nos fala sobre o valor de troca: "(...) Em outras palavras, o valor de uma mercadoria assume expressão fora dela, ao manifestar-se como valor de troca".

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"Examinando mais de perto a expressão do valor da mercadoria A, contida na sua relação de valor com a mercadoria B, vimos que, dentro do seu domínio, se considera a forma natural da mercadoria A figura de valor de uso, e a forma natural de mercadoria B apenas forma de valor. A contradição interna, oculta na mercadoria, entre valor de uso e valor, patenteia-se, portanto, por meio de uma oposição externa, isto é, através da relação de duas mercadorias, em que uma, aquela cujo valor tem de ser expresso, figura apenas como valor de uso, e a outra, aquela na qual o valor é expresso, é considerada mero valor de troca. A forma simples do valor de uma mercadoria é, por conseguinte, a forma elementar de manifestar-se a oposição nela existente, entre valor de uso e valor."
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ALÉM DA DÚVIDA DO LER OU NÃO LER, A DO ESCREVER OU NÃO

A próxima parte da leitura, vai abordar ainda a forma total ou extensiva do valor, a forma de equivalente particular, defeitos da forma total ou extensiva do valor, forma geral do valor, até chegar na transição da forma geral do valor para a forma dinheiro do valor.

Além da dúvida deste leitor que vos fala, sobre ler ou não ler Marx, ainda fica outra dúvida tão difícil quanto a primeira: escrever ou não escrever a respeito do que leio? 

Escrevi por mais de uma década no blog. O ato de escrever exige muita disciplina e esforço. Por outro lado, o esforço ao escrever gera aprendizagem e memorização por reflexão naquele que escreve.

Talvez por isso ainda escreva alguma coisa aqui no blog nesta altura dos acontecimentos e mudanças sociais no meu mundo.

Abraços aos leitores que por aqui passarem.

William


Post Scriptum:

As demais postagens sobre O Capital estão disponíveis a partir da anterior (AQUI).

domingo, 17 de março de 2019

HQ Paraíso Perdido, John Milton (1667), por Auladell


Capa da obra
ilustrada por Pablo Auladell.


Refeição Cultural

"Mais vale reinar no Inferno do que servir no Céu" (Satanás)


Os caminhos para o conhecimento e para a cultura são os mais diversos possíveis. 

Fui até uma livraria para escolher um livro para presentear um amigo. 

Depois de flertar com diversas obras nas estantes e nos modernos estandes que oferecem os títulos mais variados possíveis, incluindo um monte de porcarias ("Seja foda...", "Como não ser idiota..." etc), vi o livro de John Milton, Paraíso Perdido (1667), em edição ilustrada, ou Grafic Novel, ou HQ, História em Quadrinhos.

Acabei escolhendo esse livro para presente e comprei um para mim também.

- Que bela edição! As imagens são impactantes!

O arcanjo Satanás lidera uma rebelião no céu contra Deus, abre uma guerra civil no céu e após ser derrotado, vai parar no Inferno com um terço da população celestial. Sabendo que Deus criou um lugar chamado Terra e lá colocou diversas criaturas, inclusive uma tal criatura chamada Homem, decidiu em Concílio com seus seguidores ir para lá para tentar essa criatura humana e fazer com que ela não obedeça ao seu criador.

As criaturas humanas são Adão e Eva, esta feita da costela de Adão. A artimanha definida por Satanás é fazer com que os humanos comam o fruto da árvore do conhecimento, a única proibida a eles por Deus. Adivinhem o que acontece?

Após ler o livro, fui ler sobre John Milton e pesquisei mais alguns temas relativos a essa tradição religiosa a respeito de Deus, Satanás, Adão, Eva e personagens afins.


Satanás passa pelo Trono do Caos,
a caminho da Terra.

