SER - DRUMMOND
O filho que não fiz
hoje seria homem.
Ele corre na brisa,
sem carne, sem nome.
Às vezes o encontro
num encontro de nuvem.
Apoia em meu ombro
seu ombro nenhum.
Interrogo meu filho,
objeto de ar:
em que gruta ou concha
quedas abstrato?
Lá onde eu jazia,
responde-me o hálito,
não me percebeste,
contudo chamava-te
como ainda te chamo
(além, além do amor)
onde nada, tudo
aspira a criar-se.
O filho que não fiz
faz-se por si mesmo.
Do livro Claro enigma, 1951.
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COMENTÁRIO:
Caraca, que profundo isso!
Algo que poderias ter feito no passado, e que talvez ainda aperte teu coração, reminiscências do passado que sempre voltam.
Oportunidades perdidas, contudo, não significa que outras oportunidades não venham a existir, até porque:
"onde nada, tudo
aspira a criar-se."
O poema é profundo em suas imagens e sentidos metafóricos.
Por outro lado:
"O filho que não fiz
faz-se por si mesmo."
Quantas veredas poderia ter trilhado e não trilhei. Em cada trilha um destino.
Na trilha que não trilhei, alguém trilhou.
Na história, um tijolo.
Os muros não têm os nomes de todos os tijolos. Os muros estão por aí.
William
ANDRADE, Carlos Drummond. Nova reunião: 23 livros de poesia - volume 1. 3ª edição - Rio de Janeiro: BestBolso, 2010.
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