É difícil não se deixar levar por teorias de causas e consequências, pela questão do castigo e das benditas ou malditas escolhas do chamado livre arbítrio humano quando refletimos sobre o momento que vivemos no Brasil e no mundo nesta quadra da história.

Tem uma passagem na obra onde Satanás, procurando o caminho para a Terra, passa pelo reino do Caos e com a ajuda desse soberano, Satanás lhe promete todo o proveito ou butim das merdas que fará com a Terra e os humanos, pois ele Satanás só quer a vingança contra Deus.

Amig@s, acho que é o que aconteceu com o Brasil após o golpe de 2016...

Enfim, a HQ Paraíso Perdido é fantástica! Recomendo aos amantes da cultura e do conhecimento.

William
Um leitor

quarta-feira, 6 de março de 2019

Literatura Hispano-Americana: Conquista e Colônia (II)




Refeição Cultural

"En una primera aproximación, el restringido ámbito de la 'literatura' en su dimensión de 'bellas letras' resulta ampliamente desbordado por la pluralidad de las práticas discursivas orales y escritas que se pueden observar en el Nuevo Mundo en la doble línea de tradiciones en donde se inscriben: por un lado la oralidad, la plasmación pictográfica, ideográfica e incipientemente fonética, por otro la literatura escrita y en lenguas europeas; por un lado la gestualidade, el códice, la memoria, por el otro la letra, el libro, la lectura; por una parte la pluralidad lingüística y cultural en diversos grados de complejidad, por otra las lenguas europeas apuntando a la homogeneización; por una parte las 'palabras pronunciadas con el corazón caliente', 'la flor y el canto', por el otro la literatura; por un lado los poetas, por el otro los dueños del decir. En ambas tradiciones culturales habrá una reorganización de funciones a partir de 1492, que dará cuenta de su nueva situación: la de literaturas en relación. Es el momento en que surge para el investigador la posibilidad  del análisis comparado en los términos de nuestros intereses actuales; surgen las nuevas fronteras culturales, que delinean el rostro del continente hoy." (Ana Pizarro, in: "Palabra, literatura y cultura en las formaciones discursivas coloniales", na introdução ao livro)


Na aula anterior (ler AQUI), falamos sobre a forma violenta com que se deu o encontro de culturas, sobre as civilizações e as culturas que existiam aqui nas Américas antes da chegada dos europeus e das mudanças radicais advindas da colonização.

Nos foi indicada a leitura de dois capítulos do livro "América Latina - Palavra, Literatura e Cultura, livro organizado por Ana Pizarro. O volume 1 trata da situação colonial. A sugestão é ler o primeiro e o segundo capítulo do livro, textos de Martin Lienhard e Gordon Brotherston.

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(Texto 1 - leitura e destaques ou lembretes - 21 páginas)

A produção textual ameríndia

1. Los comienzos de la literatura "latinoamericana": monólogos y diálogos de conquistadores y conquistados

Martin Lienhard


Marginalización de las literaturas orales


"El continente cuyos habitantes se ven convidados a 'descubrir' a los europeos a partir de 1492 no es, desde luego, ningún vacío sociocultural...".

O autor nos informa nos primeiros momentos do texto que os europeus encontram aqui nas Américas culturas organizadas, principalmente com práticas discursivas orais que poderiam ser chamadas de "literatura" ou "arte verbal".

E mais: "Los 'textos' verbales producidos, a menudo poco 'autónomos', se suelen insertar en unos 'discursos' complejos que combinan los más variados sistemas semióticos: discurso verbal, música, ritmo, expresión facial y corpórea, coreografía, artes plásticas".

Destaca que as transcrições dos textos verbais têm mais um caráter auxiliar, um roteiro a ser preenchido com a performance oral.

"Los textos verbales 'transcritos', en efectivo, exigen la actualización o performance oral - frente a un auditorio colectivo o selecto - para pasar del estado latente a una presencia social concreta".

Já os textos ou discursos dos europeus são o oposto. Qualquer um que saiba ler pode reproduzir aquilo que está registrado, e isso ao longo do tempo, sem sofrer as atualizações e modificações constantes das línguas vivas. Com os textos, vêm as tradições.

E uma das tradições (ideológicas) é sobre a superioridade dos europeus em relação ao resto do mundo: "(...) contienen, en efecto, los fundamentos ideológicos de la pretendida superioridad de los europeos respecto de los demás pueblos del mundo".

Estabelece-se então o predomínio do escrito sobre o oral e isso não se perderá na América Latina mesmo após as independências em relação aos antigos colonizadores.

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Comentário do blog: eu não consigo esquecer, ao ler sobre isso, que a partida final de futebol do principal torneio das Américas, em 2018, cujo nome é "Libertadores da América", ocorreu lá na antiga metrópole colonizadora, a Espanha! É deprimente, é humilhante...
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Una literatura "oficial"

Lienhard nos diz que durante as primeiras décadas da chegada dos europeus nas Américas, os principais textos serão documentos como cartas de navegação, relatos de viagens etc. Quando surge algo literário propriamente, com autores daqui, serão com base em modelos da metrópole, como o poema épico histórico. Mas os relatos de viagem e cartas ainda serão mais marcantes em seus conteúdos.

Teremos dois tipos de estratégias discursivas, uma centrada no "eu" do narrador e uma outra voltada ao diálogo com o "outro". 

Um dos exemplos de documentos marcantes são os diários de viagem de Cristóvão Colombo, entre 1492-1493. Até a chegada à América, o texto segue o rito normal, depois ele vira um relato com imagens literárias tradicionais europeias, inclusive relacionadas com a bíblia, em relação ao paraíso, à inocência humana antes do pecado original etc.

Vejamos um exemplo de relato que Lienhard nos mostra em seu ensaio, sobre Cabeza de Vaca, em meados do século XVI:

"Naufragios (1542), texto sorprendente de Alvar Núñes Cabeza de Vaca, ejemplifica la transformación de un relato de conquista en una novela autobiográfica avant la lettre. En este relato, escrito a raíz de una campaña de calumnias contra su autor, Cabeza de Vaca, uno de los pocos sobrevivientes de una fallida expedición a la Florida (la de Pánfilo de Narváez), trata de justificar, a varios años de distancia, su actuación en los momentos cruciales de la conquista y posterior odisea. Aquí, el conquistador fracasado se autoevoca en tanto que conciencia humana que atraviesa, a menudo solo, una región inhóspita y pobre, poblada por indios que resultan ser sus iguales. A partir del molde 'relato de conquista', Cabeza de Vaca inaugura, en español, la novela autobiográfica moderna con su héroe subjetivo y trágico."

O ensaísta nos chama a atenção para um tipo de texto que vai ocorrer ao longo desse período secular, os relatos seriam supostamente "documentais", mas acabam trazendo traços de modelos de novelas, romances e estilos da época na Europa: "Si la novela, en tanto que género declarado, no aparece en la América colonial sino mucho más tarde, lo novelesco se introduce en muchas crónicas de viaje supuestamente 'documentales'...".

Ao fim desta parte do ensaio, o subtítulo sobre as literaturas "oficiais", Lienhard comenta sobre dois documentos não hispânicos que teriam uma característica distinta daqueles textos castelhanos de relatos, ainda que Lienhard fale mais em uma "etnografia" do que em uma suposta "literatura latino-americana".

"Algunos de los textos que 'informan' acerca de las exploraciones y conquistas americanas no caben en el marco que acabamos de diseñar. Es el caso, por ejemplo, de dos textos 'brasileños'; la carta de Pero Vaz de Caminha (1500) que anuncia al rey portugués el 'descubrimiento' - bien involuntario - de la costa de Brasil, y la Histoire d'un voyage fait en la terre du Brésil (1578) de Jean de Léry, emisario de la Ginebra calvinista. A diferencia de los textos españoles, muy 'comprometidos' con grandes proyectos de expansión colonial (y eclesiástica), estos parecen inaugurar una etnografía moderna más 'desinteresada' o 'autónoma'...".

E termina dizendo:

"(...) estos textos, testimonios del impacto de la experiencia americana en la cultura europea, no inauguran ninguna 'literatura latinoamericana', sino una etnografía europea de índolo más moderna.".


Las literaturas "alternativas"

"(...) El gesto histórico del pobre ermitaño, por imperfecta que sea su realización, inauguró no sólo, como a menudo se afirma, la etnografía americana, sino una nueva práctica literaria que podemos llamar, por un conjunto de razones, 'alternativa'. Ella ofrece, en efecto, un discurso 'nuevo' sobre América (tendencialmente el de las mayorías), una escritura nueva (transcripción o recreación del discurso oral) y un público nuevo (el lector bicultural de un continente multicultural). En un principio, la literatura 'alternativa' se desarrollará a partir de las necesidades muy concretas que impone a los españoles la organización de la colonia...".

Uma das estratégias que os conquistadores vão utilizar para imporem sua cultura é a de se aproximarem de lideranças dos povos a serem conquistados, ensinar a elas a sua língua e tradições e fazer dessas lideranças intermediárias entre os povos americanos e os da metrópole.

"La reorganización y asimilación de la aristocracia autóctona y, especialmente, los trabajos de recopilación suponían un diálogo, una colaboración estrecha entre los funcionarios coloniales y sus 'protegidos' indígenas...".

Essas assimilações dos povos americanos tiveram mais sucesso em algumas regiões do que em outras. Os espanhóis tiveram dificuldades para convencer lideranças dos Incas a fazerem esse papel: 

"(...) Distinto fue el caso del Perú. La larga resistencia indígena, las interminables guerras civiles entre caudillos militares españoles, la ausencia de un poder estable y operativo así como la distancia excesiva que separaba la capital indígena (Cuzco) de la de los españoles (Lima), todos estos factores impedían que se crearan condiciones favorables para una formación a la vez eficiente y centralizada de letrados indígenas 'asimilados'. Estas diferencias entre los contextos mesoamericano y andino explican sin duda las características bastante divergentes de la producción literaria 'indígena' en las áreas mencionadas".

POPOL VUH Y CHILAM BALAM

Lienhard coloca obras importantes da região central das Américas como exemplos de recompilações ao espanhol de histórias e memórias dos povos pré-hispânicos.

"(...) En la mayoría de las entidades 'autónomas' existe - como los tlacuilos o 'caligrafistas' de la época prehispánica - un secretario encargado de transcribir la memoria de la colectividade. Al trabajo de tales especialistas de la escritura se deben, por ejemplo, las grandes recopilaciones como el Popol Vuh o los libros de Chilam Balam, verdaderas enciclopedias del pensamiento mítico-histórico, calendárico, cosmológico, ritual, etc de dos pueblos mayanes..."

O texto termina citando alguns autores que, para ele, vão no futuro fazerem um esforço para criar uma escritura equivalente ao caos social e cultural gestado a partir da colonização das Américas

"(...) Un yo que no acepta pero asume, sin mayores nostalgias, la situación creada por la conquista. En este sentido, Guaman Poma es el antepasado más radical de los escritores contemporáneos más 'radicales' que se esfuerzan - o se han esforzado - por crear una escritura que sea un equivalente del caos (mundo en gestación) cultural y social del subcontinente: J. M. Arguedas, Roa Bastos, Rulfo, Guimarães Rosa, E. Zepeda, Z. Zorrilla.".


Leitura feita. Melhorou minha percepção para os textos que serão analisados na disciplina sobre esse período de nossa história latino-americana.

William
Um leitor


Post Scriptum:

Depois fiz também a leitura do segundo texto sugerido, o texto de Gordon Brotherston, "La visión americana de la conquista" (20 páginas).

segunda-feira, 4 de março de 2019

Marx, sobre o duplo caráter do trabalho materializado na mercadoria




Refeição Cultural

"O trabalho, como criador de valores de uso, como trabalho útil, é indispensável à existência do homem - quaisquer que sejam as formas de sociedade -, é necessidade natural e eterna de efetivar o intercâmbio material entre o homem e a natureza e, portanto, de manter a vida humana" (O Capital, Karl Marx)


A experiência ao ler este clássico dos clássicos, O Capital, publicado em 1867, por Karl Marx, tem sido trabalhosa nesse meu início, mas ao mesmo tempo, ela vem me proporcionando uma compreensão do quanto Marx é metódico ao desenvolver e apresentar seus estudos.

A leitura é lenta, eu leio muitas vezes cada parágrafo, após andar duas páginas acabo voltando ao início porque um conceito vai ligar com outro e assim por diante. Mas eu não quero ler só por ler, quero compreender o que ele nos apresenta, sem pressa.

Prefiro nas breves postagens fazer mais citações de Marx do que interpretações porque acho mais seguro fazer isso. Aliás, o objetivo das matérias é mais para instigar as pessoas a comprarem o livro, que custou menos de 70 reais, e começarem a leitura dele; ao contrário de ficarmos no diz que diz sobre Marx, ir direto ao seu estudo.

A primeira citação acima, a título de epigrama, é uma questão antiga entre nós do movimento dos trabalhadores; muitas vezes me peguei em debates em congressos e encontros onde o tema "Trabalho" era meio que demonizado, ao invés de se fixar os debates nas questões da exploração e apropriação do trabalho humano na sociedade capitalista e as formas de se evitar essa tragédia.

A MERCADORIA

Nesta primeira parte do Livro Primeiro, que trata do processo de produção do capital, Marx está estudando mercadoria e dinheiro, começando por "A mercadoria".


1. Os dois fatores da mercadoria: valor de uso e valor (substância e quantidade do valor)

Vimos nessa parte que "Tempo de trabalho socialmente necessário é o tempo de trabalho requerido para produzir-se um valor de uso qualquer, nas condições de produção socialmente normais existentes e com o grau social médio de destreza e intensidade do trabalho".

Fiz uma breve postagem sobre esse item 1 do capítulo. Ler AQUI.

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2. O duplo caráter do trabalho materializado na mercadoria

Agora Marx vai falar sobre o conceito de "trabalho útil", como "aquele cuja utilidade se patenteia no valor de uso do seu produto ou cujo produto é um valor de uso".

O filósofo nos fala sobre a divisão social do trabalho: "Ela é condição para que exista a produção de mercadorias, embora, reciprocamente, a produção de mercadorias não seja condição necessária para a existência da divisão social do trabalho. Na velha comunidade indiana, há a divisão social do trabalho, sem que os produtos se convertam em mercadorias".

Ao nos lembrar que uma mercadoria tem dois fatores, a matéria e o trabalho, Marx cita uma bela frase de William Petty:

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"O trabalho é o pai, mas a mãe é a terra"
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Ainda sobre essa questão da matéria, o filósofo nos faz lembrar das velhas aulas de química, quando aprendemos que na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Pelo menos eu aprendi assim nos anos setenta do século passado.

Marx, exemplificando sobre a produção de casacos, nos diz que: "(...) Extraindo-se a totalidade dos diferentes trabalhos úteis incorporados ao casaco, ao linho etc, resta sempre um substrato material, que a natureza, sem interferência do homem, oferece. O homem, ao produzir, só pode atuar como a própria natureza, isto é, mudando as formas da matéria".

À explicação acima, o autor inclui a nota: "Todos os fenômenos do universo, provocados pela mão do homem ou pelas leis gerais da física, não constituem, na realidade, criações novas, mas apenas transformação da matéria".

VALOR DA MERCADORIA

Diz Marx: "O trabalho do alfaiate e o do tecelão, embora atividades produtivas qualitativamente diferentes, são ambos dispêndio humano produtivo (...) O valor da mercadoria, porém, representa trabalho humano simplesmente, dispêndio de trabalho humano em geral".

Nesta parte dos estudos sobre mercadoria e valor, Marx nos alerta em nota que ainda não está considerando questões como salário, preço etc.

Ao analisar uma sociedade qualquer é necessário observá-la de acordo com as condições dadas naquele momento da análise: 

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"O trabalho simples médio muda de caráter com os países e estágios da civilização, mas é dado numa determinada sociedade. Trabalho complexo ou qualificado vale como trabalho simples potenciado ou, antes, multiplicado, de modo que uma quantidade dada de trabalho qualificado é igual a uma quantidade maior de trabalho simples..."
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É aqui que vem a nota de Marx: "Repare o leitor que não se trata aqui de salário ou do valor que o trabalhador recebe por seu tempo de trabalho, mas do valor da mercadoria no qual se traduz seu tempo de trabalho".

Marx vai falar da produtividade ao final deste item, mas antes ele explica mais sobre a acumulação de força de trabalho humano nas mercadorias.

"(...) os valores casaco e linho são cristalizações homogêneas de trabalho; os trabalhos contidos nesses valores são considerados apenas dispêndio de força humana de trabalho..."

e

"Se o trabalho contido na mercadoria, do ponto de vista do valor de uso, só interessa qualitativamente, do ponto de vista da grandeza do valor só interessa quantitativamente e depois de ser convertido em trabalho humano, puro e simples".

PRODUTIVIDADE

Marx nos explica sobre o movimento em sentidos opostos em relação ao duplo caráter do trabalho.

Uma quantidade maior de valor de uso cria, de per se, maior riqueza material, ou seja, dois casacos representam maior riqueza que um. Mas pode haver uma queda no valor da riqueza material dos casacos, quando a produtividade para produzi-los foi maior.

"Produtividade é sempre produtividade de trabalho concreto, útil, e apenas define o grau de eficácia da atividade produtiva adequada a certo fim, em dado espaço de tempo".

Lembrei-me das primeiras páginas do livro quando Marx cita as mudanças no modo de produção inglês. Após a introdução do tear a vapor, o tempo gasto para transformar fio em tecido reduziu-se pela metade. O tecelão inglês com tear manual seguiria produzindo a mesma quantidade de material, só que o valor seria a metade agora.

Enfim:

"A mesma variação da produtividade que acresce o resultado do trabalho e, em consequência, a massa dos valores de uso que ele fornece reduz a magnitude do valor dessa massa global aumentada quando diminui o total de tempo do trabalho necessário para sua produção. E vice-versa".

Marx conclui neste item o seguinte:

"Todo trabalho é, de um lado, dispêndio de força humana de trabalho, no sentido fisiológico, e, nessa qualidade de trabalho humano igualou abstrato, cria o valor das mercadorias. Todo trabalho, por outro lado, é dispêndio de força humana de trabalho, sob forma especial, para um determinado fim, e, nessa qualidade de trabalho útil e concreto, produz valores de uso".

COMENTÁRIO FINAL

O método de avaliação de Marx é muito claro no livro O Capital. É trabalhoso acompanhar o desenvolvimento de seu método dialético porque exige atenção e associação de conceitos.

Como disse ao início da leitura da obra, estou lendo ela sem pressa. Fazer anotações e postagens ajuda em minha própria memorização e compreensão. Ao mesmo tempo, pode ser que meus comentários despertem em algum leitor ou leitora, o interesse em iniciar a leitura de alguma obra que posto aqui no blog Refeitório Cultural.

Abraços aos amig@s leitores,

William
Um leitor


Post Scriptum:

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